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Reinaldo Azevedo

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Cada 1% de juro custa R$ 38 bi; se taxa pode cair, mantê-la não é um roubo?

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Imagem: freepik

Colunista do UOL

20/06/2023 03h10

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Agora vai por escrito o que afirmei no programa "O É da Coisa". Se o Copom se levasse a sério mesmo dentro do seu equívoco, anunciaria amanhã, dia 21, a redução da taxa Selic. Não precisaria ser nada afinado com a racionalidade — um ponto, por exemplo, ou dois —; bastaria 0,25 para ao menos amenizar a impressão de que não conseguem nem mesmo arbitrar uma taxa segundo indicadores que eles próprios prodigalizaram. São apenas cumpridores das tarefas negociadas com os "Mercáduz", onde todos vão depois ganhar o pão, e, como resta evidente, com o apoio quase unânime da imprensa. Nessa matéria, como se sabe, a ordem é cantar segundo o coro dos contentes. Inexiste direito ao "outro lado".

É um troço impressionante. Até o "Boletim Focus" (semanal), que expressa o consenso da turma que realmente decide os juros — e, pois, estamos falando de uma decisão de neutralidade técnica impossível —, vê mudança no cenário. A projeção da inflação oficial neste ano caiu de 5,42% para 5,12. Para o ano que vem, o IPCA também recuou de 4,04% para 4 %. Em 2025, a previsão caiu de 3,9% para 3,8%. Sobre o Produto Interno Bruto, as projeções cresceram pela sexta semana consecutiva: de 1,84% para 2,14% neste ano. A previsão para a Selic caiu de 12,5% para 12,25% neste 2023 e de 10% para 9,50% no ano que vem.

Notem que já estamos falando de um universo de malucos. Mesmo com essas antevisões, fala-se de juros reais de mais de 7% em 2023 e ainda de 5,5% em 2024. É uma indecência que isso seja considerado uma coisa normal. E há quem diga, bem..., que Lula deveria ser grato a Roberto Campos Neto, presidente do BC, e à sua equipe de bravos.

O Índice Geral de Preços-Mercado (IGP-M), medido pela Fundação Getulio Vargas (FGV), registrou deflação (queda de preços) de 1,84% em maio deste ano. É mais acentuada do que a observada em abril, quando apresentou deflação de 0,95%. Há mais: O IPCA de maio, divulgado pelo IBGE, registrou inflação de 0,23%, indicador abaixo do então previsto pelo glorioso Boletim Focus: 0,37%. Essa variação é 0,38 ponto percentual menor do que o 0,61% de abril. A alta dos produtos alimentícios foi menor em maio (0,16%) na comparação com abril (0,71%). Seis dos nove grupos tiveram desaceleração da inflação.

Apontem uma razão para o BC manter a taxa de juros que não seja "não vai cair porque não vai cair". Para que vocês coloquem na conta: cada 1 ponto percentual da taxa de juros custa, por ano, R$ 38 bilhões em elevação da dívida pública. Quando o BC praticamente anuncia que, a despeito dos números, vai mantar inalterada a Selic, estamos falando de um custo multibilionário. Contra os pobres.

Em sua live desta segunda, o presidente Lula observou, para o rancor dos idiotas:
"Os alimentos estão baixando: a carne baixou, o arroz baixou, o óleo de soja baixou... As coisas estão baixando, e é preciso baixar muito mais. O dólar está caindo. Apenas o juro precisa baixar. Porque também não tem explicação. O presidente do Banco Central precisa explicar, não a mim, porque eu já sei por que ele não baixa, mas explicar ao povo brasileiro e ao Senado, que o elegeu, por que ele mantém essa taxa de juros de 13,75% num país que está com uma inflação anual de 5%".

Vai ver os nossos "çábios" são mais "çábios" do que os dos outros. Ainda vai chegar a hora em que um dos patriotas que justificam esses juros escorchantes ainda vai mandar uma cartinha à Standard & Poor's para reclamar: "Pô, vocês precisam parar de sabotar nossos negócios. A farra predileta por aqui era prever o caos... Era tão bom! Os juros se justificavam nas alturas, o dólar disparava, e a gente podia ganhar dinheiro sem nem tirar o traseiro da cadeira — de preferência, a de alguma praia em que pobre não entra. Agora ficou difícil... Os juros futuros também estão caindo. Aí é sacanagem com a laboriosa classe de especuladores e rentistas!"

Sim, claro!, parte da queda do dólar se deve aos juros obscenos. Afinal, como recusar a generosidade deste país valente que paga juros de mais de 8% ao ano, os mais elevados do mundo? É indecente que nos conformemos, a começar da imprensa, com o pensamento mágico: juros agora não caem mesmo havendo motivos; quem sabe na próxima rodada...

"Cala a boca, Reinaldo, você não entende nada de economia..."

É mesmo?

Geniais são aqueles que redigiram a ata anterior do Banco Central, em que se acenava até com a possibilidade de uma nova elevação de juros, se necessário (???), tal é a precisão matemática da leitura que fazem da realidade. Esses expertos (com "x" mesmo) jamais cansarão de passar vergonha porque, afinal, ninguém padece daquilo que não tem.

Se a taxa pode cair e não cai, não se está diante de uma forma sofisticada de apropriação do dinheiro público? Não é uma variante do roubo?