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Reinaldo Azevedo

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Placar tem a ver com Zanin e com Lula. Direita não tem eixo; resta-lhe o BC

Cristiano Zanin (centro) entre Esperidião Amin  (à esq.) e Rogério Marinho: revelou-se uma direita sem eixo, ressentida com o Supremo - Reprodução/TV Senado
Cristiano Zanin (centro) entre Esperidião Amin (à esq.) e Rogério Marinho: revelou-se uma direita sem eixo, ressentida com o Supremo Imagem: Reprodução/TV Senado

Colunista do UOL

21/06/2023 22h46

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Dados os dias que vivemos, com a loucura extremista que tomou conta do país e que, infelizmente, contaminou até o Senado, um candidato ao Supremo obter 58 votos na Casa, com apenas 18 rejeições, é fato digno de admiração, não apenas de nota. Mesmo os mais otimistas não ousavam chutar tão alto. Numa composição menos conservadora do que essa, André Mendonça, indicado por Jair Bolsonaro, foi aprovado por 47 a 32. A diferença é grande. E não estou interessado aqui em fazer um confronto de competências individuais. É claro que essas contam no voto dos senadores. Mas estou entre aqueles que prestam atenção a movimentos, contexto e fluxos de pensamento, ainda que eu dê, sim, relevo a desempenhos individuais — e Zanin se saiu muito bem. Não houve, que tenha percebido nenhum escorregão ou ambiguidade incômoda.

Como destaquei aqui nesta manhã, partidos da base ou com cargos no governo dispõem de 45 senadores — um deles, Sergio Moro, o que teve um desempenho pífio, e certamente votou contra. Dado o placar, é evidente que Zanin contou com a adesão de parlamentares que pertencem a partidos de oposição. Houve votos declarados até do PL.

QUE OPOSIÇÃO?
Dê-se de barato: não há histórico de rejeições desde o governo de Floriano Peixoto, aquele que queria governar "com mão de ferro". Por isso, mais do que a aprovação, deve-se olhar para o placar avantajado. Reitere-se: Zanin foi bem-sucedido nas conversas que manteve. Mas a votação não se deu no vácuo. Inexiste oposição organizada no Brasil que vá além da balbúrdia e arruaça -- aquilo que se vê nas CPIs. Aquele que veste o uniforme simbólico de "capitão" da turma é incapaz de governar as próprias palavras. Sua contribuição mais recente ao debate foi acusar as vacinas de conter grafeno na fórmula, que se acumularia nos testículos e nos ovários. E ainda disse, com olhar de sábio: "Eu li a bula". Depois se desculpou. No mais, está prestes a se tornar inelegível e certamente terá contas a ajustar com a Justiça em razão de outros crimes.

Abordei no programa "O É da Coisa" — publico o vídeo — o esforço de Rogério Marinho (PL-RN), líder da minoria no Senado, para tentar levar a voz e a visão da oposição à sabatina. E, Santo Deus!, ele não tinha o que dizer, exceto sugerir que Lula não é um Mandela e não estaria interessado em conciliação — sem citar ao menos um exemplo de ato autoritário do presidente. Nada! No mais, ouviu-se uma ladainha mal costurada sobre o suposto autoritarismo do Supremo, que não estaria respeitando a divisão entre os Poderes. Chegou a pedir uma Constituinte. Falou da necessidade se "re-startar" o Brasil, seja lá o que isso signifique.

Como é que um dito militante contra, então, o autoritarismo serviu tão fielmente a Jair Bolsonaro, cujo golpismo, se não fosse há muito evidente, vai ficando a cada dia mais escancarado? De que liberdade fala o senador? "Ah, o tribunal tira páginas das redes sociais". Ele só não explicou por quê. E evitou nos dizer se a Constituição abriga a apologia do golpe de Estado. É uma oposição sem eira nem beira.

O veterano Espiridião Amin (PP-SC), que deveria parar de tentar parecer engraçado — porque ele não é —, falou bobagens evidentes sobre o Inquérito 4.781, afirmando ser este um monumento contra o garantismo, esquecendo-se de tratar da base legal a que recorreu o Supremo para sustenta-lo. E, claro!, em nenhum momento ele enfrentou a importância que teve tal instrumento no combate ao golpismo. A regra, diga-se, dos oposicionistas foi reclamar do STF, em especial de Alexandre de Moraes. Como têm cabido a esse ministro os despachos relacionados ao enfrentamento do golpe, nota-se que os bravos, no fim das contas, continuam a dar piscadelas, como deram no passado, àquela loucura.

Eu não os vi, em 2022 e antes (a partir de 2019), a combater teses golpistas. Nem mesmo censuraram o ex-presidente pelas barbaridades que dizia sobre as vacinas. Falam, então, em nome de qual democracia? Chega a hora em que até os integrantes da grei se perguntam: "Mas essa gente quer nos levar para onde?"

Restava, então, o taco de Moro, aquele que tratava Zanin aos chutes quando juiz, com falas autoritárias e malcriadas. Creio que assistimos a um dos momentos mais patéticos da história do Senado. Farei um post específico a respeito. Mas experimentei aquela tal "vergonha alheia", uma sensação sempre muito desagradável. Atuou na sabatina com a mesma precisão que tinha quando juiz. Evidenciou-se ali por que é um proscrito mesmo entre oposicionistas.

BOM MOMENTO
Todos sabemos que parlamentares estão sempre atentos, se me permitem apelar à linguagem sísmica, a movimentos das placas tectônicas. Mudou o, digamos, climão sobre a economia, e tudo indica que o governo Lula começa a se acertar com a Câmara. A decisão da Standard & Poor's de colocar o Brasil numa perspectiva positiva, em vez de estável, tirou os tais "mercáduz" de uma posição meramente reativa -- ou reacionária --, chamando a atenção para os números. Muitos apostaram que a crispação do bolsonarismo nas redes criaria um ambiente de guerra no país, tornando-o ingovernável, mas não é isso o que se tem visto. A aprovação ao governo, segundo pesquisa Genial/Quaest, variou de 51% em abril para 56% neste junho. Entre os eleitores do ex-presidente, esse índice saltou de 14% para 22% Aumentou de 23% para 32% os que concordam que a economia melhorou. E passou de 34% para 26% quem acha que piorou.

Não creio que tenham mudado votos em razão desses dados. Estou dizendo que muita gente não está disposta a dar murro em ponta de faca ou a dar tiro no próprio pé. E que os dados traduzem a percepção de melhora e de governabilidade. Apesar do Banco Central, não por causa dele, há reação positiva na economia também em razão do estímulo do governo, como é evidente. Aliás, a votação se deu no Senado, Casa que também aprova os diretores do BC. Duvido que alguém esteja satisfeito, exceção feita a algum espírito de porco, com a patetada bilionária, que manteve a taxa de juros. O texto-base do arcabouço, diga-se, foi aprovado por 57 a 17, quase o mesmo placar da aprovação de Zanin.

À diferença do que dizem os enfezados, o governo tem eixo, o que é reconhecido hoje internacionalmente, e a oposição é só um aglomerado de rancores. Também entre esses se nota a disposição de não embarcar na aventura do "capitão do nada".

CONCLUO
As respostas, digamos, "garantistas" de Zanin são, sim, um fator de tranquilidade ao mundo político. Não porque asseguram a impunidade, como diz o udenismo caduco que ainda viceja aqui e ali, mas porque não existe democracia possível sem a garantia das regras do jogo. Aquelas que foram quebradas quando Moro, o futuro cassado, dava as cartas, empurrado o país para o abismo. A extrema-direita e o "extremismo de centro" vão ter de engolir Lula. Sua única base hoje é mesmo o Banco Central.