Placar pró-Dino é muito bom, ou a extrema direita não estaria estrebuchando
E o Senado aprovou o nome de Flávio Dino para o Supremo por 47 votos a 31 e duas abstenções. A vantagem em favor de Paulo Gonet para a Procuradoria Geral da República foi bem mais larga: 65 votos a 11. Já na CCJ havia ficado claro que o segundo transitava com mais facilidade na Casa do que o primeiro: 23 a 4 e 17 a 10, respectivamente. Não existia dúvida razoável sobre a aprovação do nome de Gonet; persistia, no entanto, uma tensão em relação a Dino. O barulho que os bolsonaristas anunciavam contaminou, de algum modo, até os mais otimistas. O placar em favor do ainda ministro da Justiça não foi, de fato, espetacular. Convenham: era preciso ter ou excesso de otimismo ou crença exagerada na conversão de embusteiros ao bom senso para imaginar números muito diferentes.
Por que Gonet teve 18 votos a mais do que Dino e 20 rejeições a menos, apesar da defesa que fez, como vice-procurador-geral eleitoral, da inelegibilidade de Bolsonaro? Porque houve a decisão de concentrar esforços na derrubada do nome de Dino. Comprar as duas brigas ao mesmo tempo era coisa demasiada. De toda sorte, o núcleo realmente duro dos soldados do "Capitão" o rejeitaram também — e é bem provável que uns dois ou três senadores de esquerda estejam entre os 11.
DINO E O PASSADO RECENTE
Eu não esperava números muito diferentes para Dino. Não se deve tomar como referência a aprovação de Cristiano Zanin, com eloquentes 58 adesões e apenas 18 rejeições. Apesar da proximidade pregressa com Lula, saltou da advocacia, exercida sempre com contenção e elegância, para o tribunal sem embates com a extrema direita. Há mais: um dos introdutores no país do debate sobre "lawfare" -- em síntese, o manejo do arcabouço legal para a perseguição política de adversários --, Zanin foi visto como o tipo de garantista que interessa ao exercício da política. E isso não é uma crítica. Ao contrário: trata-se de um elogio. Há só dois "pês" para resolver conflitos na sociedade: "política" e "porrada".
Com Dino, as coisas se deram de outro modo. Coube a ele a resistência mais saliente à tese aloprada de que o governo deixou de tomar medidas protetivas contra a arruaça golpista de 8 de janeiro, na suposição de que a desordem seria do seu interesse. A tese é um despropósito de vigaristas porque, como se sabe, nem Lula nem ninguém advogaram em favor de leis de exceção para enfrentar o golpismo. Ademais, os parlamentares de oposição, e vimos isto, de novo, nesta quarta, tratam os depredadores como patriotas que só buscavam o bem, o belo e o justo.
Os bolsonaristas passaram a convocar Dino de maneira obsessiva para falar em comissões. E jamais buscaram informação ou esclarecimento. Ao contrário: o tom era sempre acusatório, inquisitorial. Já escrevi aqui muitas vezes e reitero: o ministro sempre se comportou com extrema cordialidade, com lhaneza. Nas vezes em que apelou a alguma ironia, ele o fez para se defender de ataques sórdidos. O fato é que a extrema direita no Congresso passou a dispensar ao ministro o tratamento que, se pudessem e tivessem a oportunidade, dispensariam a Lula. Pensem nos dias que antecederam a indicação de Zanin e naqueles imediatamente antes da sabatina e votação. Não há declarações suas em "on".
Dino, por sua vez, era o alvo mais frequente nas redes do ódio. Dada a sua filiação partidária pregressa, resolveu-se pespegar nele a pecha de "comunista e inimigo dos cristãos" — é um devoto católico — porque é o tipo de expediente que funciona nas milícias digitais. E, como se sabe, o esforço final consistiu em acusá-lo de promiscuidade com o crime organizado, o que está muito abaixo de qualquer oposição razoável. Ver Rogério Marinho (PL-RN) apelar a tal expediente — já escrevi sobre este senhor — é asqueroso porque ele nem faz parte da safra de neófitos que o aluvião bolsonarista levou ao Senado. É um político experimentado. Não me parece que esteja maluco. Acho que é oportunismo mesmo: ele se oferece para ser o "cérebro" dessa gente destrambelhada. Vai saber que tipo de ambição alimenta.
O ministro se saiu muito bem. Não caiu em provocações baratas. Chegou a ser ironizado porque estaria ali a afetar uma calma que não lhe seria própria, já que dotado de suposto "espírito belicoso", como acusou o sempre beligerante Marinho, que diz pausadamente, em tom suave, as coisas mais pavorosas.
E O PLACAR?
"Mas e o placar, Reinaldo?" Lembro que Rodrigo Pacheco (PSD-MG) se reelegeu para a Presidência do Senado com 49 votos, dois a mais do que obteve Dino nesta quarta. O buliçoso Marinho recebeu 32, um a mais do que os que decidiram negar seu assentimento a Dino. A realidade triste, um tanto melancólica, é que há duas dúzias de bolsonaristas na nossa "Câmara Alta", que raramente reuniu tantas baixezas.
A esses se juntaram outros sete com as mais variadas insatisfações — algumas delas com o próprio tribunal. Entendem que a Corte se sobrepõe ao Parlamento; avaliam que Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes são pilares de um STF que não querem (defende demais a democracia...) e anteveem que Dino formará com os dois um trio de ferro para, como afirmou Deltan Dallagnol, prejudicar a direita.
"Ah, fala mais do placar..." Falo, sim! Se o Corinthians tivesse vencido, por um miserável gol de diferença, todos os jogos que disputou, teria sido campeão. Depois de uma campanha sórdida, foi um resultado e tanto. Quem está a fim de caçar derrotas do governo vai ter um refresco daqui a pouco, com a provável derrubada do veto de Lula à manutenção da desoneração da folha de salários. Nesta quinta, Dino e Lula venceram. Basta ver o ódio que a extrema direita está devotando àqueles que considera "traidores", não é mesmo, Sergio Moro?
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