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Após impasse em GO, cirurgiões cardíacos podem ser presos por recusar pacientes do SUS

Luiz Felipe Fernandes<BR>Especial para o UOL Notícias

Em Goiânia

24/09/2010 16h54

O Ministério Público de Goiás anunciou na manhã desta sexta-feira (24) que os cirurgiões cardíacos que se recusarem a atender casos graves pela rede pública de saúde poderão ter a prisão em flagrante decretada. “Em caso de recusa do médico em atender o paciente, que pode vir a óbito, vamos chamar a polícia para a prisão em flagrante do profissional”, afirmou o promotor Marcelo Celestino, em reunião com representantes das Secretarias Estadual e Municipal de Saúde.

A decisão de submeter os cirurgiões cardíacos a inquérito criminal foi tomada diante do impasse criado pelos profissionais da categoria, que se recusam a realizar procedimentos pelos quais o SUS (Sistema Único de Saúde) repassa a quantia de R$ 960. Associados da Copaccardio (Cooperativa dos Cirurgiões Cardiovasculares de Goiás) exigem aumento da tabela para R$ 6.000.

Por não concordarem com os valores repassados pelo Ministério da Saúde, 20 cirurgiões cardíacos goianos se descredenciaram do SUS em dezembro de 2009 e deixaram de atender casos de urgência e emergência em fevereiro deste ano. Em julho, eles também suspenderam o atendimento pelo Ipasgo (Instituto de Assistência dos Servidores Públicos do Estado de Goiás). Isso fez com que o Estado ficasse sem profissionais dessa especialidade disponíveis na rede pública.

Pesa sobre a categoria uma acusação de omissão de socorro a um bebê de 20 dias que morreu supostamente por falta de uma cirurgia do coração. O inquérito foi aberto na Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente, que ainda não começou a ouvir os envolvidos.

Bruno Sousa de Oliveira estava internado no Hospital da Criança. Segundo o promotor, havia um cirurgião cardíaco na unidade, que chegou inclusive a fazer outras duas cirurgias particulares, no mesmo dia, em outras crianças.

O Código Penal prevê como crime “deixar de prestar assistência à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo”. A pena é de um a seis meses de prisão e pode ser aumentada em caso de lesão corporal grave ou morte.

Procurado pelo UOL Notícias para comentar a possível condenação, o diretor comercial da Copaccardio, Wilson Silveira, disse que os profissionais da cooperativa “não têm nenhum vínculo com o poder público que obrigue esse tipo de conduta”.

Silveira classificou como “trabalho escravo” as condições a que os cirurgiões são submetidos ao serem obrigados a realizar procedimentos de alto custo com a verba destinada pelo Ministério da Saúde. Ele explicou que uma cirurgia cardíaca envolve, no mínimo, cinco profissionais, sem contar o material empregado para o procedimento. Os R$ 960 repassados pelo SUS seriam, segundo ele, insuficientes para cobrir todas essas despesas.

O diretor comercial da Copaccardio disse ainda que falta empenho das Secretarias Municipal e Estadual de Saúde, que podem complementar a verba federal. “É uma obrigação constitucional deles”, afirmou.

Nova proposta
Na reunião com o Ministério Público, a secretária estadual de Saúde, Irani Ribeiro, informou que uma proposta do Ministério da Saúde para os cirurgiões cardíacos será discutida durante o 65º Congresso Brasileiro de Cardiologia, que acontecerá na próxima terça-feira em Belo Horizonte. O valor oferecido pelo governo federal é de R$ 3.000.

Enquanto o acordo não for firmado, a Secretaria Municipal de Saúde de Goiânia se comprometeu a constituir uma equipe para tentar garantir o atendimento a casos de urgência e emergência, principalmente de crianças. Os casos serão avaliados de acordo com a gravidade e encaminhados para o Hospital Geral de Goiânia e o Hospital das Clínicas, que têm estrutura para realizar cirurgias.