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"Ela recebia ameaças e informava ao Tribunal de Justiça", diz ex-marido de juíza morta

Rodrigo Teixeira

Especial para o UOL Notícias <BR> Em Niterói (RJ)

12/08/2011 17h45Atualizada em 12/08/2011 20h12

O ex-marido da juíza Patricia Acioli, 47, morta na noite desta quinta-feira (11) em Niterói (RJ), disse que a magistrada informava o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) das ameaças de morte que recebia.

A afirmação foi feita durante o enterro da vítima, realizado na tarde desta sexta-feira (12) no cemitério Marui Grande, em Niterói.

“Ela recebia ameaças e informava ao TJ. Não posso falar da atuação do tribunal, mas ela tinha seis seguranças que foram reduzidos para quatro, depois para três, até nenhum”, disse o ex-marido, que é policial militar e se identificou apenas como Júnior. A juíza vivia com outro companheiro, também policial, chamado Marcelo Poubel.

Patricia Acioli chegou a receber escolta policial, mas, segundo o TJ, a própria juíza dispensou a proteção há cerca de três.

Local do assassinato

A família da vítima contesta essa versão e diz que a juíza havia pedido a escolta, mas não foi atendida.

Patricia, que trabalhava na 4ª Vara Criminal de São Gonçalo, era um dos 12 nomes de uma “lista negra” marcada para morrer, encontrada com um suspeito de tráfico de drogas detido no Espírito Santo.

A magistrada era conhecida pelo combate ao narcotráfico, mas também pela condenação de policiais criminosos.

O ex-marido, pai de duas filhas da vítima --uma com dez anos e outra com 12--, afirma que a Justiça nunca disponibilizou um veículo blindado à juíza.

“Nunca foi disponibilizado o carro blindado. Não existe isso para nenhum juiz de primeiro grau. Houve falha. O sistema falhou. Estamos vivendo um momento crítico. A bandidagem está perdendo o medo do Estado”, disse.

“Ela tinha ciência de que era ameaçada. Criaram uma imagem de que ela era muito rígida, mas ela apenas fazia o seu trabalho”, afirmou.

Presidente do TJ

O enterro ocorreu sob forte esquema de segurança. Parentes, amigos, colegas de trabalho e autoridades estiveram no local.

Um filho adotivo da juíza, de 21 anos, que cursa direito, estava muito abalado e teve de ser amparado por parentes.

O presidente do TJ-RJ, Manoel Alberto Rebelo dos Santos, também esteve no local e afirmou que a Justiça não pode impor escolta aos juízes.

“Você não pode impor segurança ao juiz. Imagina você ser seguido por três policiais aonde for? O juiz vai a uma festa, os policiais tão junto. Se ele vai ao banheiro, três policiais o aguardam”, disse.

“Posso afirmar que esse crime não vai ficar impune. Vamos pegar esses bandidos nos rigores da lei. Tudo será apurado”, afirmou o desembargador.

Em discurso muito aplaudido pelos presentes, o ex-marido da vítima culpou o Estado. “Que ela não seja mais um número. Ela morreu porque acreditava na Justiça, e certamente houve uma falha do Estado.”

O assassinato

Ao volante de um Fiat Idea prata, a magistrada foi surpreendida por homens utilizando toucas ninja e ocupando duas motos, segundo informações preliminares da polícia. Foram 21 disparos de pistolas calibres 40 e 45 contra a vítima, que morreu no local

O governador do Rio se manifestousobre o caso e prometeu apuração rigorosa sobre a real motivação da morte. A pedido do Supremo Tribunal Federal, a Polícia Federal também vai investigar o caso.

Decisões judiciais

A magistrada tinha várias decisões judiciais contra policiais militares em seu currículo. Ela era responsável por julgar casos de homicídio no segundo município mais populoso do Estado do Rio, inclusive os casos de autos de resistência, isto é, mortes provocadas pela polícia supostamente em confronto com o suspeito.

Entre algumas decisões de Patricia, está a prisão de policiais militares de São Gonçalo que sequestravam traficantes e, mesmo depois de matá-los, entravam em contato com familiares e comparsas exigindo dinheiro para soltura.

Em setembro de 2010, a magistrada determinou a prisão de quatro policiais militares de Niterói e São Gonçalo, acusados de integrar um grupo de extermínio na região. Em janeiro deste ano, ela também decretou a prisão de seis policiais acusados de forjar autos de resistência.

Na última terça-feira (9), a juíza condenou o oficial da Polícia Militar Carlos Henrique Figueiredo Pereira a um ano e quatro meses de detenção, em regime aberto, pela morte do jovem Oldemar Pablo Escola Faria, de 17 anos, em setembro de 2008.

"Foram tiros praticamente à queima-roupa", diz primo da vítima

O nome da magistrada também estava em uma "lista negra" feita pelo criminoso Wanderson Silva Tavares, o "Gordinho", preso no Espírito Santo em janeiro deste ano e chefe da quadrilha de extermínio que agia em São Gonçalo e teria assassinado pelo menos 15 pessoas em três anos.

"Não tenho medo de ameaça"

Em setembro do ano passado, em entrevista ao jornal "O Globo", a juíza afirmou que não tinha medo de decretar prisões.

"Não tenho medo de ameaça. Quem quer fazer algo vai e faz, não fica ameaçando. Ninguém morre antes da hora. Sei que, no imaginário popular, a juíza é quem faz tudo, mas é a polícia que investiga, são os promotores que fazem a denúncia e é o júri que julga", afirmou na época, tentando explicar a fama de durona que tinha na cidade.