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Em dúvida, juiz mantém preso suspeito de agredir coronel e fala em 'garantir ordem'

O estudante e comerciário Paulo Henrique Santiago dos Santos (à esq.), 22, sendo transferido ao CDP de Pinheiros - Moacyr Lopes Junior/Folhapress
O estudante e comerciário Paulo Henrique Santiago dos Santos (à esq.), 22, sendo transferido ao CDP de Pinheiros Imagem: Moacyr Lopes Junior/Folhapress

Guilherme Balza

Do UOL, em São Paulo

05/11/2013 06h00

Ao rejeitar o pedido de liberdade provisória ao estudante Paulo Henrique dos Santos, 22, preso sob a acusação de ter agredido o coronel da Polícia Militar de São Paulo Reynaldo Simões Rossi, o juiz Alberto Anderson Filho, da 1ª Vara do Tribunal do Júri do Fórum Criminal da Barra Funda, considerou que o suspeito deve permanecer detido para a “garantia da ordem”, embora reconheça que há dúvidas sobre a culpa do estudante no episódio.

Paulo Henrique está preso preventivamente desde o último dia 25, data em que o policial foi agredido durante um protesto realizado no centro da capital paulista. O coronel foi cercado e espancado por vários manifestantes, que usaram pedaços de pau e placas para agredi-lo.

A decisão de Anderson Filho foi tomada na última quarta-feira (30). O Ministério Público concordou com o pedido de liberdade feito pela defesa do estudante ao entender que “não estão presentes os requisitos autorizadores da prisão preventiva” e que “não há nos autos indícios de que o indiciado seja uma ameaça à ordem pública.”

Em sua decisão, no entanto, o magistrado não concordou com os argumentos da defesa e da acusação. “A questão é, sim, de manutenção da ordem pública (...) Não se pode, neste momento, questionar-se acerca da efetiva conduta do indiciado, mesmo porque ele sequer foi denunciado, nem mesmo se sabe se o será. Mas, como garantia da ordem pública, fica mantida a decisão que converteu a prisão em flagrante em prisão preventiva.”

O estudante foi indiciado por tentativa de homicídio, lesão corporal, dano ao patrimônio e formação de quadrilha. Além dele, que está detido no CDP (Centro de Detenção Provisória) de Pinheiros, na zona oeste da capital, outros seis manifestantes permanecem detidos por dano e formação de quadrilha --apenas Paulo foi indiciado por supostamente ter agredido o coronel.

Ao pedir a liberdade ao estudante, a defesa argumentou que ele não possui antecedentes criminais, têm endereço fixo, trabalha e estuda. Paulo trabalha em um comércio e cursa o segundo ano de Relações Internacionais na Faculdade Santa Marcelina. Com a rejeição do pedido de liberdade provisória, a defesa do estudante apresentou pedido de Habeas Corpus, que ainda não foi julgado.

Em sua decisão, o juiz afirmou que os bons antecedentes de Paulo Henrique não o impediram de participar de “baderna na via pública”. “O fato de o indiciado ser primário, estar cursando universidade e ter respaldo familiar, não o afastou da participação em baderna na via pública”, escreveu.

Vídeo mostra coronel da PM sendo agredido por mascarados

Defesa questiona provas

Segundo o advogado Guilherme Braga, defensor do universitário, o indiciamento dele foi feito com base em fotos e vídeos das agressões ao coronel. Para o advogado, nas imagens o estudante aparece perto do coronel no momento do espancamento, mas em momento algum é visto o agredindo.

“Os indícios de tentativa de homicídio são muito frágeis, praticamente inexistentes. Ele é réu primário, tem bons antecedentes, família constituída, não faz parte de ‘black bloc. Entregamos os dois passaportes dele (europeu e brasileiro). Nada indica que ele, ao ser solto, vai fugir ou representar risco algum. Ele não merece esperar essa situação ser esclarecida para daí ser solto”, disse o advogado.

De acordo com o defensor, Paulo Henrique está “muito abalado, se sentindo injustiçado”. Ela afirma que o estudante está sendo bem tratado pelos demais detentos do CDP de Pinheiros, mas a situação da penitenciária “é insalubre”. “Em Pinheiros há três vezes mais presos do que a capacidade.”

Juiz analisa manifestações

Na mesma decisão, o juiz Alberto Anderson Filho fez uma análise das manifestações que ocorrem no país desde junho. Na avaliação do magistrado, os protestos de junho tinham legitimidade, enquanto que os atos ocorridos nas últimas semanas “causam enorme prejuízo para a coletividade.”

“Não se pretende aqui questionar acerca da legitimidade ou não de manifestações, mas o fato é que, em junho passado, elas ocorreram e tiveram um maciço apoio popular. Delas surtiram alguns efeitos. Alguns, é claro, apenas funcionaram como cortina de fumaça, como proposta de plebiscito e outros”, escreveu o juiz, referindo-se à proposta de plebiscito para a reforma política feita pela presidente Dilma Rousseff. “Mas, outros efeitos tiveram eficácia, como, por exemplo, houve a redução do valor das passagens de ônibus urbanos e o rotineiro aumento das tarifas de pedágio foi posto de lado.”

“Na sequência, as manifestações prosseguiram. Porém, agora, sem o mesmo apoio popular. São alguns poucos, em relação às centenas de milhares que anteriormente participavam, e estes, queira ou não, causam enorme prejuízo para a coletividade, bloqueando avenidas importantes, rodovias, e facilitando a ação de grupos de vândalos e malfeitores. Inquestionável que tais atitudes provocam intensa perturbação da ordem pública”, argumentou o magistrado na sentença.

A reportagem procurou o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) e tentou conversar com o juiz a respeito da sentença. A assessoria de imprensa da Corte disse que os magistrados não costumam comentar decisões, mas que tentaria localizá-lo. Até o fechamento da reportagem, entretanto, não houve resposta.