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Catador de lixo é indenizado em R$ 7.000 em MG após ser chamado de 'isso'

O catador de lixo Roberto Donizete Guedes, que será indenizado - Léo Galvão
O catador de lixo Roberto Donizete Guedes, que será indenizado Imagem: Léo Galvão

Carlos Eduardo Cherem

Do UOL, em Belo Horizonte

12/06/2015 14h46

Em março de 2012, o catador de lixo Roberto Donizete Guedes, 50, foi chamado de “isso” e xingado por “cheirar mal”, antes de ser expulso de uma lanchonete em Pouso Alegre (a 390 km de Belo Horizonte), em Minas Gerais. Após decisão do TJ-MG (Tribunal de Justiça de Minas Gerais), ele vai receber cerca de R$ 7.000 de indenização por dano moral.

O TJ-MG condenou nesta quarta-feira (10) a Ka Lanches, que funciona no centro do município, a pagar R$ 4.000 de indenização a Guedes. Mas, segundo o advogado Cresio Jonas Franco, por terem se passado três anos, na execução da sentença serão incluídos juros e correção monetária, o que deve elevar a cifra para algo em torno de R$ 7.000.

“Isso não se faz. É uma questão de dignidade. Ele não poderia ter sido xingado, humilhado e proibido de frequentar a lanchonete, que é um espaço público”, diz o advogado.

A decisão da 12ª Câmara Cível do TJ-MG reformou a sentença de primeira instância, da comarca de Pouso Alegre, de 2013, que condenou a lanchonete a pagar a indenização por dano moral de R$ 7.240 a Guedes, além de R$ 3.620 ao publicitário Leonildo Galvão da Rosa, 56, o Léo Galvão, que estava com o catador de lixo no estabelecimento no momento em que teria havido o xingamento e a expulsão. Agora só cabe recurso no STJ (Superior Tribunal de Justiça), em Brasília.

A reportagem do UOL entrou em contato por três vezes com a Ka Lanches e foi informada por funcionário, que não quis se identificar, que ninguém da empresa comentaria a decisão. Em sua defesa no processo, o estabelecimento alegou que não houve ato discriminatório que justificasse a obrigação de indenizar o catador, apenas uma discordância pelo atendimento.

'Um homem bom'

“Ele fez maldade comigo. Senti muita vergonha. Mas agora estou feliz. Vou ajuntar o dinheiro para entregar para minha mãe”, diz Guedes, que, com muita dificuldade, demorou alguns minutos para completar essas frases para a reportagem do UOL. Ele possui deficiências que lhe prejudicam os movimentos de uma perna e um braço, além de dificuldades na fala, mas não sabe explicar por quê.

Sua renda mensal gira em torno de um salário mínimo (R$ 788), utilizados para o sustento da mãe e de um irmão, ambos doentes. Guedes explica que eles não trabalham e a família, que mora numa casa de dois cômodos na periferia de Pouso Alegre, não recebe nenhum tipo de benefício social, público ou privado.

“Eu o conheço há 15 anos. É um bom homem, honesto e trabalhador. Ele é responsável pelo sustento da família, que vive em condições muito precárias”, diz Galvão, amigo do catador de lixo. “Ele não merecia isso. E não só ele, fiquei muito constrangido e envergonhado também.”

Relembre o caso

Galvão deixou uma farmácia na praça Senador José Bento, ao lado da Ka Lanches, no dia 1º de março de 2012, e se encontrou com o catador, que recolhia caixas de papelão na calçada. O publicitário cumprimentou Guedes e o convidou para comer um salgado na lanchonete.

Entraram no estabelecimento, mas foram informados que não poderiam permanecer no local por causa do mau cheiro do catador de lixo.

O proprietário do local, de acordo com Léo Galvão, disse, com o dedo em riste, apontando para Guedes: “Isso não pode ficar aqui. Você tira ele daqui, ele cheira mal. Não quero isso aqui”.

Constrangido, Galvão comprou um salgado, que foi colocado numa sacola plástica, e deu para o catador comer na rua. Fez um boletim de ocorrência no batalhão da PM (Polícia Militar) no mesmo dia e entrou com o processo na Justiça, pedindo indenização por dano moral. Uma cliente testemunhou o fato e confirmou o xingamento e a expulsão do catador do estabelecimento à Justiça.

O relator do processo, desembargador José Flávio de Almeida, entendeu que o publicitário não sofreu dano moral e que a indenização por danos morais para o catador deveria ser reduzida para R$ 4.000, reformulando a sentença de primeira instância.

Segundo o desembargador, o dano moral ficou configurado, pois os jornais da cidade repercutiram negativamente a imagem do deficiente físico. Os desembargadores Anacleto Rodrigues e Maria Luíza Santana Assunção votaram de acordo com o relator.