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Sem repasses desde 2015, restaurantes populares do RJ ameaçam fechar as portas

Restaurante popular no Méier, zona norte do Rio de Janeiro - Alfredo Mergulhão/Colaboração para o UOL
Restaurante popular no Méier, zona norte do Rio de Janeiro Imagem: Alfredo Mergulhão/Colaboração para o UOL

Alfredo Mergulhão

Colaboração para o UOL, no Rio

16/06/2016 11h42Atualizada em 16/06/2016 17h02

Com faturas em atraso desde 2015, os 16 restaurantes populares mantidos pelo governo do Estado do Rio de Janeiro correm o risco de serem fechados. As empresas responsáveis pelas unidades afirmaram que enviaram uma carta ao governador em exercício, Francisco Dornelles (PP), para cobrar os pagamentos –atrasados há 13 meses-- e dar um prazo até 1º de julho para início da quitação dos débitos. Caso contrário, os estabelecimentos ameaçam interromper o atendimento.

A Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos informou que não foi comunicada sobre o possível fechamento. "A garantia do governo em liberar recursos para a manutenção dos programas sociais --como o Renda Melhor, o Renda Melhor Jovem, o Aluguel Social e os Restaurantes Cidadão-- foi o pedido que o secretário Paulo Melo fez ao governador em exercício Francisco Dornelles para se manter à frente do cargo quando retornar de férias, em julho", afirmou a pasta em nota.

O valor atual da dívida é de R$ 24.242.779,17, de acordo com a secretaria –esse é o saldo final após o governo estadual ter transferido neste ano R$ 5.620.181,22 para as dez empresas responsáveis pelos restaurantes. "Se não houver uma posição até dia 1º, vamos parar de atender. Estamos unidos e não temos outra alternativa, não dá mais para manter os restaurantes funcionando", disse o representante de uma das empresas, que preferiu o anonimato para não prejudicar as negociações.

A falta de pagamento reflete no cardápio oferecido ao público. O primeiro restaurante cidadão foi inaugurado em novembro de 2000, na Central do Brasil, no centro do Rio. Na ocasião, foi servido arroz, feijão, bife de panela ou isca de frango, batata palha, salada, sopa de ervilha, refresco de laranja e sorvete de flocos ou maçã de sobremesa. Tudo por R$ 1. O cardápio agora perdeu diversificação. Na terça-feira (14), o menu contava apenas com arroz, feijão, farofa, linguiça e refresco. E custava R$ 2. 

"Isso aqui já foi 100%, tinha de tudo. A gente escolhia entre dois tipos de carne, salada, feijoada na sexta, peixe... Agora é arroz, feijão e nuggets", reclamou o auxiliar de escritório Jean Pierre de Araújo, 44. Morador de Bangu, ele come no Restaurante Cidadão Central do Brasil - Herbert José de Sousa (Betinho) durante a semana desde sua inauguração, há 16 anos.

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Carlos José Caetano da Silva almoça todos os dias no restaurante popular da Central e afirma que a qualidade do serviço caiu
Imagem: Alfredo Mergulhão/Colaboração para o UOL

O pincelista Carlos José Caetano da Silva, 37, fica hospedado de segunda a sexta-feira no Hotel Popular, localizado no prédio da Central do Brasil e também controlado pela Secretaria de Assistência Social. Ele se lembra da época em que "a manteiga faltava pular do pão" durante o café da manhã. "Agora é só pão seco e café com leite. E no almoço não tem carne de verdade, mas apenas linguiça, salsicha ou frango desfiado. Salada eu não vejo faz tempo”, afirmou. “Continuo vindo aqui porque realmente preciso."

As empresas atribuem o menu reduzido à crise financeira do governo do Rio: sem os repasses, cortaram na variedade da alimentação. Nesta quarta-feira (15), os estabelecimentos serviram como prato principal hambúrguer, fígado de boi, moela, língua, salsichão, carne moída ou frango desfiado. A salada não constava no menu dos restaurantes de Campo Grande, Jacarepaguá, Méier e Central do Brasil, no Rio, e de Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, e Volta Redonda, no Vale do Paraíba.

"Além das verduras, antigamente era servida uma sopa, tinha azeite e pimenta, café e chá parar beber depois do almoço e os funcionários limpavam as mesas com álcool. Isso tudo acabou de um ano para cá", afirmou o pedreiro Manoel de Almeida Miguel, 67. Ontem ele comeu um prato de arroz, feijão, polenta e fígado em tiras no restaurante do Méier, no subúrbio do Rio. Para se servir, havia apenas um garfo, um guardanapo e um palito de dente. "Tiraram até a faca e a colher", criticou.

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Refeição servida no restaurante popular do Méier
Imagem: Alfredo Mergulhão/Colaboração para o UOL

Apesar das restrições do cardápio, as empresas sustentam que mantiveram a qualidade das refeições. O café da manhã deve fornecer cerca de 400 calorias e o almoço, aproximadamente, 1.000 calorias, conforme estabelece a secretaria, que fiscaliza o atendimento. Diariamente são servidas 37,5 mil refeições no almoço e 14 mil no café da manhã nesses estabelecimentos.

A secretaria também sustenta que não houve redução na quantidade de refeições servidas. "A composição dos cardápios atuais do restaurante cidadão obedece às normas de valor nutricional garantidos pela segurança alimentar. As quantidades também são observadas dentro dos parâmetros preconizados pela nutrição", informou em nota. 

O órgão nega que haja possibilidade de fechamento dos restaurantes em virtude da crise. "A gestão compartilhada dos restaurantes com as prefeituras é uma das medidas de contenção de gastos anunciadas pelo Estado na semana passada. O de Campos dos Goytacazes, por exemplo, já está sob administração da prefeitura. Outros, como o de Niterói, estão em processo de transferência", diz o comunicado.