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"Nunca tinha recebido carinho de mãe", diz jovem adotado aos 18 anos

19.jul.2017 - Aos 18 anos, Wlliams (à dir.) foi adotado por uma família de Belo Horizonte  - Arquivo pessoal
19.jul.2017 - Aos 18 anos, Wlliams (à dir.) foi adotado por uma família de Belo Horizonte Imagem: Arquivo pessoal

Daniela Garcia

Do UOL, em São Paulo

23/07/2017 04h00

Com chances mínimas de ser adotado, Williams repetia a si mesmo "minha esperança é a última que morre". O pernambucano de 17 anos ainda tinha o sonho de viver em família. "Eu nunca tive carinho de mãe."

Menos de 1% dos pretendentes de adoção, contudo, procuram um adolescente nessa idade no Brasil. Contrariando os números, Williams chamou a atenção de um casal a mais de 2 mil quilômetros de distância do Recife.

"Quando eu vi ele no vídeo, já senti que era o meu filho. Senti uma coisa muito forte, algo inexplicável. Eu vi o vídeo várias vezes e falei para o meu marido: encontrei o nosso filho", lembra Viviane Nogueira, 45. Ela se refere a uma campanha desenvolvida em Pernambuco, em que Williams e outros adolescentes testemunhavam a angústia de não ter uma família.

Viviane e Cláudio Nogueira, 54, já estavam amadurecendo a ideia de adotar um adolescente havia seis anos ao participar de um grupo de apoio à adoção em Belo Horizonte. Mas até 18 de janeiro do ano passado, o casal não havia tido a coragem de dar entrada com os papéis para se habilitar. "No mesmo dia que eu vi o vídeo, liguei para a Vara do Recife e disse: 'como eu posso buscar o meu filho? Vou mandar todos os documentos'".

A campanha que levou o encontro do casal Nogueira com Williams chama “Adote um Pequeno Torcedor”. Criado em agosto de 2015, o projeto tem como objetivo conseguir famílias interessadas em adotar crianças de sete anos ou mais que vivem em abrigos do Recife. A ação é uma parceria da 2ª Vara da Infância e Juventude do Recife, do time Sport Club do Recife e do Ministério Público de Pernambuco.

Williams e outros jovens falam do desejo de ter uma família

UOL Notícias

Foram três meses para o casal Nogueira conseguir se habilitar para adoção. Nesse período, Williams fez 18 anos e não imaginava que o seu desejo de ter uma família estava prestes a acontecer.

Ao alcançar a maioridade, ele só sabia que deixaria o abrigo. "Eu já estava preparando para viver uma vida só. Eu ia trabalhar de garçom e tinha olhado uma casa. Mas eu continuava com muita vontade de ter uma família", lembra.

Ainda vivendo no abrigo aos 18 anos, Williams recebeu a notícia de que Viviane e Cláudio queriam adotá-lo.

Eu nem tinha ideia onde ficava Belo Horizonte, mas eu só pensava 'vou embora daqui, vou ser adotado, meu sonho vai ser realizado'."

A adoção de um adolescente de 17 anos é algo raro no Brasil. Nos últimos três anos, houve o registro de oito adoções nessa idade em todo o país. "Uma adoção aos 18 anos foi um caso inédito aqui", diz o juiz Élio Braz Mendes, da 2ª Vara da Infância e Juventude do Recife.

O contato entre o jovem pernambucano e o casal mineiro, no entanto, só aconteceu quando a Justiça deu a habilitação para a adoção. No primeiro telefonema, Williams já chamou Viviane de "mãe" e Cláudio de "pai". "Eu achava que ele, como era adolescente, ia demorar chamar a gente assim. Fiquei muito emocionada", lembra a engenheira.

Desejo de ser filho

"A adoção mais bonita foi ele ter adotado os pais, a família", diz Mendes. Para o juiz, a vantagem das adoções de meninos mais velhos é o "desejo de ser filho". "Eles respeitam os pais porque entendem o quanto a família é um presente", diz.

Percebo no Williams a responsabilidade de um adulto. Ao mesmo tempo ele tem uma carência enorme de se sentir filho, de ter um colo de mãe, de ter uma conversa de pai", atesta Cláudio. 

Da parte de Williams, havia a vontade de ser filho porque tanto os pais biológicos quanto a avó com quem conviveu morreram. O jovem viveu em cinco diferentes instituições dos 12 aos 18 anos, e nunca foi sondado para adoção. "Às vezes aparecia gente no abrigo para dar alguma roupa, mas nem levava para passear", conta.

Já em Belo Horizonte, Cláudio e Viviane queriam "ter mais filhos". Antes de se casarem, eles já tinham sido pais de meninos de relações diferentes. Tentaram por tratamentos de fertilização serem pais biológicos juntos, mas não foi possível. "Os médicos não souberam explicar o motivo", diz Cláudio. À procura das razões médicas, eles levaram seis anos para assumir definitivamente a adoção.

21.jul.2017 - "Ele foi desejado assim como o meu filho biológico. É uma coisa tão divina, mágica. Não parece que ele chegou há um ano e pouco. A forma como ele veio foi só um detalhe", diz a mineira Viviane - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
"Ele foi desejado assim como o meu filho biológico. É uma coisa tão divina, mágica. Não parece que ele chegou há um ano e pouco. A forma como ele veio foi só um detalhe", diz a mineira Viviane
Imagem: Arquivo pessoal

A passagem do tempo foi necessária para encontrar Williams, afirma Viviane. "Ele foi desejado assim como o meu filho biológico. É uma coisa tão divina, mágica. Não parece que ele chegou há um ano e pouco. A forma como ele veio foi só um detalhe. O encontro aconteceu quando tinha que acontecer."

Williams diz ter se tornado "uma pessoa mais feliz" ao lado da sua família. "Mudou a minha vida toda para melhor."

Desde maio do ano passado, Williams vive com Viviane, Cláudio e o irmão Lucas, 26, em Belo Horizonte. Hoje, aos 19 anos, trabalha como menor aprendiz pela manhã e estuda durante à noite. Pretende se formar no ensino médio em meados de 2018, mas já está conversando com os pais sobre qual profissão vai seguir.

Depois de provar o carinho de mãe, Williams diz ter encontrado o seu lugar no mundo. "Parece que eu estava de férias no Recife e agora eu voltei para casa."