Recém-nascido fica 3 dias em cela de delegacia de SP com a mãe, presa por tráfico
Um bebê de três dias foi mantido em uma cela de dois metros quadrados com a mãe, presa desde o último sábado (10) por suspeita de tráfico de drogas, na carceragem de uma delegacia na região central de São Paulo.
A presa, Jéssica Monteiro, 24, mãe também de uma criança de 3 anos, deu à luz no domingo (12) de Carnaval, um dia depois de uma audiência de custódia converter em prisão preventiva (por tempo indeterminado) a prisão em flagrante ocorrida na véspera. Ela foi flagrada pela Polícia Militar com 27 papelotes de maconha. De domingo até esta quarta-feira (14), ela ficou na carceragem do 8º Distrito Policial, no Brás, região central de São Paulo, com o recém-nascido, Henrico.
Jéssica foi autuada no Bom Retiro, também no centro, na pensão onde vivia com o marido, Oziel Gomes da Silva, 48. Segundo o boletim de ocorrência lavrado pela Polícia Civil, o rapaz foi flagrado com quatro papelotes de maconha, no bolso, em um bar vizinho à pensão. Ao chegarem até Jéssica, acompanhados de Silva, conforme o B.O., os PMs notaram “atitude suspeita” da abordada e localizaram, com ela, 27 papelotes de maconha.
Com Silva, ao todo, os policiais descobriram mais 37 trouxas de maconha e 40 mini-tubos de cocaína. No total, foram apreendidos com o casal 8,6 gramas de cocaína e 96,4 gramas de maconha.
Além da delegada Rosana Fernandes, que pediu à Justiça a prisão do casal, também o Ministério Público fez o pedido, por intermédio da promotora Ana Laura Ribeiro Teixeira Martins.
Juiz aponta "acentuada periculosidade" do casal
Jéssica entrou em trabalho de parto no domingo, pouco antes de ter o caso submetido à audiência de custódia. Sob escolta, foi levada até o Hospital Municipal Inácio Proença de Gouveia e representada, perante o juiz Claudio Salvetti D'Angelo, pelo advogado Paulo Henrique Guimarães Barbezane.
No termo da audiência de custódia, o juiz assinalou que foram “cumpridas as formalidades legais e respeitadas as garantias constitucionais” para manutenção da prisão de ambos os presos.
“Há prova de materialidade delitiva e indícios suficientes de autoria, bem como da finalidade de traficância”, escreveu o magistrado, que classificou o quadro como de “grande quantidade de entorpecentes e [os presos em flagrante] em situação de possível traficância”.
O juiz não avaliou os casos individualmente, ainda que Jéssica estivesse ausente, prestes a entrar em trabalho de parto. D’Angelo apontou as drogas apreendidas com a dupla como “fonte de desestabilização de relações familiares e sociais” e definiu: “é evidente que a grande quantidade e diversidade de entorpecente encontrada supõe a evidenciar serem, os averiguados, portadores de personalidade dotada de acentuada periculosidade”.
O advogado de Jéssica questionou o que chamou de “desproporcionalidade da justiça” em relação à jovem. Sem advogado constituído para o caso, o marido dela foi representado na audiência por uma defensora pública.
“Jéssica é usuária de maconha, não é traficante. Acharam maconha no quintal da pensão e atribuíram a ela. Mas ela é ré primária, sem nenhuma outra passagem pela polícia, e eu comuniquei à custódia, quando ela foi presa, que estava quase em trabalho de parto”, disse o advogado de Jéssica.
“Participei da audiência sem ela, pleiteei o relaxamento da prisão, em um primeiro momento, e a concessão da prisão domiciliar, em um segundo, e isso foi ignorado. A promotora, que também está grávida, ter negado isso, me pareceu muito emblemático dessa desproporcionalidade com que o caso foi tratado”, criticou.
Procurada sobre o assunto durante o dia, a Secretaria Estadual de Administração Penitenciária informou, na noite desta quarta-feira (14), que a presa “está em processo de transferência para Pavilhão Materno - Infantil, específico para mães e recém-nascidos”. “A rotina diária das mães nestas unidades é voltada para o exercício da maternagem. Elas também possuem área de amamentação, creche, destinadas aos bebês a partir dos quatro meses”, informou a pasta.
A presa deu entrada na Penitenciária Feminina ainda nessa quarta, no início da noite.
O pedido para encaminhamento de mãe e filho a um local de custódia mais adequado não foi ocasional, mas requerido à Justiça pelo delegado José Willy Giaconi Júnior, do 8º DP.
Conselho vê "violações de direitos humanos" e comunicará TJ
Integrante do Condepe (Conselho Estadual de Direitos da Pessoa Humana), o advogado Ariel de Castro Alves esteve hoje na delegacia e conversou com Jéssica.
Ao UOL, Alves classificou as condições para a mãe e o bebê como de “flagrantes violações de direitos humanos”.
“Faremos um relatório sobre o caso para ser encaminhado à corregedoria do TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo)”, disse. “Por ela não ter sido custodiada em local adequado para ficar com a criança e sobre a não aplicação de prisão domiciliar, o que desrespeita a Lei de Execuções Penais, o ECA [Estatuto da Criança e do Adolescente] e o Estatuto da Primeira Infância", enumerou.
"A jovem foi presa com pequena quantidade de drogas, é primária, tem bons antecedentes, tem um filho de 3 anos e o bebê recém nascido: requisitos suficientes para o direito à prisão domiciliar e a responder pelo crime em liberdade provisória”, complementou o advogado.
MP defende prisão
Por nota, o Ministério Público Estadual informou que se manifestou pela prisão cautelar de Jéssica "tendo em vista a presença dos requisitos legais necessários para tanto".
"O flagrante estava formalmente em ordem e se faziam presentes os requisitos dos artigos 312 e 313 do Código de Processo Penal. No mais, não há vedação legal para a prisão de pessoa gestante e há regulamentação própria para convivência do infante com a mãe, sendo que sua execução deve ficar a cargo do Poder Executivo", afirmou o MP.
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