Intervenção no Rio é "licença para matar", diz Conselho de Direitos Humanos
O Conselho Nacional de Direitos Humanos divulgou nesta segunda-feira (19) uma nota pública contrária à intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro por entender que a medida configura “um regime de exceção em tempos de paz”.
Para a entidade, que é vinculada ao Ministério dos Direitos Humanos, o decreto que estabelece a intervenção, assinado pelo presidente Michel Temer (PMDB) na última sexta (16), “concede uma espécie de ‘licença para matar’ aos militares” e legitima uma “ideologia de guerra” como justificativa para eventuais mortes de civis.
Ministra dos Direitos Humanos pede demissão
Na nota, o Conselho afirmou ter recebido “com extrema preocupação e repúdio” a medida, até então inédita desde a promulgação da Constituição Federal de 1988. O decreto “aprofunda a ruptura com a institucionalidade democrática do país, com o estado de exceção, e traz graves ameaças à estabilidade democrática e, consequentemente, aos direitos humanos”, informou a nota.
A justificativa do governo federal para a intervenção é a necessidade de retomada do controle da segurança pública no Rio, cuja credibilidade ficou mais em xeque após a onda de criminalidade registrada no Carnaval.
Com o decreto, foi nomeado o general Walter Souza Braga Netto, do Exército, interventor da área de segurança pública no Estado por parte das Forças Armadas.
A nota do Conselho reconhece a “grave situação de violência vivida pelas comunidades”, mas pondera que a militarização do Estado, com a intervenção, se trata de “uma decisão completamente inadequada e ineficaz”.
“A atuação das Forças Armadas é historicamente marcada pelo aumento do número de violações de direitos, operando na lógica do 'combate ao inimigo' e, segundo essa lógica, a população negra, pobre e moradora de favelas e periferias é quem tem sido 'combatida' pelas tropas do Exército, da Marinha e da Aeronáutica”, prosseguiu a nota.
A entidade ainda questionou a política de combate às drogas por parte do governo federal ao classificá-la como “autoritária e ostensiva” para o combate à violência e insegurança no Estado. No entendimento do conselho, a “guerra às drogas” que motiva, entre outras ações no campo da segurança pública, a intervenção, não conseguiu traçar uma estratégia de combate ao crime organizado nem promover políticas de segurança pública e de temas sociais e com debates sobre a dignidade humana.
Além do decreto, a nota ainda demonstrou preocupação com o agravamento de violações de direitos humanos frente à possibilidade de impunidade resultante da lei federal n° 13.491/2017, que define a Justiça Militar da União como o foro competente para julgar os membros das Forças Armadas que cometerem crimes dolosos contra a vida de civis.
“A Justiça Militar é corporativa e não detém autonomia em relação às Forças Armadas. Os tribunais militares são compostos, majoritariamente, por militares da ativa, subordinado às altas patentes. Assim, dada a sua composição e organização, a Justiça Militar não é isenta para processar os crimes graves praticados por militares contra civis”, classifica o Conselho.
Conselhos divergem e aprovam medida
Também hoje, os conselhos da República e da Defesa Nacional aprovaram a intervenção federal na segurança pública do Rio. Por parte do primeiro conselho, sete membros votaram a favor da medida e dois se abstiveram – os líderes da minoria no Senado e na Câmara dos Deputado, Humberto Costa (PT-PE) e José Guimarães (PT-CE), respectivamente. Já por parte do Conselho da Defesa Nacional, a aprovação foi unânime.
Temer convocou reunião pela manhã no Palácio da Alvorada para discutir a intervenção decretada na sexta e apresentá-la aos conselhos.
Pela legislação, os conselhos devem ser consultados e deliberar sobre propostas de intervenções, mas não têm poder de veto. Ou seja, o presidente não é obrigado a acatar o posicionamento deles se estes fossem contra o ato.
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