Famílias filmam confissão de suspeito para tentar tirar filhos da prisão
As famílias de três jovens presos pela PM, acusados de um roubo na Chácara Bandeirante, na zona sul de São Paulo, filmaram a confissão de um homem que afirmou ter participado do crime, para tentar provar a inocência dos filhos.
Segundo a PM, Marcos Paulo de Oliveira, 22, participou de um assalto na rua das Margaridas, na Chácara Bandeirante, em 11 de janeiro, e foi preso minutos depois na mesma rua conversando com os outros três acusados. A vítima do roubo reconheceu os suspeitos na delegacia.
Os três jovens são o estudante Augusto Ferreira de Souza, 18, e os entregadores Diego Gomes da Silva, 21, e Rafael Erlan Ferreira de Moura da Silva, 18. As famílias deles afirmam que eles são inocentes e que dormiam na casa de Diego no momento do roubo.
Informadas sobre possíveis parceiros de Marcos no roubo, as famílias de Augusto, Diego e Rafael localizaram um deles e, no dia 12 de janeiro, filmaram a conversa com o suspeito sem que ele percebesse. No vídeo, ele admitiu que participou do roubo com Marcos e chamou a prisão dos três jovens de "injustiça".
Rafael atualmente é defendido pelo advogado Wagner Narcizo Macedo, que vai usar o vídeo na defesa de seu cliente. O defensor afirma também que o reconhecimento foi ilegal e que a casa foi invadida pela PM, o que está em desacordo com decisão recente do STJ (Superior Tribunal de Justiça). Ele esteve com Rafael na prisão. "Ele só chorava, não entende o que aconteceu", disse.
Acordaram presos
Na noite de 10 de janeiro, Rafael e Diego trabalharam até 1h da manhã do dia 11 entregando pizzas na região. "Por isso dormimos até tarde aquele dia", conta Sheila Aparecida Gomes de Resende, 37, mãe de Diego e atendente da pizzaria onde os jovens trabalham.
Segundo apurado pelas famílias, por volta de 11h, Marcos cometeu o assalto com mais três jovens e fugiu ao ver a PM, invadindo o cômodo da casa onde Diego e Rafael dormiam. "Eu estava no quarto de baixo, onde dormiam minhas filhas, o Augusto e eu", conta Sheila. "Quando levantei, a PM estava na minha escada, mandando todos os homens descerem", afirma.
"A prisão deles não foi na rua, como a PM diz no boletim de ocorrência", conta a auxiliar de serviços gerais Edilaine Ferreira de Moura, 35, mãe de Rafael. Os PMs, afirmam elas, fotografaram os quatro rapazes e compartilharam as imagens. "Depois, eles foram mostrados juntos, no 100º DP, para a vítima e para uma mulher que estava com ele e que não é citada em nenhum documento", conta Edilaine.
Envio de fotos para vítima é ilegal
O envio de fotos para a vítima antes do reconhecimento e a apresentação dos suspeitos à vítima uns ao lado dos outros violam o artigo 226 do CPP (Código de Processo Penal), que estabelece as regras para o procedimento. Em outubro de 2020, o STJ determinou que o reconhecimento deve ser feito conforme a lei e que não pode ser a única prova para condenar alguém. O CPP determina que a vítima deve descrever os suspeitos, informando todas as características dos acusados que lembrar. Depois, havendo prisão, os suspeitos devem ser apresentados à vítima ao lado de outras pessoas que possuam semelhança com eles.
Apesar de o B.O. dizer que a vítima descreveu os suspeitos, no documento não há essa informação. Os jovens também não estavam com nenhum produto roubado.
'Pobre, preto e favelado é bandido'
As mães relataram à Ouvidoria da Polícia que houve abuso policial no 100º DP, onde o caso foi registrado. Os jovens ficaram das 12h às 17h na viatura e as mães não puderam entrar no DP. As mães relatam que não houve investigação do caso e que os jovens foram impedidos de dar sua versão na delegacia e que as testemunhas nunca foram chamadas a depor.
Edilaine questionou o delegado Fabiano Vieira da Silva, que a atendeu com uma arma na mão e ordenou que ela falasse com um PM. Ela abordou, então, um PM, que disse uma frase de cunho racista: "Quero ver vocês provarem a inocência deles. Pobre, preto, mora na favela, são tudo bandido (sic)". A Ouvidoria da Polícia abriu procedimento e oficiou as corregedorias da PM e da Polícia Civil.
Justiça não fez audiência de custódia
No dia seguinte ao flagrante, a juíza Adriana Barrea cancelou a audiência de custódia em virtude da pandemia, e decretou a prisão preventiva dos quatro suspeitos, sem ouvi-los e sem vê-los.
O caso atualmente é de responsabilidade da juíza Lilian Humes, da 7ª Vara Criminal de São Paulo, que em 9 de fevereiro recebeu a denúncia do MP contra os quatro rapazes e negou pedido de liberdade provisória formulado pelas defesas de Augusto, Diego e Rafael. As testemunhas dos jovens não foram ouvidas pela polícia ou pelo MP, e a audiência judicial em que serão ouvidas as testemunhas, prevista para a tarde de hoje (8), foi adiada para 26 de abril por causa da pandemia.
Em nota, a Secretaria de Segurança Pública afirma que o caso seguiu procedimentos policiais de acordo com a legislação e que a Corregedoria da PM não localizou denúncias sobre os abusos e que está à disposição para apurar qualquer denúncia relacionada a seus agentes. Segundo o MP Estadual, na delegacia os réus "usaram da faculdade de somente se manifestar em juízo, deixando inclusive de proclamar sua inocência perante a autoridade policial".
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