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Viúva de João Alberto recusa R$ 1 milhão do Carrefour e deve ir à Justiça

João Alberto Silveira Freitas morreu após ser espancado por seguranças no Carrefour, em Porto Alegre, em novembro de 2020 - Arquivo pessoal
João Alberto Silveira Freitas morreu após ser espancado por seguranças no Carrefour, em Porto Alegre, em novembro de 2020 Imagem: Arquivo pessoal

Hygino Vasconcellos

Colaboração para o UOL, em Florianópolis

01/04/2021 16h59Atualizada em 02/04/2021 16h41

A viúva de João Alberto, Milena Borges Alves, recusou R$ 1 milhão em proposta de acordo com o Carrefour. Agora, os advogados dela devem entrar na Justiça e cobrar entre R$ 10 milhões e R$ 15 milhões. Do valor total, metade seria por indenização por dano moral e a outra parte por dano material. Os advogados da viúva encerraram as negociações com a multinacional em 24 de março.

João Alberto, 40 anos, morreu após ser espancado por dois seguranças no estacionamento do Carrefour, na unidade da zona norte de Porto Alegre. O crime aconteceu em 19 de novembro. Seis pessoas viraram réus por homicídio triplamente qualificado, sendo que dois seguranças foram presos no dia do crime.

Até então, as negociações eram sigilosas e foi necessária a assinatura de um termo de confidencialidade por Milena e seus advogados. O Carrefour contesta a informação da família e diz estar negociando indenização com o Ministério Público do Rio Grande do Sul.

Após a publicação da reportagem, na sexta-feira (2), a empresa encaminhou novo posicionamento ao UOL, afirmando que já firmou oito acordos de indenização com familiares de João Alberto. Segundo o Carrefour, o único acordo não finalizado é o que está sendo negociado com a viúva (leia mais abaixo).

Advogados de Milena criticam valor oferecido

Um dos motivos para a recusa da defesa de Milena é que o valor oferecido pela rede de supermercado é o mesmo pago pela morte do cão Manchinha, após ser espancado por um segurança, também no Carrefour de Osasco (SP). O caso aconteceu em 2018. A marca francesa assinou um termo de compromisso e destinou R$1 milhão para órgãos ligados à causa animal.

Em carta aberta, os três advogados da viúva criticaram o valor oferecido para Milena. "Não podemos deixar de comparar o Manchinha com o Nego Beto. Parece grosseiro fazer este comparativo, mas torna-se impossível não traçar um paralelo, pois parece que, para o Carrefour, o valor dado a vida de um cachorro e de um ser humano é exatamente o mesmo."

Em conversa com o UOL, o advogado Hamilton Ribeiro lembrou do caso George Floyd, morto por um policial em maio do ano passado nos Estados Unidos. A indenização paga à família foi de US$ 27 milhões, na época da decisão equivalente a R$ 150 milhões. "É muito injusto. Eles literalmente acabaram com a vida da Milena. Ela mal sai de casa, não trabalha mais, dorme duas a três horas por dia e tem medo de ser atacada ao ir para a rua", disse Ribeiro.

"A comparação é inevitável (entre o caso João Alberto com George Floyd. Em outras palavras, necessitamos alterar a jurisprudência, mas também precisamos mudar a cultura, a partir dessa negociação! Fica mais duas perguntas para a sociedade brasileira. Quanto vale a vida de um negro afro-brasileiro e um negro afro-americano? Quando vai ter fim a síndrome do cachorro vira-lata", dizem os advogados de Milena na carta.

O Carrefour, segundo o defensor, estaria "se agarrando" a um valor estipulado pelo STJ (Supremo Tribunal de Justiça) de 500 salários mínimos. "Na legislação brasileira não há um limite", afirma Ribeiro.

O que diz o Carrefour

Segundo o Carrefour, já foram fechados acordos para a indenização dos quatro filhos, da enteada e da neta de João Alberto. O pai e a irmã da vítima já receberam o valor pactuado.

A nota da empresa afirma que "o único acordo não finalizado é o da viúva de João Alberto, a senhora Milena Borges Alves, que vem insistindo, por intermédio de seus advogados, no recebimento de valores não razoáveis e fora dos patamares jurisprudenciais, o que tem dificultado o consenso".

Ainda de acordo com o Carrefour, o valor oferecido "é bastante superior ao estipulado para indenização por morte de familiar pelo Superior Tribunal de Justiça, e também superior ao montante que os seus advogados vêm comunicando na mídia".

A rede de supermercados salienta que está negociando junto ao Ministério Público do Rio Grande do Sul uma indenização por danos morais coletivos, por meio de um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta), "estabelecendo compromissos e obrigações da empresa com a sociedade para a luta contra o racismo no país".