Lula veta pensão a crianças com microcefalia vítimas da zika e revolta mães
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu vetar integralmente o projeto de lei que previa indenização por dano moral e concessão de pensão especial a crianças com microcefalia e outras deficiências permanentes decorrentes de síndrome congênita associada à infecção pelo vírus da zika.
O veto foi publicado no Diário Oficial da União desta quinta-feira (9) e foi justificado "por contrariedade ao interesse público e por inconstitucionalidade". Segundo estimativa de associações, 1.589 famílias seriam beneficiadas com a pensão.
A decisão do presidente revoltou pais e mães de crianças, que durante nove anos negociaram no Congresso a aprovação do projeto. Protocolado em 15 de dezembro de 2015 pela então deputada e hoje senadora Mara Gabrilli (PSD-SP), ele estabelecia uma indenização de R$ 50 mil e o pagamento de uma pensão vitalícia às crianças seguindo o teto do INSS (R$ 8.092,54, no valor atual).
"O governo federal não está dando nada, não autorizou nada. Na surdina da noite, como um dos piores tipos de ladrões, aquele que te rouba a consciência e te tira a esperança de dias melhores", diz Germana Soares, mãe de Guilherme, 9, que tem microcefalia. Ela também é vice-presidente da ONG UniZika Brasil.
Esse projeto percorreu duas vezes a Câmara Federal e todas as comissões do Senado, de onde saíram com votos unânimes positivos, e, ao chegar para sanção presidencial, recebemos esse veto sem nenhuma oportunidade de negociação, trazendo frustração e decepção para mães e familiares
Germana Soares
Medida provisória frustra mães
Junto ao veto, o governo federal publicou uma MP (medida provisória) que estabeleceu o pagamento de indenização no valor de R$ 60 mil, em uma única parcela. Para as mães, a MP é "excludente e limitadora" e os prejuízos financeiros, emocionais e físicos não são pagos com esse valor. "Indenização não é assistência. Esse valor não paga sequer cirurgias de osteotomia", diz Germana.
Ela cita que somente o valor de terapias de crianças se aproxima de R$ 10 mil ao mês.
"Em uma tentativa de remediar esse veto, o presidente optou por publicar uma medida provisória que, na prática, serve apenas como um cala-boca para as mães, tentando silenciá-las e minimizar o impacto de sua decisão", completa Luciana Arraes, presidente do UniZika Brasil.
Em momento algum, o governo, os ministérios e as autoridades competentes se dispuseram a nos receber para construir algo diferente do PL-6064/23. Eles tomaram a decisão de elaborar essa medida provisória por conta própria, sem ouvir as reais necessidades das mães e das famílias. Nós, mães, estamos extremamente tristes, frustradas e decepcionadas com o governo
Luciana Arraes
Justificativa do veto
Segundo o veto publicado, o projeto afronta a Lei de Responsabilidade Fiscal e a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2025.
"Em que pese a boa intenção do legislador, a proposição legislativa contraria o interesse público, pois cria despesa obrigatória de caráter continuado e benefício tributário e amplia benefício da seguridade social, sem a devida estimativa de impacto orçamentário e financeiro, identificação da fonte de custeio, indicação de medida de compensação e sem a fixação de cláusula de vigência para o benefício tributário", diz o texto.
Lula ainda cita na mensagem ao Congresso que, ao dispensar reavaliação periódica dos pacientes, a proposição "diverge da abordagem biopsicossocial da deficiência, contraria a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e cria tratamento não isonômico em relação às demais pessoas com deficiência."
O governo ainda alega que o projeto tem vício de inconstitucionalidade ao não apresentar "estimativa do impacto orçamentário-financeiro correspondente e previsão de fonte orçamentária e financeira necessária à realização da despesa ou previsão da correspondente transferência de recursos financeiros necessários ao seu custeio."
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