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Entenda por que as dunas avançaram e interditaram casas em Florianópolis

Abinoan Santiago

Colaboração para o UOL, em Florianópolis

12/07/2021 16h32Atualizada em 13/07/2021 11h31

A autônoma Denise Santana, de 42 anos, colocou uma atividade a mais na rotina diária nos últimos meses: retirar areia de dentro de casa. Ela mora na Praia dos Ingleses, na região norte de Florianópolis (SC), e vê com desespero as dunas "engolindo" o imóvel onde reside há dois anos.

De acordo com o professor do Departamento de Geociências da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), José Carlos Rocha Gré, o problema é resultado de dois fatores: a areia seca em razão da estiagem em combinação com o vento forte de origem da região sul da Ilha de Santa Catarina.

Minha situação é a pior possível. Vivo em desespero porque estou sem fonte de renda, com risco de perder a minha moradia e tudo o que tenho investi aqui. Não vou sair daqui por não tenho para onde ir"
Denise Santana, moradora da Praia dos Ingleses

A família de Denise é a única das cinco que viviam no local a permanecer na praia, mesmo após a interdição pela Defesa Civil de Florianópolis.

Gaúcha de Porto Alegre, a moradora conta que não tem para onde ir com os dois filhos, de 25 e 11 anos. O caçula tem deficiência motora e a família não possui parentes na capital catarinense.

Depois de quase três anos em Florianópolis, onde montou um pequeno restaurante na beira da praia, Denise lamenta ao ver o empreendimento sendo destruído pouco a pouco pela areia.

"Tinha um bar e uma casa em Porto Alegre. Vendi por R$ 150 mil e viemos para Florianópolis, onde reformamos esse restaurante que estava parado na praia. Investi tudo o que tinha e não tenho mais nada", disse. "Vou ficar até Deus quando permitir."

Por que dunas estão invadindo casas em Florianópolis?

Segundo o professor José Carlos Gré, da UFSC, o problema não é novo, pois as dunas sempre se movimentaram na região. No caso da Praia dos Ingleses, a areia que atinge as casas é levada de outra, da Praia de Moçambique, que fica a quase dez quilômetros ao Sul.

"São séculos e talvez até milênios que esse movimento de dunas está ativo. Essa areia fica sujeita aos ventos. A corrente litorânea deposita areia na Praia de Moçambique e quando o sol seca essa areia, o vento que vem do sul da ilha a transporta ao norte em direção à Praia dos Ingleses, promovendo o avanço contínuo das dunas", afirma.

O pesquisador de geociências esclareceu que antes da urbanização da região costeira da Praia dos Ingleses, já existia esse movimento de dunas. Esse fenômeno, contudo, pode ter se intensificado nos últimos meses em razão do período de estiagem somado por ventos mais fortes.

A urbanização ocupou um lugar ruim porque foi instalada no caminho das dunas. A tendência é o soterramento. [O vento mais forte] é uma questão meteorológica e nesse período de estiagem, com a areia mais seca e vento intenso, o fenômeno é mais efetivo"
José Carlos Rocha Gré, pesquisador da UFSC

Para Gré, é possível construir barreiras de contenção para impedir o avanço das dunas, mas pondera que eventuais indenizações aos moradores pela Prefeitura de Florianópolis poderiam custar menos aos cofres públicos do que uma obra.

"É uma questão de custo benefício. A engenharia é capaz de solucionar, mas vai ser tão custoso que valerá mais a pena remover os moradores dali", opinou.

Casas estão irregulares, diz Defesa Civil

Em nota enviada ao UOL, a Defesa Civil de Florianópolis informou que as casas ocupam uma APP (Área de Proteção Permanente), conforme definido pelo zoneamento urbano do município.

As casas são irregulares e já tem processo ambiental em andamento há mais de dez anos. Já foram autuadas, tem processo e agora o caso corre na Justiça, que vai determinar o futuro das residências"
Defesa Civil de Florianópolis

A Defesa Civil afirmou que levará o caso para ser intermediado pelo Ministério Público de Santa Catarina.

"Os órgãos estão alinhando as medidas de intervenção que serão realizadas prezando a segurança dos moradores e que tenha menor impacto ambiental. A questão será levada ao Ministério Público para garantir que as medidas tomadas sejam responsáveis quanto às questões ambientais", diz a Defesa Civil.