Justiça solta irmãos presos por roubo, mas que estavam a 3 km do crime
A 1ª Vara Criminal de Diadema, na grande São Paulo, mandou soltar ontem dois jovens negros que ficaram presos durante um mês pelo roubo de dois carros. A decisão da juíza Cecília Prado Euzébio pela soltura ocorre após a defesa apresentar imagens de câmeras de segurança que mostravam os rapazes a cerca de três quilômetros do local onde os crimes ocorreram. Os jovens são irmãos.
Em 1º de março, o vendedor Luiz César Marques Junior, de 24 anos, e o montador Gustavo Borges Marques, de 20, estavam em frente a um bar em Diadema, encostados no capô de um dos carros que haviam sido roubados minutos antes. Ao vê-los próximos ao veículo, a PM (Polícia Militar) os prendeu pela suspeita do crime. Eles foram acusados pelo MP-SP (Ministério Público de São Paulo) dias depois, após as vítimas declararem tê-los reconhecido.
Busca por evidências
Após a prisão, os familiares dos jovens começaram a buscar evidências que comprovassem a inocência deles. Encontraram imagens de uma câmera de segurança em frente ao bar, que mostram Luiz e Gustavo chegando no local a pé, com o pai deles, às 18h36. Quatro minutos depois, às 18h40, um dos carros foi roubado a mais de três quilômetros de onde os irmãos estavam.
A versão dos jovens é a de que estavam no bar e haviam atravessado a rua para fumar, e acabaram parando ao lado de um dos carros roubados. Era um Voyage prata, equipado com um rastreador. As imagens mostram o carro passando na rua, em frente ao bar, e sendo estacionado no mesmo momento em que Gustavo estava na calçada, conversando com outras pessoas.
A PM chegou ao local minutos depois, devido ao rastreador, e prendeu ambos em flagrante por estarem ao lado do veículo.
"Ninguém rouba um carro e fica ali parado, do lado do carro roubado, esperando a polícia chegar. É uma questão de lógica", afirma o advogado Ewerton Carvalho, um dos que atuam na defesa de Luiz e Gustavo.
Segundo ele, a Justiça só reviu a decisão porque recebeu provas concretas da inocência deles. Além destas imagens, eles anexaram mensagens enviadas pelos irmãos e uma foto de ambos em frente ao bar no momento dos crimes. "Tivemos que fazer uma grande mobilização, corremos atrás de imagens, e mesmo assim levou um mês para revogarem a prisão deles", protesta Carvalho.
O UOL tenta contato com o 28º BPM (Batalhão de Polícia Militar) de Diadema, responsável pela prisão. Assim que houver uma resposta do órgão, o texto será atualizado.
Imagens dos jovens sendo recepcionados por amigos e parentes ontem, em frente ao CDP (Centro de Detenção Provisória) de Diadema, repercutiram nas redes sociais.
O processo
Além de considerar o histórico dos irmãos, que "não ostentam maus antecedentes", a juíza determinou a soltura "levando-se em conta as imagens juntadas", e ambos vão responder em liberdade à denúncia do Ministério Público.
A magistrada, no entanto, impôs algumas restrições, que incluem a proibição de frequentar lugares "de reputação duvidosa ou conhecidos pela prática de ilícitos, tais como bares, boates, zonas de meretrício, bailes funk e pontos de venda e comercialização de drogas". Ela também os proibiu de mudarem de endereço sem autorização ou saírem da cidade por mais de oito dias.
Racismo
No pedido de habeas corpus que resultou na soltura, a defesa de Luiz e Gustavo atribui as prisões ao racismo. "Nota-se aqui o massacrante racismo estrutural, enraizado na nossa sociedade, que não permite que homens pretos estejam livres e caminhem sem medo de serem confundidos com bandidos por conta do tom da sua pele", afirma um trecho da petição.
"A realidade de um homem preto na sociedade é recheada de abordagens, desconfiança, acusações injustas e muitos mofam na cadeia por não conseguirem provar sua inocência", completa o documento.
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