'Chegou no osso', diz pai de menina que teve dedo mordido por piranha no CE
Colaboração para o UOL
19/02/2024 09h25Atualizada em 19/02/2024 16h45
Ataque de piranhas em açudes da região centro-sul do Ceará estão assustando a população local e os visitantes que costumam fazer desses lagos artificiais a sua "praia no interior".
O que se sabe
Moradores ouvidos pelo UOL afirmam que os casos estão aumentando e o medo de um ataque dos peixes carnívoros está afastando os banhistas desses locais. Eles dizem não haver placas ou avisos de que há piranhas nos açudes.
No feriado de Carnaval, ao menos uma dezena de casos de pessoas feridas por mordidas desses peixes foram registrados nos açudes entre as cidades de Iguatu e Orós. Entre elas, uma menina de 2 anos que teve uma parte da ponta do dedo do pé arrancado em uma única mordida.
O avô da menina, o comerciante Francisco Clidenor Teixeira Filho, 54, contou ao UOL que a família, que mora em Iguatu (CE), recebeu parentes de Fortaleza durante o Carnaval. O grupo decidiu então passar a terça-feira de Carnaval em um balneário que fica em um canal que interliga o açude de Lima Campos ao açude de Orós.
Minha nora estava com a minha neta, Eloísa, na água. De repente ouvimos o grito da criança. Minha nora pegou correndo a menina no colo e, quando saíram, vimos que escorria sangue pelo pezinho dela. Deu para ver que tinha piranhas na água. E uma delas tinha mordido o dedinho do pé dela e arrancou quase que completamente a carne do dedo, apareceu o osso.
Francisco Clidenor Teixeira Filho, comerciante
Levada para uma UPA (Unidade de Pronto Atendimento), a menina recebeu atendimento de emergência e precisou ser levada para o hospital São Camilo, em Iguatu, para ser avaliada por um especialista. Apesar de não perder o dedo, ela se recupera em casa, tomando antibióticos.
Mordida na mão
Outro caso ocorrido durante o Carnaval envolveu um rapaz de 29 anos que teve um ferimento profundo em um dos dedos da mão direita após ser mordido por uma piranha no açude Trussu, que fica no município de Iguatu.
A mãe do rapaz, a dona de casa Maria do Socorro Silva, 51, conta que a família havia se preparado para passar a segunda-feira de Carnaval no açude, um local frequentado semanalmente por todos, quando o filho foi atacado.
Eu e meu esposo entramos no açude, até aí tudo bem. Saímos, meu filho entrou e eu estava preparando a minha mãe, de 78 anos, para um mergulho, quando meu filho começou a gritar. Uma piranha mordeu o dedo da mão dele e sangrou muito. Foi desesperador, deu muito medo. Ele conseguiu sair da água, mas outras pessoas entraram, apesar de a gente avisar que não entrassem. Elas também foram mordidas, um rapaz teve que ir para o hospital porque a hemorragia no dedo do pé não parava.
Maria do Socorro Silva, dona de casa
Tanto Francisco quanto Maria do Socorro afirmam terem conhecimento de ao menos dez casos de pessoas mordidas em açudes da região durante o feriado de Carnaval. Assustados, eles dizem que já não têm mais coragem de frequentar os balneários sem que o Poder Público tome uma providência para aumentar a segurança dos banhistas.
"Sou nascida e criada em Iguatu, mergulhando nos açudes, e nunca na minha vida ouvi falar em tantos casos acontecendo de uma vez", diz a dona de casa. "Alguma coisa aconteceu que desencadeou isso aí, porque pode ter sido um derrame, um 'peixamento', como a gente chama, foi colocado muitos alevinos de peixe nos açudes e aí podem ter vindo filhotes de piranha, piranhas-bebê e elas se desenvolveram", pondera Francisco.
Defesa dos filhotes
Ouvido pelo UOL, Telton Ramos, biólogo e pesquisador do Instituto Peixes da Caatinga e Universidade Federal da Paraíba, explicou que existem duas espécies de piranhas nessa região. A Serrasalmus rhombeus, conhecida como pirambeba ou falsa piranha, e a Pygocentrus nattereri, conhecida como piranha-vermelha.
Como estamos no período chuvoso, geralmente quando os peixes se reproduzem, essas espécies fazem seus ninhos nas macrófitas, um tipo de vegetação aquática, que geralmente está localizada nas margens dos açudes, lagoas e rios.
As piranhas, assim como outras espécies de peixes, atacam quando alguém se aproxima dos ninhos delas. Isso é natural. Essas duas espécies de piranha ocorrem naturalmente na região, não foi introduzida no hábitat, como algumas pessoas estão dizendo. O que acontece é que esses peixes vivem nos rios, mas geralmente em áreas água parada ou de pouca correnteza. Então quando foram construídos os açudes, esses peixes se adaptaram muito bem e proliferaram.
Telton Ramos, biólogo e pesquisador
Quando pequenas, as piranhas são onívoras e se alimentam de restos de vegetais, insetos, e animais. Na fase adulta, elas se tornam mais carnívoras, se alimentando de outros peixes. Os ataques são, geralmente, para se defenderem.
Segundo o biólogo, cujo trabalho no instituto prevê o estudo e a conservação dessas espécies no Nordeste, elas às vezes podem "atacar" uma pessoa ou outro animal se houver um ferimento. Ou também quando estejam sem alimentos. Porém, ele lembra que outras espécies de peixes, até piabas, podem fazer isso.
Como forma de se proteger de futuros ataques, Ramos recomenda aos banhistas que evitem se aproximar das áreas que têm vegetação nos açudes. O UOL entrou em contato com as prefeituras de Iguatu e Orós, para saber quais providências foram tomadas pelo Poder Público, mas até o momento não houve resposta aos questionamentos.