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PLC 174: o que é o projeto apontado como motivo para morte de Marielle

A vereadora Marielle Franco durante discurso na Câmara Municipal do Rio de Janeiro Imagem: Divulgação-6.set.2017/Câmara Municipal do RJ

Do UOL, em São Paulo

24/03/2024 19h06

O relatório da Polícia Federal sobre o assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) divulgado hoje (24) indica que uma proposta de lei de Chiquinho Brazão que buscava regularizar terras em áreas dominadas pela milícia pode ter sido o estopim para o planejamento do crime.

Chiquinho foi preso hoje, juntamente com o irmão, o conselheiro do TCE-RJ (Tribunal de Contas do Estado) Domingos Brazão e o ex-chefe da Polícia Civil do Rio Rivaldo Barbosa, por suspeita de comandarem o crime.

O que diz a investigação da PF

Chiquinho Brazão foi autor do PLC (Projeto de Lei Complementar) nº 174/2016 na Câmara dos Vereadores do Rio. A PF aponta que a votação da proposta causou desgaste entre Brazão e Marielle e teria servido de motivação para o planejamento do assassinato.

Ele foi vereador do Rio pelo MDB e Avante entre 2015 e 2019. Já Marielle era parlamentar eleita pelo PSOL. Chiquinho é atualmente deputado federal pelo União Brasil desde 2023.

A proposta do então vereador era regularizar lotes de terra. O PLC 174/2016 mirava áreas irregulares nas regiões de Vargem Grande, Vargem Pequena, Itanhangá e Jacarepaguá, na zona oeste do Rio. Marielle votou contra a proposta, mas o projeto avançou na Câmara em primeiro turno em 26 de maio de 2017.

Na semana seguinte, em 31 de maio, Chiquinho apresentou um texto substitutivo. Ele tinha a intenção de ampliar e flexibilizar a regularização de terras em áreas dominadas pela milícia na capital e favorecer a especulação imobiliária e a grilagem de terras, segundo a Polícia Federal.

A votação do substitutivo foi adiada algumas vezes e levou cerca de seis meses para acontecer. Em 23 de novembro de 2017, a bancada do PSOL mais uma vez se posicionou contrária ao projeto, que avançou com 27 votos, apenas um a mais do que o necessário para aprovação.

Segundo a investigação, Marielle votou contra por entender que o projeto não atendia "áreas carentes", mas loteamentos e condomínios de classe média e alta em áreas controladas por milícias.

O relatório destaca que Chiquinho Brazão se revoltou e chegou a cobrar apoio de Marielle. Posteriormente, a assessoria dela pediu o apoio de Chiquinho para outro projeto —não mencionado na investigação—, e o vereador teria negado sob uma fala carregada de irritação.

O depoente se recorda que Chiquinho teria reclamado da votação contrária de Marielle, demonstrando irritação fora do comum e jamais vista pelo depoente, já que Chiquinho sempre se mostrou um parlamentar discreto e tranquilo.
Trecho de relatório da Polícia Federal

Ainda de acordo com a PF, Chiquinho chamou o PSOL de "calcanhar de Aquiles do PMDB". Isso porque medidas do PSOL iam de encontro aos interesses do partido (atualmente chamado MDB), como a representação que ensejou a prisão de Adriana Ancelmo (ex-esposa de Sérgio Cabral) e a ação popular que impediu a nomeação do ex-deputado Edson Albertassi ao TCE. À época, a imagem do MDB estava fragilizada com as prisões na Operação Lava Jato, diz o documento.

A redação final do PLC 174/2016 foi aprovada no dia da morte de Marielle, 14 de março de 2018. Mas naquele mesmo ano, o Órgão Especial do TJ-RJ (Tribunal de Justiça do RJ) julgou a lei inconstitucional.

Chiquinho Brazão era atuante em políticas fundiárias

Chiquinho Brazão é suspeito de ter mandado assassinar Marielle Imagem: Reprodução

Chiquinho Brazão tem um longo histórico de atuação em políticas fundiárias. A PF diz que o vereador pensava em seu reduto eleitoral ao aprovar a regularização de lotes, mas também favorecia ações da milícia e grilagem de terra. A PF fala em indícios de relação da família Brazão com essas atividades criminosas.

Ele foi autor de mais de dois Projetos de Leis Complementar em 2015. Entretanto, os processos de regularização enfrentaram entraves, como falta de documentação de titularidade de imóveis, durante a tramitação. O PLC 174/2016 veio logo em seguida.

O prefeito do Rio, Marcelo Crivella (Republicanos), vetou o PLC em 5 de abril de 2018. O veto foi derrubado um mês depois, e a Lei Complementar 188/2018 foi publicada em 16 de maio. Ronnie Lessa, suspeito de assassinar Marielle, receberia terrenos como recompensa pelo crime.

Três suspeitos presos neste domingo

A PF prendeu hoje suspeitos de serem os autores do assassinato de Marielle. Os irmãos Chiquinho e Domingos Brazão (suspeitos de serem mandantes) e Rivaldo Barbosa (suspeito de planejar e obstruir as investigações do caso) foram transferidos para um presídio federal em Brasília.

Os irmãos Brazão são suspeitos de serem "autores intelectuais" dos homicídios. Os crimes também incluem a tentativa de assassinato de Fernanda Chaves, assessora de Marielle Franco, que estava no carro no dia do assassinato. Rivaldo foi detido por obstrução de justiça e por ser a mente por trás do planejamento, segundo a PF.

A PF cumpriu outros 12 mandados de busca e apreensão no Rio de Janeiro. A investigação confirmou buscas contra o ex-titular da Delegacia de Homicídios da Capital Giniton Lages, além do comissário Marcos Antônio de Barros Pinto, e da esposa de Rivaldo, Erika de Andrade de Almeida Araújo. A reportagem não identificou as defesas deles.

A PF chegou aos suspeitos após delação de Ronnie Lessa, suspeito de matar Marielle. O ex-policial militar apontou Chiquinho Brazão como mentor do crime. A citação motivou a mudança do caso do Superior Tribunal de Justiça para o Supremo Tribunal Federal.

O que dizem os suspeitos presos

Domingos Brazão nega envolvimento com a morte de Marielle. O advogado Ubiratan Guedes, que representa Domingos, disse que tem "certeza que ele é inocente". "Ele não tem ligação com a Marielle, não conhecia."

A assessoria de imprensa do conselheiro disse que ele foi "surpreendido" com a determinação do STF. "Desde o primeiro momento sempre se colocou formalmente à disposição das autoridades para prestar todos os esclarecimentos que entendessem necessários". O deputado federal disse que não há "qualquer motivação que possa lhe [sic] vincular ao caso e nega qualquer envolvimento com os personagens citados."

A defesa do delegado Rivaldo disse que ainda não teve acesso aos autos nem à decisão que decretou a prisão. Portanto, não vai se manifestar.

O UOL não conseguiu localizar a defesa do deputado Chiquinho Brazão.

Assassinato de Marielle completou 6 anos

Em 14 de março de 2018, Marielle e Anderson foram assassinados na região central do Rio. Eles voltavam de um evento em que a vereadora do PSOL palestrou quando um Cobalt prata emboscou o carro em que estavam e 14 tiros foram disparados.

Os suspeitos de cometer os assassinatos da vereadora e do motorista estão presos. Investigados como autores dos homicídios de Marielle Franco e Anderson Gomes, os ex-policiais militares Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz, ainda serão julgados.

Queiroz firmou acordo de delação premiada com a PF. Ele confessou ter participado do crime e apontou que Ronnie Lessa como autor dos disparos.

A investigação do caso já foi comandada por cinco delegados diferentes e três grupos de promotores. O Ministério da Justiça e Segurança Pública escalou uma equipe para investigar o caso logo nos primeiro meses do governo Lula (PT).

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