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Contravenção e propina: o que diz miliciano sobre caso Marielle

A vereadora Marielle Franco e o motorista Anderson Gomes foram mortos na noite de 14 de março de 2018, no Centro do Rio de Janeiro. Imagem: Divulgação-6.set.2017/Câmara Municipal do RJ

Daniele Dutra

Colaboração para o UOL, no Rio de Janeiro

28/03/2024 17h06

O relatório final da Polícia Federal sobre as investigações do caso Marielle Franco destaca o depoimento do miliciano Orlando Curicica, que relatou mensalidades pagas à Delegacia de Homicídios (DH), a suposta atuação do ex-chefe da Polícia Civil do Rio Rivaldo Barbosa e como o jogo do bicho teria facilitado a morte da vereadora.

Não que a contravenção tenha mandado matar, mas a contravenção criou um sistema que facilitou a morte de Marielle, disse Orlando em 2019 em depoimento à PF.

O UOL tenta contato com a defesa de Rivaldo Barbosa. Caso haja resposta, o texto será atualizado.

O que se sabe:

As informações passadas por Curicica vão ao encontro da delação de Ronnie Lessa, acusado de ser o autor dos disparos contra a parlamentar e seu motorista Anderson Gomes, em março de 2018. Esquemas e assassinatos a mando de contraventores aconteciam à sombra da impunidade da DH, que, por outro lado, fazia extorsões e cobrava mensalidades da milícia, segundo o documento da PF.

O que aconteceu foi que eles não investigaram. Não havia como investigar porque se não ia chegar na contravenção, porque se chegar no Escritório do Crime, vai chegar no Rogério de Andrade e na contravenção. Como é que vai acusar a contravenção? Eles não tinham como.

O deputado federal Chiquinho Brazão (União Brasil- RJ) e Domingos Brazão, que é conselheiro do TCE-RJ (Tribunal de Contas do Rio de Janeiro) foram apontados por Ronnie Lessa como mentores intelectuais da morte da vereadora. A citação a Chiquinho motivou a transferência do caso do Superior Tribunal de Justiça para o STF.

Domingos, Chiquinho e o delegado e ex-chefe da Polícia Civil do Rio Rivaldo Barbosa foram presos no Rio de Janeiro. A operação foi deflagrada no último domingo (24) porque os suspeitos apresentavam risco de fuga. Por volta das 16h de domingo, eles chegaram a Brasília, para onde foram transferidos pela PF.

Propina mensal

Em depoimento, Orlando citou um episódio de extorsão que sua esposa e ele sofreram na Delegacia de Homicídios, na época em que Rivaldo era chefe da DH. Para que ele não fosse acusado de um crime de porte de arma de fogo, a quantia de R$ 20 mil teria sido entregue a um subordinado do delegado.

Além disso, o miliciano explica que existia um sistema de pagamento mensal realizado pelas milícias para as delegacias. A DH, por exemplo, ele recebia mensalmente em torno de R$ 60 a R$ 80 mil, isso quando não tinham que pagar remessa adicional em razão dos crimes que deixavam provas ou rastros.

A DH, as especializadas ganham mais, que varia entre R$ 60 e R$ 80 mil por mês e na DH. Além do que eles recebem mensalmente, quando entra um homicídio, por exemplo, deixou uma filmagem, deixou um rastro que eles conseguem direcionar o homicídio para determinado contraventor, eles pagam por fora, diz Orlando à PF.

Segundo o depoimento, a DH também teria recebido cerca de R$ 300 mil de uma pessoa ligada ao contraventor Rogério de Andrade para não "perturbar" os prováveis envolvidos em outras execuções.

Por que mataram a Marielle?

Além das três prisões, a investigação confirmou buscas contra o ex-titular da Delegacia de Homicídios Giniton Lages, além de Marcos Antônio de Barros Pinto e Erika de Andrade de Almeida Araújo, mulher do delegado Rivaldo Barbosa.

Na última segunda-feira (25), Lages, que chegou a escrever um livro sobre Marielle Franco, esteve na Secretaria de Administração Penitenciária (Seap), no centro do Rio, para colocar uma tornozeleira eletrônica.

Segundo o relatório da PF, os irmãos mandaram matar Marielle porque a vereadora atrapalhava os interesses dos irmãos Brazão. Em especial, por sua atuação junto a comunidades em Jacarepaguá, em sua maioria dominadas por milícias, onde se concentra relevante parcela da base eleitoral dos suspeitos.

No final do relatório, a PF reforça que a Marielle foi vítima dos "efeitos colaterais" dessas organizações criminosas, disputas territoriais e corrupção:

Inicialmente, essa política perniciosa em relação aos crimes contra a vida era restrita aos efeitos colaterais dos diversos conflitos paralelos que ocorrem no Rio de Janeiro, tais como guerras de facções do tráfico de entorpecentes, confrontos entre milícias paramilitares, disputas de territórios do famigerado jogo do bicho e máquinas caça-níquel etc. Entretanto, o presente caso revela que as desavenças regulares do jogo político transbordaram o tabuleiro da democracia e descambaram para essa mesma vala de sangue e corrupção. A atuação séria, coordenada e combativa de Marielle Franco e seu partido em face do estado de coisas que permeiam o Rio de Janeiro nos meses que antecederam sua morte, foi determinante para que os investigados concebessem seu homicídio. Relatório final da Polícia Federal.

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