Desembargador manteve prisão de homem que cortou corda: 'Desintoxicação'
O desembargador relator Sergio Luiz Patitucci, do Tribunal de Justiça do Paraná, determinou que Raul Pelegrin, 41, deveria seguir preso. Um dos argumentos citados durante a sessão, realizada na quinta-feira (4), foi de que o empresário passaria por uma "desintoxicação" na unidade prisional. Raul, preso sob suspeita de cortar a corda de um trabalhador, morreu nesta sexta-feira (5).
O que aconteceu
Em seu voto, Sergio Luiz Patitucci defendeu a necessidade de manutenção da prisão. "Estou mantendo a prisão até para que ele faça uma desintoxicação e, futuramente, quem sabe, possa fazer um tratamento [para dependência química]", argumentou. Na quinta-feira (4), a 1ª Câmara Criminal analisou a decisão da Justiça do Paraná que negou o habeas corpus, solicitado pela defesa de Raul, em 21 de março.
O desembargador citou o atestado médico do psiquiatra de Raul. No documento, constava a informação de que ele fazia uso de medicação para dependência química. Para o magistrado, os remédios poderiam ser fornecidos ao empresário dentro da prisão. "Nada impede que esse medicamento seja feito em clausura", destacou.
A defesa argumentou que a prisão do empresário foi pacífica e ressaltou que ele seria réu primário. O desembargador alegou que houve resistência no momento da prisão, ao contrário do defendido pelos advogados. "No boletim de ocorrência lavrado pela Polícia Militar, houve resistência. Foi necessário o arrombamento das portas para ter acesso ao imóvel porque ele [morador] não aceitava a abertura da porta".
Patitucci citou que, apesar de réu primário, o homem teria antecedentes criminais. "Eu entendo que há essa necessidade em razão do uso de substâncias ilícitas por ele e, como dito, vossa excelência [advogado] disse que ele é primário, primário ele é, mas ele tem antecedentes criminais e já possui anotações criminais por outros delitos de resistência desacato, posse de drogas. É um problema para a sociedade", avaliou.
Para o desembargador, não havia garantia de que, ao ser solto, o empresário se internaria para tratamento da dependência química. "Pelo que consta, ele também não aceita fazer esse tratamento. O senhor [advogado] falou que teria uma clínica para ele ser internado, mas ninguém garante que ele iria para lá. Entendo que não seria o caso. Estou denegando a ordem", disse.
O voto do relator foi seguido pelos desembargadores Miguel Kfouri Neto e Lidia Maejima. Em nota, os advogados de Raul criticaram a decisão. Procurada, a Justiça do Paraná disse ao UOL que "não emite notas sobre decisões e não faz posicionamento sobre casos judiciais".
Preso morreu
O empresário Raul Pelegrin estava detido na Casa de Custódia de Piraquara desde o dia 27 de março, conforme apurou o UOL. Ele foi preso em flagrante pelo crime no dia 14 de março e teve a prisão convertida em preventiva (por tempo indeterminado).
Preso morreu no Hospital Angelina Caron, na região metropolitana de Curitiba, nesta sexta-feira. Raul estava internado no hospital desde quinta-feira (4), com escolta policial, por apresentar dificuldades respiratórias, segundo a Polícia Penal do Paraná.
A causa da morte de Raul não foi informada pela Polícia Penal do Paraná. Segundo a defesa, o preso faleceu em decorrência de pneumonia e sepse (infecção generalizada).
Ao UOL, a defesa explicou que desconhece a internação do cliente. Os advogados alegam que estiveram com Raul na quinta-feira (4) na unidade prisional e, posteriormente, se reuniram com o diretor da prisão para falarem sobre a gravidade do estado de saúde do cliente.
Defesa diz que avisou autoridades sobre 'risco iminente de morte'
Em nota ao UOL, os defensores citam que o preso enfrentava problemas de dependência química havia alguns anos. Raul já teria sido internado compulsoriamente e, no dia 16 de março, os advogados dele pediram a liberdade provisória para conseguirem interná-lo em uma clínica particular para tratamento especializado, o que foi negado pela Justiça.
Defesa alega que informou às autoridades que Raul "estava em risco iminente de morte". No pedido de liberdade provisória, os advogados argumentaram que o preso precisava ser transferido "urgentemente" para uma clínica particular.
O MPPR (Ministério Público do Paraná) também foi acionado para pedir urgência na manifestação da promotoria sobre a situação. "O Ministério Público, mais uma vez, mesmo diante da gravidade dos fatos, manifestou-se contrário ao pedido, em uma demonstração clara de insensibilidade." A nota da defesa foi assinada pelos advogados Adriano Bretas, Giovanni Moro, Beno Brandão, Alessi Brandão e Khalil Aquim.
Ministério Público estadual alegou que, após ser informado da gravidade do caso de Raul, analisou o caso "com celeridade". Em nota, o MPPR esclareceu que foi comunicado da gravidade do estado de saúde do réu na tarde de quinta-feira (4). O Ministério Público diz que apresentou requerimento para que o preso fosse imediatamente encaminhado para tratamento médico no Complexo Médico-Penal.
No entanto, hoje, dia 5 de abril de 2024, o pedido da defesa para que o caso fosse corretamente tratado não com prisão, mas, sim, como um caso de doença que necessita de tratamento, perdeu seu efeito. Raul veio a falecer. Os fatos falam por si. Uma pessoa que era acusada de um crime tentado teve, na falta de sensibilidade, a sua sentença de morte.
Defensores de Raul Pelegrin, em nota ao UOL
Relembre o caso
O caso ocorreu no dia 14 de março. Raul Pelegrin, que residia na cobertura do prédio, no 27º andar, cortou a corda que sustentava o trabalhador que limpava a fachada do edifício. A vítima estava a 18 metros do chão e só não caiu do 6º andar devido ao funcionamento de um dispositivo de segurança que impediu a queda. O prédio fica localizado no bairro Água Verde, em Curitiba (PR).
A Polícia Militar foi acionada para a ocorrência e entrou no prédio com autorização do síndico. Os agentes checaram pelas câmeras de segurança que Raul estava dentro do apartamento e precisaram arrombar a porta da residência. No local, encontraram na sacada a faca que o homem utilizou e a corda cortada.
Além de Raul, a funcionária dele também foi presa por mentir para a polícia. Em nota, a Polícia Civil do Paraná explicou que ela teria dito aos agentes que o morador da cobertura não estaria dentro de casa. Ela foi ouvida e liberada em seguida.
Funcionários do condomínio disseram que já sofreram ameaças de Raul. O morador teria dito que iria cortar todas as cordas de todos os funcionários, caso não se retirassem. As informações constam no boletim de ocorrência.
Trabalhador que teve a corda cortada disse estar abalado e sentiu que ia morrer. "A gente não espera que isso possa acontecer. O sentimento é de tristeza. Poderia ter perdido minha vida ali, sem nem saber o motivo", disse Mayk Gustavo Ribeiro da Silva, 27, ao UOL no fim de março.