SP: Empresa suspeita de elo com PCC ganhou gestão de novos ônibus aquáticos
A Transwolff, uma das empresas de ônibus suspeitas de ter ligação com o PCC, era responsável também pela operação dos ônibus elétricos em São Paulo e ganhou o contrato para gerir o "ônibus aquático" na zona sul da cidade.
O que aconteceu
O modal aquático é uma das apostas do prefeito Ricardo Nunes (MDB) para ser marca de sua gestão. O objetivo é que as embarcações diminuam o tempo de deslocamento. Os paulistanos gastam, em média, 1h20 de ônibus para ir do Cantinho do Céu até a região da Pedreira, ambos na zona sul. A previsão é que, pela represa Billings, o tempo seja reduzido para 17 minutos.
Na minuta do contrato, a prefeitura disse que a Transwolff é a "única que atende às condições operacionais estabelecidas" para operar o transporte municipal". A informação foi divulgada no Diário Oficial.
A prefeitura aguarda liberação da Justiça para que o ônibus aquático comece a funcionar. O início das operações foi barrado um dia antes da inauguração oficial, no final de março. O entendimento judicial é que há falhas no licenciamento e que faltam estudos. O "elevado risco de dano ambiental" à represa Billings também foi citado.
Em junho do ano passado, a empresa recebeu autorização da prefeitura para comprar as embarcações. A gestão municipal optou por um aditamento (complemento) no contrato que já tinha com a Transwolff. O acordo não prevê repasse de verba, mas o pagamento pelos "serviços prestados", diz a administração.
O ônibus aquático vai operar na mesma área alvo de licitação vencida pela Transwolff em 2019 para operar ônibus, segundo a SPTrans. "A empresa, portanto, manterá o atendimento a seus passageiros no novo modal e, para isso, contará com a expertise operacional adquirida no atendimento a esse público ao longo do período de atuação na região", diz trecho da nota enviada ao UOL.
Maior frota de ônibus elétricos da cidade
A Transwolff também é responsável pelo maior número de ônibus elétricos em operação na capital paulista. São 78 veículos, bem acima dos 40 operados por outras seis empresas juntas. A meta é que 20% da frota na cidade seja movida a energia limpa até o final deste ano —número distante dos 2,09% registrados em dezembro de 2023, o último dado disponível.
Segundo a prefeitura, todas as empresas do setor de transporte municipal foram chamadas a apresentar um "plano de operação para ônibus movidos a bateria". A Transwolff foi a "única que atendeu os requisitos técnicos exigidos, inclusive, metas previstas pelo município de redução da emissão de poluentes". As demais empresas com frota elétrica passaram a operar depois.
A Transwolff e a UPBus, responsável pela operação de ônibus na zona leste, estão na mira do Ministério Público. Segundo as investigações, elas são "organizações criminosas" que lavam dinheiro do tráfico de drogas e outros crimes. Seis pessoas foram presas na terça-feira (9) em uma operação do MP, e 29 foram denunciadas ontem.
Empresas agora estão sob intervenção
A prefeitura afirmou que "já havia pedido que a Controladoria Geral do Município apurasse o envolvimento dessas empresas com o crime organizado". A decisão judicial que expediu os mandados de busca e apreensão também determinou uma intervenção nas empresas pela gestão Nunes.
Agora, a SPTrans está responsável pelos serviços da Transwolff e da UPBus. O prefeito nomeou dois diretores para cuidar da operação. Prefeitura aguarda fim das investigações.
A gestão municipal disse que só "tomará alguma eventual medida restritiva" ao fim das investigações. Em agenda pública, o prefeito tem reafirmado sua posição. "Não é possível que, por suposição, a gente vá sair rompendo o contrato, porque eu vou tomar uma invertida de multa contratual", afirmou.
Nunes acusou pessoas de agir de má-fé, com "videozinho" dizendo que ele paga milhões às empresas, por falta de conhecimento ou por ser ano eleitoral. A referência do prefeito é aos seus adversários no pleito municipal — os pré-candidatos Guilherme Boulos (PSOL) e Tabata Amaral (PSB) criticaram a postura da prefeitura nesse caso.
Segundo o prefeito, "é muito complicado" se criar "ilações" sobre o tema. Ele disse também que a suposta ligação das empresas com o PCC é citada há anos pelos órgãos de investigação.
O pré-candidato à reeleição visitou as garagens das empresas nos últimos dias, após a intervenção da prefeitura. Em vídeo publicado nas redes sociais, Nunes elogiou o serviço ofertado pela UPBus e a Transwolff. Funcionários da SPTrans, presentes na gravação, também fizeram comentários positivos.
Não dou o dinheiro para a empresa do PCC. Eu remunero um serviço contratado para transportar os passageiros. Houve uma licitação, 32 empresas ganharam, elas estão com um contrato com a prefeitura, transportam as pessoas e me cabe fazer o pagamento. Agora, se ela é ligada ao PCC, se não é, se a pessoa cometeu algum crime, quem tem que investigar é o Ministério Público e a Polícia Civil, apresentar as provas ao judiciário e ser condenada.
Ricardo Nunes, prefeito de São Paulo
Investigações mapearam dinheiro
Entre os presos na operação do MP está Luiz Carlos Efigênio Pacheco, conhecido como "Pandora", dono da Transwolff. Ele atua no setor de transportes desde a década de 1990.
Pacheco foi preso em 2006 suspeito de financiar uma tentativa de fuga de presos ligados ao PCC com dinheiro da Cooper Pan. Trata-se de uma das principais cooperativa de transportes, que deu origem à Transwolff. As informações foram divulgadas pelo colunista do UOL Josmar Jozino em 2022.
De acordo com a Receita Federal, os investigados detêm, juntos, patrimônio de mais de R$ 148 milhões. Eles movimentaram, apenas entre 2020 e 2022, mais de R$ 732 milhões em suas contas correntes.
Operações de compra e venda de imóveis e bens de luxo foram detectadas. Segundo o Fisco, trata-se de uma "rede de holdings", empresas de participação em empresas e revendedoras de veículos de propriedade de pessoas relacionadas aos investigados. Entre os bens que passaram por essas empresas está o helicóptero usado numa emboscada para matar Gegê do Mangue e Paca, duas lideranças do PCC, em 2018.
As empresas atuam nas zonas leste e sul da cidade e transportam cerca de 700 mil passageiros por dia. Juntas, elas receberam mais de R$ 800 milhões de remuneração da Prefeitura de São Paulo em 2023.
Foram R$ 748 milhões para Transwolff e R$ 81,1 milhões para a UPBUs, segundo relatório do Ministério Público de São Paulo, obtido pelo UOL. Segundo o MP, as investigações não apontaram omissão por parte da prefeitura.
Juntas, as empresas receberam mais de R$ 800 milhões de remuneração da Prefeitura de São Paulo em 2023. Foram R$ 748 milhões para a Transwolff e R$ 81,1 milhões para a UPBUs, segundo relatório do Ministério Público de São Paulo, obtido pelo UOL.