RS: Litoral norte lota após fuga por enchentes, e prefeitos pedem recursos
A manicure Janaína Pereira, 46, deixou a casa alagada no município de Canoas, na região metropolitana de Porto Alegre, para se abrigar com os dois filhos e o marido em Imbé, no litoral norte do Rio Grande do Sul. Ela é só uma das quase 300 mil pessoas que fugiram das enchentes em direção às cidades litorâneas.
O que aconteceu
Os municípios foram pegos de surpresa, o que dificulta a preparação para receber tanta gente, diz o presidente da Amlinorte (Associação de Municípios do Litoral Norte), João Bassani. "Trânsito engarrafado, mercados lotados, filas nas farmácias, um 'clima de verão'", destaca Bassani, que também é prefeito de Maquiné, em referência ao período em que a cidade costuma estar lotada.
A maioria dessas pessoas não depende dos serviços públicos da cidade. Porém, só o município de Imbé atendeu, até o dia 16 de maio, cerca de 10 mil pessoas que fugiram das enchentes, segundo levantamento da Amlinorte enviado ao UOL.
Levando em conta que Imbé tem 26.824 moradores, de acordo com o último Censo do IBGE, esse acréscimo nos atendimentos é um desafio, explica o prefeito Ique Vedovato. "Distribuição de donativos, roupas, alimentos, pronto atendimento, mais que dobrou. Nossa cidade acolheu essas pessoas, inclusive pelo nosso voluntariado. Estão aqui abrigados de maneira pulverizada. Sobrecarregou os sistemas de saúde e de assistência social", destacou.
Prefeito de Capão da Canoa, cidade com a maior população do litoral norte (63.594 pessoas), Amauri Magnus diz que as doações e trabalho voluntário foram fundamentais nesse período. Porém, ele estima que essa ajuda deve diminuir no momento em que o desastre completa quase um mês. "A partir de agora, a gente vai sentir no bolso. Vamos ter que organizar a compra de cestas básicas, por exemplo", declarou.
No início do mês, o prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo, pediu para que os moradores deixassem a capital em direção ao litoral. "Eu sugeri que aqueles que têm casa no litoral, que não foi atingido como a capital, que se eles entendessem que pudessem ir pro litoral, ajudaria a esvaziar um pouco a cidade", disse na ocasião.
Prefeitos pedem recursos
Os municípios do litoral norte do RS pedem ajuda dos governos estadual e federal. Das 23 cidades da região, apenas 8 tiveram os decretos de emergência pelas chuvas atendidos. "Estou aguardando posicionamento do governo do estado e federal porque estamos em ano eleitoral, o que restringe os gastos", explica o prefeito de Imbé.
Ique Vedovato também acredita que a arrecadação do município no próximo ano caia, com o atraso no pagamento de impostos, como o IPTU. Além disso, a Famurs (Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul) divulgou um estudo, nesta terça-feira (21), que projeta perdas no ICMS em torno de 25% da arrecadação estadual, o que se refletirá na conta de cada município gaúcho.
O prefeito de Capão da Canoa diz que os recursos públicos ajudariam na contratação de profissionais da saúde, educação e investimento em segurança, por exemplo. "A gente não sabe o que vai acontecer, se vamos ser ajudados ou não, estamos à mercê das autoridades constituídas. Tem que ser feito algum tipo de projeto".
Nova rotina
Enquanto isso, a manicure Janaína Pereira tenta construir uma rotina em Imbé, sem saber como está sua casa em Canoas. "Estamos esperando a água baixar para voltar e avaliar. Foi bem complicado. Em um momento a gente estava bem, quando você vê, não tem mais nada, tem que sair correndo com a roupa do corpo", lamenta.
Ela e a família chegaram à cidade em um caminhão com outras 37 pessoas, entre amigos e familiares. No momento, Janaína divide uma casa com parte dessas pessoas, já que alguns voltaram para Canoas para avaliar o prejuízo. A casa foi cedida por uma amiga do cunhado, que não cobrou pela estadia.
Sobrinha da manicure, Rayama, 31, já morava em Imbé antes das enchentes, e incentivou a ida da família para o município. "Foi horrível [acompanhar as notícias]. Maioria dos meu parentes perdeu tudo, e não pude ajudar pessoalmente".
Calamidade e emergência
O governo do RS divulgou, na semana passada, que 351 cidades deixaram o estado de calamidade pública. A partir de nova análise de danos em cada município, apenas 46 permaneceram no estágio mais alto de atenção.
Das 497 cidades do estado, 320 ainda constam em situação de emergência.
Os decretos facilitam envio de recursos aos municípios. Como mostrou o colunista do UOL Carlos Madeiro, na emergência há um comprometimento parcial da capacidade de resposta do poder público, mas entende-se que recursos do estado e/ou da União podem fazer ele voltar à normalidade. Já na calamidade pública, o funcionamento das instituições fica totalmente comprometido. Isso impõe a necessidade não só de recursos, mas uma ação coordenada das três esferas de atuação do Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil.
O UOL entrou em contato com os governos estadual e federal sobre o pedido dos prefeitos do litoral norte. Se houver resposta, o texto será atualizado.