Responsável por curso de peeling sobre influencer: 'Formação nenhuma'
A farmacêutica Daniele Stuart, que ministra um curso online de aplicação de peeling de fenol que teria sido comprado por Natalia Becker, disse que a influenciadora não tinha "formação alguma" para realizar o procedimento. Um jovem de 27 anos morreu após se submeter ao tratamento estético com Natalia em São Paulo.
O que aconteceu
Farmacêutica argumenta que Natalia não cumpriu o protocolo de fenol ministrado por ela. Em um vídeo publicado na noite desta terça-feira (11), Daniele mostra um print veiculado na imprensa que mostra a vítima, Henrique Chagas, com a pele lesionada. A profissional da saúde acusa a influenciadora, cujo nome real é Natalia Fabiana de Freitas Antônio, de "não seguir corretamente a aplicação" que seria demonstrada no curso. Ela ainda mostra um print — que seria da videoaula — em que a pele da modelo está íntegra e é usado um cotonete para aplicação, em pequena quantidade, do fenol.
Segundo Daniele, Natalia esfoliou a pele do jovem e causou lesões que aumentaram "ainda mais a absorção fenol". "Outra evidência de que a influenciadora não utiliza o meu protocolo é essa foto onde ela retira uma máscara plástica [do rosto de outra cliente] na qual eu desconheço essa formulação e ela fez em uma influencer", acrescentou. Na sequência, a farmacêutica declara que deve ser aplicado um "selante, em forma de creme e macio, para que seja fácil a remoção mecânica do mesmo" após a aplicação do peeling de fenol.
Depois, Daniele compartilhou mensagens para mostrar a "indignação" de seus alunos com o caso. Ela também apontou que "toda a classe estética que se sentiu lesionada pelo ato inconsequente de Natalia Becker, a qual não tinha formação alguma. Sinto muito por nós", finalizou a farmacêutica. Como mostrou o UOL, o curso está indisponível na plataforma.
"Natalia não tinha senso, conhecimento e formação nenhuma para realização de tal procedimento", escreveu Daniele na postagem. A mulher ainda disse que "qualquer profissional habilitado na área da estética sabe que não se faz nada em pele que não esteja íntegra", ao citar as supostas lesões que a influenciadora teria provocado na pele de Henrique. "Deixo aqui a indignação dos meus mais de 3.000 alunos e toda a classe estética que se sentiu lesionada com tal irresponsabilidade", completou.
Defesa de farmacêutica
Defesa de Daniele diz que a plataforma informou que Natalia concluiu o curso online no dia 8 de junho, ou seja, cinco dias após a morte de Henrique. Em entrevista concedida à imprensa nesta terça-feira (11), o advogado da farmacêutica, Jeffrey Chiquini, falou que o curso de seis horas oferecido pela cliente é "conceitual apenas, não é um curso especializante". "Se Natalia tivesse seguido o protocolo ensinado pela doutora, isso não teria acontecido. Todos os procedimentos que aquela senhora aplicou não condizem com o curso fornecido", declarou.
Em uma apresentação, ele mostrou o print que seria da Hotmart, onde as aulas são ministradas, que mostra o nome de Natalia — o documento foi obtido pelo UOL. Apesar de afirmar que seria a "conclusão do curso", a frase que aparece acima da data é de "último acesso da aluna" o que não necessariamente aponta para a finalização do mesmo.
Ainda na coletiva, Daniele argumentou que a imprensa teve acesso somente a uma apostila de 43 páginas do curso. "O curso não se baseia apenas em uma apostila. O curso se baseia nas videoaulas, e nelas eu sou enfática dizendo quais são os pacientes que são propícios e qualificáveis para aceitar o fenol. Não pode ser uma pessoa que tem doenças cardíacas e renais. Durante o curso, eu sou enfática em dizer, na apostila até está escrito, que nós, profissionais habilitados, podemos trabalhar com peeling de fenol", destacou.
Nas videoaulas, se vocês tiverem acesso, vocês vão verificar que eu sou extremamente cuidadosa e extremamente transparente sobre quem pode, ou não, aplicar o fenol.
Daniele Stuart, farmacêutica
O que diz a defesa de Natalia?
Defensora de Natalia ressaltou que o print mostrado por Chiquini mostra o "último acesso e não que ela concluiu neste dia", reforçando que a data da impressão do documento foi em 5 de junho de 2024. Procurada pelo UOL, a advogada Tatiane Fortes, representante da influencer, disse que o colega "não teve o trabalho de ler e interpretar o documento". Fortes também acrescentou, na quarta-feira (12), que Daniele e o defensor dela "promoveram alegações inverídicas e acusações precipitadas" sobre o caso.
Fortes alegou que as informações necessárias estão sendo apresentadas às autoridades competentes. Porém, a defensora da influenciadora reforçou que não procede que o curso de Daniele, como dito pela defesa dela, é "conceitual" e acusa que alguns vídeos do curso foram excluídos da plataforma, o que caracterizaria, de acordo com Fortes, "relevante omissão de informações" em tentativa de não responsabilização da farmacêutica sobre o curso ministrado.
Em restituição da verdade, no curso de Daniele Stuart foi ministrado e informado o tratamento propriamente dito, protocolos, métodos, os produtos a serem utilizados, onde adquiri-los, riscos e intercorrências, não sendo abordado ou sinalizado, em momento algum, risco à saúde ou à vida. Em complemento, se existia alguma vedação, houve relevante omissão de Daniele Stuart.
Tatiane Fortes, representante da influencer
Polícia vai investigar caso; Conselho Regional de Farmácia também apura conduta de Daniele
A Polícia Civil do Paraná informou que vai investigar a farmacêutica Daniele Stuart. A apuração por suspeita da prática de exercício ilegal da medicina ficará sob os cuidados da Decrisa (Delegacia de Repressão aos Crimes Contra a Saúde). A investigação foi aberta após a Polícia Civil de São Paulo encaminhar uma cópia do inquérito sobre a morte de Henrique à corporação paranaense.
CRF-PR (Conselho Regional de Farmácia do Estado do Paraná) irá apurar a conduta de Daniele. Em nota à reportagem, o órgão disse que tem ciência das alegações de Natalia sobre se "qualificar" por meio do curso ministrado pela farmacêutica e abrirá um procedimento administrativo disciplinar contra a profissional.
Conselho regional também confirmou que Daniele é graduada em farmácia e que está com registro ativo no órgão. Eles também explicaram que os farmacêuticos não têm impedimento para, assim como outros profissionais da saúde, ofertar cursos livres. Porém, ressaltaram que esses cursos não são de habilitação profissional, mas, sim, de atualização e que isso deve ser respeitado, principalmente, na área da saúde. "Apenas podem atuar na área da saúde pessoas com formação específica para o respectivo exercício de cada uma de suas profissões", diz o CRF-PR.
É de extrema importância para a instituição e para a sociedade esclarecer os fatos e garantir a integridade e a ética no exercício da profissão farmacêutica. O CRF-PR reforça seu compromisso com a transparência, a ética e a regulamentação adequada da prática farmacêutica, sempre priorizando a segurança e o bem-estar da população.
Conselho Regional de Farmácia do Estado do Paraná ao UOL
Vítima sofreu parada cardiorrespiratória
O empresário de 27 anos morreu enquanto passava por um procedimento estético realizado no dia 3 de junho. Henrique Silva Chagas teve parada cardiorrespiratória durante o procedimento. A clínica fica localizada na rua Doutor Jesuíno Maciel, no Campo Belo, na zona sul de São Paulo.
No Instagram, a conta da influencer tinha mais de 233 mil seguidores. A mulher informava que é "criadora" de um protocolo de tratamento estético e "premiada especialista em melasma". Ela tem uma unidade da clínica em São Paulo e outra no Rio de Janeiro. Conta de Natalia no Instagram ficou indisponível após o caso.
A causa da morte de Henrique Chagas ainda é investigada pela polícia, que aguarda exames toxicológico e anatomopatológico para saber se o uso do fenol provocou, de fato, o óbito do empresário. Na última semana, Natalia Becker foi indiciada por homicídio com dolo eventual, quando não há intenção, mas se assume o risco de matar. Não há mandado de prisão contra ela.
A defesa de Natália diz que aguarda o laudo dos exames que determinarão a causa da morte do empresário.