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Taiwan "celebra a vida" com strippers durante funeral, diz antropólogo americano

Cena do documentário "Dancing For The Dead: Funeral Strippers In Taiwan", de Marc L. Moskowitz - Divulgação
Cena do documentário "Dancing For The Dead: Funeral Strippers In Taiwan", de Marc L. Moskowitz Imagem: Divulgação

Andréia Martins

Do UOL Notícias<br>Em São Paulo

05/08/2011 07h00

Funeral e strippers são palavras que você dificilmente colocaria na mesma frase, imagine então no mesmo cenário. É o que acontece em Taiwan, onde há mais de 20 anos essa mistura se tornou uma das mais peculiares tradições das cidades asiáticas e também uma das mais inusitadas maneiras de dar o último adeus.

A excentricidade do tema aguçou a curiosidade do antropólogo americano Marc L. Moskowitz, professor da Universidade da Califórnia do Sul. Na hora de pensar em um assunto para seu primeiro documentário, “Dancing For The Dead: Funeral Strippers In Taiwan“ (Dançando para os mortos: Strippers de funerais em Taiwan, em tradução livre), ele não pensou duas vezes. Para ele, a tradição é uma "celebração da vida".

"Depois de tudo, percebi que se trata de uma grande celebração da vida e ao longo da filmagem passei a apreciar a ideia de celebrar a vida de alguém em um funeral em vez de chorar a sua passagem", disse Moskowitz, em entrevista ao UOL Notícias

“Se você contar todo o tempo que eu passei em Taiwan, fiquei uns 10 anos por lá. Nunca tinha visto pessoalmente, mas sempre ouvi falar desta tradição. Quando decidi fazer meu primeiro documentário, pensei que este seria um fenômeno que ninguém no Ocidente ainda tinha explorado bem”, conta ele.

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    O antropólogo Marc L. Moskowitz, diretor do documentário sobre strippers em funerais de Taiwan

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    Dançarina em um dos Eletric Flower Cars, trailers que são transformados em palcos para as apresentações

De acordo com a história local, há relatos de que a prática aconteça desde 1800, mas esse costume começou a se tornar popular em 1980, quando as pessoas passaram a contratar os Electric Flower Cars, trailers decorados que se transformam em palcos onde as mulheres cantam e dançam. Hoje, é nesses carros que as strippers chegam aos funerais e se apresentam.

Segundo o antropólogo, o costume tem por objetivo, honrar o morto. Ele conta que nunca assistiu à apresentação de uma stripper nem mesmo nos Estados Unidos, e achou a prática nos funerais bem estranha quando começou o documentário, até perceber que as apresentações não eram apenas de striptease.

Há performances inteiramente sem nudez -- em outras, em estágios mais avançados, as mulheres ficam completamente nuas --, muitas das strippers são cantoras muito talentosas e há também apresentadoras que distraem a plateia contando piadas. O barulho e a exaltação, comuns aos grandes concertos de rock e finais de campeonatos, são um item de composição fundamental para o sucesso dos funerais.

"Nesta fase da globalização, em que ouvimos as mesmas músicas, assistimos aos mesmos filmes e vestimos as mesmas roupas, acho que deveríamos celebrar a diversidade cultural”, diz o professor.

Sobre os motivos pessoais de cada um dos que já contrataram os funerais com strippers, o antropólogo ouviu diferentes explicações, desde que a atração era um agrado aos deuses como a de que quando vivo, o falecido gostava de assistir a shows de strippers.

Público e custos

Apesar da lenda de que tal prática começou com a máfia, a partir do levantamento feito para o documentário, Moskowitz conta que a maioria dos funerais com strippers é feito para homens da classe trabalhadora. Não há restrição quanto a quem possa solicitar tal ‘despedida’.

"Em Taipé há mais investimento na cultura global e, embora a crítica a essa prática seja maior, no norte, os funerais com strippers são mais comuns para homens de boa educação. Já no sul e em áreas rurais do norte, as pessoas estão mais preocupadas com a cultura local e essa prática é bem mais comum. Mas usualmente, as pessoas envolvidas são da classe trabalhadora”, diz o antropólogo.

Com relação aos custos, a cerimônia com duração de 3 horas custa entre US$ 800 e US$ 1.000, "os mais baratos" segundo o antropólogo.

"O preço varia pois depende se é um funeral, um feriado religioso ou um templo que contrata o Electric Flower Cars para apresentações", completa ele.

Em áreas com melhores condições econômicas os preços são outros e variam de empresa para empresa. "Assisti a uma apresentação que incluía apresentadoras e cantoras menores de idade (que não faziam striptease) e acredito que as performances durante a noite sejam bem mais caras", disse Moskowitz.

O documentário também revela que não há  muita competitividade nesse mercado. Hoje há bem menos empresas realizando esses shows do que nos anos 80. Entre os motivos está o preço do diesel. "O meio de transporte hoje é caro de comprar e manter e, por isso, muitas companhias não conseguem mantê-lo. Em alguns locais existe até associações, como é o caso do condado de Taoyuan.

"Shan Ba, um dos entrevistados do filme, é o líder da associação de Taoyuan. Nem todos contratam Electric Flower Cars mas, fora as pessoas que moram na capital  (Taipé), quase todos com quem eu falei já assistiram às performances, seja em casamentos, templos ou nos funerais", disse Moskowitz.

Assista ao trailer do documentário

Restrições

Aos olhos do governo chinês, a tal "celebração da vida" durante os funerais não é bem vista.

“A imprensa chinesa em Taiwan sempre foi muito crítica com relação a essa prática. Então, parte do que eu quis fazer era filmar da perspectiva de quem participa destes shows, embora tenha incluído algumas fontes do governo para explicar porque eles achavam que deveria impor restrições a isso”, conta o antropólogo.

Na China, tal prática não é tolerada e, frequentemente, eles prendem pessoas que participam desse tipo de funeral. Já o governo de Taiwan impõe uma série de restrições.

“Eles já não permitem mais performances com nudez, embora muitas pessoas afirmem que show com nudez total ainda são muito comuns. Você não vê mais esse tipo de apresentações nos centros de grandes cidades por causa de leis de restrição, ao contrário do que acontece, por exemplo, no subúrbio de Taipé“, diz Moskowitz.

Embora tenha entendido tais funerais como uma questão cultural, houve momento de estranhamento.

“Acho que a coisa mais estranha que vi foi quando duas performers pularam na plateia e começaram a dançar em volta dos homens. Isso não é tão raro. Mas não inclui essas cenas no filme porque não queria colocar os rapazes em situações complicadas em casa”, diz o antropólogo.