"Nós vamos bater!", disse copiloto do AF 447 em diálogos finais
O relatório final sobre o acidente com o voo AF 447 da Air France, em 2009, que foi divulgado nesta quinta-feira (5), em Paris, apontou que a tragédia foi causada pela soma de falhas mecânicas, humanas e falta de treinamento adequado da tripulação. O avião caiu no oceano Atlântico em junho de 2009 enquanto fazia o trajeto entre Rio de Janeiro e Paris, matando todos os 228 ocupantes a bordo.
O documento, apresentado pelo Escritório de Investigação de Acidentes Aéreos da França (BEA, na sigla em francês), trouxe na íntegra os últimos diálogos da tripulação, formada pelo comandante de bordo, Marc Dubois (58 anos e 10.988 horas de voo), o copiloto menos experiente, Pierre-Cedric Bonin (32 anos e 2.936 horas de voo), e o copiloto mais experiente, David Robert (37 anos e 6.547 horas de voo).
O registro final é feito entre 0h32min24s e 2h14min28s do dia 1º de junho de 2009. As últimas frases foram ditas por Bonin, que afirmou: “Nós vamos bater! Isso não pode ser verdade...” e em seguida: “Mas o que está acontecendo?”
Veja alguns trechos:
2h11min42s
Dubois – O que vocês estão fazendo?
2h11min43s
Robert – O que está acontecendo? Eu não sei, eu não sei o que está acontecendo
2h11min45s
Bonin – Nós estamos perdendo o controle do avião
2h11min46s
Robert – Nós perdemos todos os controles do avião. Não estamos entendo nada; estamos tentando de tudo
2h11min52s
Dubois - Então pegue o controle, pegue o controle
2h13min19s
Robert – Espere, eu tenho o controle
2h13min25s
Bonin - O que… por que continuamos caindo?
2h13min28s
Robert – Tente achar um jeito de acionar os controles de cima
2h13min38s
Dubois - Cuidado com o leme
2h13min39s
Robert – Suba, suba, suba
2h13min40s
Bonin - Mas eu estou subindo há algum tempo
2h13min42s
Dubois – Não, não, não, não suba
2h13min43s
Robert – Então vá para baixo
2h13min45s
Robert – Me dê os controles, me dê os controles
2h13min46s
Bonin – Vá em frente, você tem o controle
2h14min05s
Dubois – Cuidado, você está subindo
2h14min06s
Robert – Estou subindo?
Dubouis - Você está subindo
2h14min07s
Bonin - Bem, é o que nós devemos fazer. Estamos a 4 mil pés
2h14min18s
Dubois - Então puxa. Agora, tire
Bonin - Puxa, puxa, puxa, puxa
2h14min23
Bonin - Nós vamos bater! Isso não pode ser verdade...
Bonin- Mas o que está acontecendo?
2h14min28s
Fim da gravação
Veja a íntegra da transcrição no site do BEA (em inglês).
Leia mais
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Em julho do ano passado, o relatório do BEA mostrou pela primeira vez a tensão na cabine nos últimos momentos da tragédia, por meio da transcrição das caixas-pretas. As conversas mostravam que a tripulação mal teve tempo de entender o que estava acontecendo.
Os investigadores assinalaram que a tripulação não estava preparada tecnicamente para enfrentar uma situação desse tipo em grande altitude e que os pilotos não tinham recebido treinamento em caso de perda de sustentação do Airbus e falta de informações confiáveis de velocidade.
Entenda
Os problemas no avião começaram poucos minutos depois de o principal piloto começar o seu descanso regulamentar. Segundo o BEA, o comandante foi descansar sem deixar "claras recomendações" aos dois copilotos que ficaram no controle.
Os documentos mostraram que os pilotos levaram o Airbus para uma região de tempestades --apesar dos copilotos terem feito um desvio de 12º na rota-- e a baixa temperatura acabou por congelar os sensores de velocidade --o que foi considerada a primeira falha mecânica apresentada pelo Airbus.
A incoerência nas informações de velocidade provocou o desativamento do piloto automático. Segundo os documentos, o copiloto mais jovem iniciou uma manobra equivocada --elevando o bico da aeronave. De volta à cabine, o piloto não conseguiu reverter a situação. Nenhum deles --comandante e dois copilotos--, segundo o BEA, identificou formalmente a situação de perda de sustentação e tomou atitudes para revertê-la.
A decisão do copiloto de elevar o bico para ganhar altitude, após o início da pane, não corresponde aos procedimentos normalmente seguidos nesse caso –especialistas apontam que o correto seria abaixar o nariz da aeronave para que ela recuperasse a velocidade e retomasse a sua sustentação.
Porém, tanto especialistas quanto o BEA indicam que informações contraditórias fornecidas pela aeronave podem ter confundido os pilotos. Durante a coletiva de imprensa, os investigadores reconheceram que algumas ações dos pilotos foram motivadas por dados errôneos nos equipamentos. É o que ocorreu com o diretor de voo, que fornece a posição da aeronave para que o piloto siga determinados parâmetros. Em algumas situações, o instrumento orientou os pilotos a continuarem subindo no momento em que o avião perdia a velocidade. Nesse caso, a orientação deveria ter sido o contrário.
A aeronave caiu durante três minutos e trinta segundos antes de tocar a superfície do oceano, de barriga, a uma velocidade final de 200 km/h --segundo indicado em um dos documentos preliminares.
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