Pague R$ 14 mil para gritar e quebrar tudo: o que são os 'rituais de raiva'
Colaboração para o UOL*
28/05/2024 04h00
Um tipo de "ritual de bem-estar" tem chamado a atenção nas redes sociais. Apelidado por especialistas de "rituais de raiva", a nova tendência cobra para levar pessoas a uma floresta, onde podem gritar e quebrar coisas.
Conheça os 'rituais de raiva'
Os chamados "rage rituals" ("rituais de raiva", na tradução livre) viralizaram nas redes sociais. Vídeos compartilhados no TikTok mostram mulheres no meio da floresta gritando e usando pedaços de madeira para atingir o chão.
Nesse tipo de ritual, os participantes são incentivados a pensar em experiências ruins e pessoas que já os prejudicaram para colocar o sentimento para fora. Depois de algumas respirações, os gritos primitivos e os movimentos agressivos começam.
Cerimônias como essa costumam ser realizadas em locais afastados, geralmente em florestas, para que os participantes possam fazer barulho sem medo de incomodar pessoas próximas.
O mais famoso desses "rituais de raiva" é promovido por Mia Banducci, autora e autodenominada "Fada Madrinha Espiritual", mais conhecida online como Mia Magik.
Banducci acumula 130 mil seguidores no seu Instagram, onde também compartilha vídeos dos rituais. Segundo o jornal USA Today, ela lidera esse tipo de cerimônia há anos e começou a praticá-los primeiro para si mesma.
Seus retiros de dias de duração, que incluem outras atividades além dos "rituais de raiva", podem variar entre US$ 2 mil e US$ 4 mil (R$ 7.345 e R$ 14.692). Ainda de acordo com a publicação norte-americana, a versão de um dia do ritual custa US$ 222 (R$ 815) por ingresso.
"Quando as pessoas fazem isso e se permitem liberar sua raiva, sua capacidade de alegria realmente se expande", disse Banducci ao USA Today. "Elas conseguem sentir mais felicidade e prazer e voltam para casa, para suas famílias, com mais gratidão, tranquilidade e paz", continuou.
Banducci, no entanto, não é a única pessoa que lidera eventos que prometem tratar a raiva. Segundo o The Independent, o grupo de bem-estar Secret Sanctuary está planejando uma "Cerimônia de Fúria Sagrada" em Alberta, Canadá, em julho. Já a autora e mística Jessica Ricchetti também está organizando um retiro "Fúria Secreta" para mulheres na Carolina do Norte, EUA, em junho.
De acordo com reportagem de 2020 do The Guardian, entre o número crescente de cursos e encontros que incentiva as pessoas a expressarem fúria está um chamado Dancing Eros, com sede em Melbourne, Austrália. O grupo encoraja pessoas a "se conectar com seus sentidos e permitir que as emoções aumentem e diminuam lentamente", mas afirma que estes não são acessos de raiva frenéticos — o que você expressa deve parecer saudável, não prejudicial.
Prática busca oferecer uma sensação de autoconexão e expressão de forma livre. Ainda assim, segundo a publicação britânica, especialistas observam que os "rituais de raiva" provavelmente não funcionarão para todos — e não substituem a terapia feita com psicólogos, por exemplo.
Apesar de dividir opiniões, esse tipo de ritual repercute especialmente entre mulheres. Nas redes sociais, é possível encontrar comentários sobre como é um alívio canalizar a raiva — especialmente em uma sociedade que desaprova as mulheres que abraçam as suas emoções.
Método é antigo -- e já foi adotado por famosos
Apesar de ter viralizado recentemente, prática é antiga. A terapia primal, que é uma das características dos "rituais de raiva", foi desenvolvida na década de 1970 pelo psicólogo Arthur Janov.
Pensada para liberar traumas reprimidos, a técnica foi adotada por celebridades como John Lennon, Yoko Ono, Kanye West e Steve Jobs. Todos gritaram a plenos pulmões para liberarem emoções negativas. Mas, apesar do sucesso entre os famosos, a terapia primal não chegou aos "meros mortais", talvez pela falta de evidências de que funciona.
Gritar realmente libera substâncias que aliviam o estresse, mas em excesso isso pode ser ruim. Se o recurso for empregado a todo instante, seu efeito será oposto. O excesso de neurotransmissores pode causar mais estresse, transtornos de ansiedade e depressão.
É importante lembrar também que o grito em si não é exatamente uma terapia, mas o alívio que algumas pessoas sentem ao berrar pode ser útil se unido a um programa de terapia mais amplo com um psicólogo.
*Com reportagem publicada em 18/02/2022