'Forçar negociação': como ataque da Ucrânia à Rússia muda rumo da guerra
Em conflito contra a Rússia desde 2022, forças ucranianas realizaram no início de agosto a maior invasão em território russo. Embora ainda esteja em desvantagem na conquista e na retomada de territórios, a Ucrânia pode ter alterado os rumos da guerra com o ataque a Kursk que, de acordo com especialistas, foi a maior incursão externa na Rússia desde a Segunda Guerra Mundial.
O que aconteceu
No último dia 6, forças armadas da Ucrânia realizaram um ataque sem precedentes à região russa de Kursk. Milhares de soldados cruzaram a fronteira ocidental da Rússia com o auxílio de drones, artilharia pesada e tanques. Depois de meses de retrocesso contra soldados russos, a ofensiva foi o maior ataque ucraniano desde o início do conflito, em fevereiro de 2022.
Com a invasão, a Ucrânia teria reivindicado o controle de mais de 80 cidades na região, totalizando cerca de 1.150 km² ocupados. Isso limitou o abastecimento de suprimento de um grupo russo instalado na região, com a destruição de pontes utilizadas pelo grupo.
O planejamento e o sucesso da incursão surpreenderam líderes russos e e aliados ocidentais, como os Estados Unidos. De acordo com a rede britânica BBC, nenhum detalhe do ataque foi vazado, e o governo dos EUA garante que não recebeu nenhum aviso prévio sobre o ataque. Karine Jean-Pierre, porta-voz da Casa Branca, afirmou que os Estados Unidos não têm relação ou responsabilidade na invasão.
Ofensiva teria a intenção de forçar governo russo a iniciar negociações "justas". Mikhailo Podolyak, conselheiro do presidente ucraniano Volodimir Zelensky, declarou que a Ucrânia não tem a intenção de ocupar indefinidamente parte do território russo e destacou que, em caso de eventuais negociações, seria necessário encontrar uma forma de fazer a Rússia sentar "do outro lado da mesa".
No entanto, autoridades russas indicam que ataque realizado inviabiliza negociações. "No momento, seria completamente inapropriado iniciar um processo de negociação", declarou Yuri Ushakov, conselheiro diplomático do presidente Vladimir Putin, ao Shot, canal russo no Telegram. Ushakov garantiu que a Rússia "não falará" com a Ucrânia devido ao ataque surpresa. Os avanços russos não cessaram após o ataque, com soldados seguindo em ofensivas para ocupar territórios inimigos.
Apesar da ofensiva ucraniana, a Rússia ainda está à frente no que diz respeito a territórios ocupados: desde o início do conflito, o país ocupou 65.891 km² de território ucraniano. Com a Crimeia anexada em 2014 e as áreas orientais já sob controle russo antes da guerra atual, 108.070 km² são ocupados pela Rússia, o que representa 18% da Ucrânia de acordo com suas fronteiras internacionalmente reconhecidas. Desde o início desse ano, a Rússia avançou 1.360 km² em território ucraniano, e as contraofensivas da Ucrânia no seu próprio território durante o mesmo período representaram apenas 20 km².
O impacto político do ataque
Análises internacionais consideram o ataque ucraniano como um "constrangimento" para Putin, já que revela uma eventual fraqueza de sua defesa nas fronteiras. A facilidade com que a Ucrânia conseguiu deflagar o ataque chamou a atenção da comunidade internacional e colocou os serviços de inteligência russos em alerta.
Desde o início do conflito, Zelensky já contou com centenas de bilhões de dólares enviados por EUA e países da Europa. O apoio ocidental tem como objetivo deter e até mesmo reverter o avanço russo. Ao comentar o ataque à Kursk, Putin declarou que as forças ucranianas tinham realizado a incursão recente "com ajuda de seus mestres ocidentais". Segundo especialistas da BBC, Putin teria a intenção de retratar o conflito como uma guerra entre a Rússia e o Ocidente.
O Ministério das Relações Exteriores da Rússia afirmou que a Ucrânia usou foguetes ocidentais, provavelmente fabricados nos EUA, no ataque à Kursk. Os tanques utilizados no ataque também seriam de fabricação norte-americana. O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, estaria fortalecendo o poderio militar da Ucrânia ao mesmo tempo em que tenta não escalar ainda mais a tensão entre os EUA e Putin, prevenindo eventuais hostilidades do governo russo e mantendo claros os limites nos quais armas norte-americanas podem ser utilizadas pelas forças de Zelensky.
Uso de armas ocidentais para ataques contra a Rússia é pedido ucraniano. Rustem Umerov, ministro da Defesa da Ucrânia, fez um apelo para que o governo francês suspendesse a proibição de ataques com armas ocidentais contra alvos militares na Rússia. Já o presidente Zelensky afirmou que o Ministério da Defesa e os diplomatas haviam recebido ordens para apresentar uma lista de "ações necessárias" para garantir permissão, da parte dos aliados ocidentais, para o uso de armas de longo alcance para ataques contra a Rússia.
Newsletter
DE OLHO NO MUNDO
Os principais acontecimentos internacionais e uma curadoria do melhor da imprensa mundial, de segunda a sexta no seu email.
Quero receberAs consequências do ataque surpresa da Ucrânia seguem sendo observadas pelos aliados. A eventual devolução de territórios ucranianos tomados pela Rússia e a negociação pela paz na região e o fim do conflito e o recuo russo são as principais apostas de Zelensky, enquanto todo o mundo aguarda, apreensivo, uma resposta militar elaborada por Putin.
Eleições nos EUA podem alterar rumo da guerra. Tanto Zelensky quanto Putin têm expectativas em relação às eleições presidenciais dos Estados Unidos, que acontecerão em novembro. Até a votação, o presidente ucraniano planeja elaborar um plano que serviria como base para uma futura reunião de cúpula da paz, que também teria participação da Rússia. Caso o candidato republicano Donald Trump vença as eleições, Zelensky teme que o apoio norte-americano seja abalado ou até mesmo encerrado.
*Com informações da Reuters e AFP
Deixe seu comentário
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia as Regras de Uso do UOL.