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Referência para Trump, 'Dr. Cloroquina' é proibido de exercer medicina

Didier Raoult foi apelidado de 'dr. cloroquina' por defender o medicamento no tratamento contra a covid Imagem: Christophe Simon/AFP

Do UOL, em São Paulo

03/10/2024 12h23

O médico e microbiologista francês Didier Raoult, principal defensor do uso de hidroxicloroquina no tratamento da covid-19, foi proibido de exercer a medicina por dois anos. Raoult foi coautor de um estudo questionado por cientistas, mas endossado pelo ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump durante a pandemia.

O que aconteceu

Médico é acusado de violar código de saúde pública. Raoult incentivou o uso de cloroquina contra a covid-19, embora o medicamento seja comprovadamente ineficaz. Como diretor do instituto Méditerranée Infection (IHU), foi responsável por um contestado estudo de 2020 feito com apenas 42 pacientes, sem a aprovação das autoridades de saúde, nem "rigor científico".

Punição começará a valer em 1º de fevereiro de 2025. A decisão tomada pelo Conselho Nacional da Ordem dos Médicos (CNOM) da França foi revelada nesta quinta-feira (3) pelo jornal Le Parisien e confirmada pela agência AFP.

Raoult 'ultrapassou os limites da liberdade de expressão'. O CNOM entendeu que o médico também deve ser punido pela "falta de respeito" com colegas de profissão, citando as ocasiões em que ele comparou seus "resultados" aos dos hospitais de Paris, onde "contavam-se os mortos", e afirmou — sem provas — que outro profissional havia feito testes nos quais crianças morreram.

Postura também afetou o controle e o combate à doença. Além de defender a cloroquina, Raoult fazia críticas à vacinação generalizada e às políticas de confinamento (lockdown), o que, na visão do CNOM, "prejudicou as medidas tomadas pelas autoridades sanitárias com o objetivo de proteger a saúde pública".

Médico já havia recebido uma advertência em 2021. Na ocasião, a Câmara Disciplinar Nacional reconheceu que Raoult "não se baseou em dados [científicos] confirmados", mas entendeu que ele não expôs seus pacientes ao risco, uma vez que a prescrição da cloroquina respeitava as doses normalmente recomendadas. O CNOM, porém, considerou a punição muito leve e recorreu.

Defesa de Raoult ainda não se posicionou sobre o caso. Questionado pela AFP, o advogado Fabrice Di Vizio disse que "não havia tido a oportunidade" de ler a decisão do CNOM.

'Dr. Cloroquina' virou livro

Biografia 'Raoult, uma loucura francesa' foi publicada em 2021. O livro, de autoria das jornalistas Ariane Chemin e Marie-France Etchegoin, descreve o médico como uma mistura entre Indiana Jones e um especialista agarrado a um microscópio, que acabou se tornando um ídolo antissistema antes de virar uma "vítima de seu próprio ego".

Considerado 'superdotado', médico era uma referência na área. Como microbiologista, Raoult multiplicou descobertas, ganhou prêmios e até erradicou epidemias, como contou a revista francesa L'Obs. Em 1997, por exemplo, ele conseguiu controlar em apenas três meses um surto de tifo que dizimava a população do Burundi, na época em plena guerra civil.

Raoult subestimou a covid e viu a cloroquina como 'poção mágica'. O médico chegou a dizer que a covid-19 seria a infecção mais fácil de ser tratada na história. Mas um grande estudo britânico confirmou que a cloroquina não funcionava, levando a França e boa parte do mundo a abolir o tratamento ainda em 2020. "A 'Raoultmania' virou coisa do passado", resume a L'Obs.

Apoio de Trump a estudo contestado de Raoult incentivou Bolsonaro. A partir das falas de Trump, o remédio passou a ser publicamente promovido pelo então presidente Jair Bolsonaro e chegou a ser incorporado no criticado "tratamento precoce". Alguns médicos receitavam a cloroquina como forma de "prevenção" à covid-19, mesmo sem comprovação científica.

Assim como Trump, Bolsonaro também defendeu o uso da cloroquina no tratamento contra a covid-19 Imagem: Adriano Machado/Reuters

(Com AFP e RFI)

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