Brasileiros vivem caos em Los Angeles: 'Fogo se espalhou, está assustador'

O incêndio em Los Angeles, nos Estados Unidos, já deixou mais de 10 mortos e 130 mil pessoas desabrigadas. Com os fortes ventos, a cidade ainda não consegue prever quando conseguirá controlar as chamas. Brasileiros na região narram caos e medo.

'Precisei sair antes de o fogo começar'

Anna Clara fotografou o céu de Los Angeles em meio a chamas
Anna Clara fotografou o céu de Los Angeles em meio a chamas Imagem: Acervo pessoal

Anna Clara Moreira, 27, é babá, mora na região de Topanga, em Los Angeles, e recebeu o aviso de que precisava deixar sua casa, que divide com outros brasileiros, na segunda-feira (6).

"Saímos antes de o incêndio começar. Moro na área afetada, próximo a Malibu", disse ao UOL.

Após conversar com a reportagem, ela precisou trocar de localização novamente. Conseguiu empacotar tudo o que tinha e está na casa de uma amiga.

@banannaclara

Evacuando por causa do incêndio em Los Angeles

? original sound - Anna Clara

Na cidade há um ano e três meses, ela já tinha enfrentado o fogo, mas nunca nessas proporções.

Está caótico. Temos um aplicativo que fica apitando o dia todo mandando a gente sair, mostrando as áreas de risco. O fogo se espalhou bastante, está bem assustador. Tem muita fumaça e um cheiro forte de produto químico no ar.
Anna Clara Moreira

Essa não é a primeira vez que a babá deixa sua casa. "Toda vez que ventos muito fortes começam a soprar, a gente recebe o aviso. Estamos até acostumados e fazemos isso com frequência", explica. Mas nunca nada sério aconteceu.

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"Nessas horas, a gente pega o que é importante, nossa documentação e ficamos acompanhando se o fogo está chegando ou não. Dá bastante medo. O fogo chegou perto de alguns amigos, outros conhecidos tiveram a casa complemente queimada", diz Moreira.

'Achei que estava acostumada, mas me surpreendi'

Bianca Leismann, 21, vive há três anos na região de Hollywood. A estudante de artes cênicas já tinha visto incêndios perto de sua faculdade, mas nunca tinha sido atingida na própria casa.

Na noite de quarta (8), ela foi surpreendida por dezenas de mensagens das autoridades mandando que ela saísse da região, ameaçada pelas chamas.

Foi o terceiro incêndio que estourou, em Holywood Hills. Foi do meu lado das montanhas. O de Palisades já foi algo que me deixou em choque, porque é uma área que eu adorava, uma das mais bonitas da cidade. Foi devastador saber que estava queimando por lá. E depois estourou em Altadena, que é na área da minha faculdade. Bianca Leismann

Natural de Porto Velho, Bianca diz que achou que estava "acostumada" com as épocas de queimadas, comuns em sua região. Mas o que ela vive em LA é totalmente diferente.

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Foi muito perto de casa, isso me deixou transtornada. Aqui em LA tem essa época de queimada, que em Porto Velho a gente tem também, mas lá nunca cheguei a estar perto disso, o máximo era a qualidade péssima do ar.
Bianca Leismann

Ao receber o alerta de fuga, Bianca não tinha nenhuma mala pronta para fugir —um hábito cultivado por alguns locais.

Mas, apesar do desespero, ela ainda teve algum tempo para juntar os itens mais importantes da sua casa. A estudante está abrigada na casa de amigos, a 35 km de onde vive.

Tive a sorte e o privilégio de ter tempo de arrumar as minhas coisas para sair. Trouxe roupas, documentos, coisas de higiene pessoal, alguns bens de valor e comidas. Eu e a minha colega de quarto acabamos descendo para outra cidade, mas até daqui a gente consegue ver a fumaça, de tão alta que é, e a qualidade do ar também não está melhor aqui.
Bianca Leismann

A rondoniense diz que, apesar da tristeza e preocupação, o clima de solidariedade está presente entre os moradores da cidade, com abrigos e restaurantes distribuindo refeições de graça.

A maior dificuldade, no momento, é manter o estoque de água "vivo", já que os bombeiros estão usando todos os recursos do sistema municipal.

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"Eu nunca tinha passado por nada do tipo, um estresse, um nível de adrenalina de sobrevivência tão grande. Mas a cidade é bem grande. Eu diria que a primeira coisa que a gente pensa é que ela está acabando, mas não: em outras áreas tudo está funcionando normalmente. A única coisa é que tem muito mercado sem estoque de água."

'Perdi tudo no fogo em 2018'

A jornalista Luiza Florence Black perdeu sua casa para um incêndio em LA em 2018
A jornalista Luiza Florence Black perdeu sua casa para um incêndio em LA em 2018 Imagem: Reprodução/Instagram

A jornalista Luiza Florence Black, 42, sabe bem o que é perder tudo para o fogo.

Em 2018, sua casa, em Malibu, foi destruída pelas chamas, em um incêndio que matou mais de 44 pessoas. Na época, ela abandonou o local apenas com a filha de oito meses no colo, os cachorros, alguns documentos e uma troca de roupas.

Seu marido estava fora da cidade.

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É difícil entender a proporção do que está acontecendo agora. Só sabe quem já passou. Como já perdi uma casa uma vez, cenas como essa reacendem um trauma. Já sabemos o que fazer, temos um plano de fuga, mas mesmo assim é muito complicado.
Luiza Florence Black

Quando a reportagem entrou em contato com Black, sua casa estava distante da área principal das chamas, cerca de 16 quilômetros, mas já não tinha energia.

"Com a força desse vento, nada é longe. Dizem que ele está atingindo 160 km/h. Por isso é difícil combater os incêndios."

A falta de luz é uma medida de prevenção da companhia elétrica. Como muito do fogo começa devido a faíscas, eles desligam tudo. "Tenho de realocar toda a comida da geladeira para não perder", explica.

Mesmo após o trauma de perder sua casa há sete anos, a jornalista diz que não teve vontade de abandonar a cidade. "Estou sentindo isso só agora. Mas é muito difícil largar nossa casa, sonhos e a vida que construímos aqui."

Anos para a reconstrução

Black conta que, em 2018, quando sua casa pegou fogo, tudo aconteceu muito rápido.

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"Minha casa estava distante, mas o vento mudou e em duas horas atravessou uma rodovia e chegou até lá." Com o marido viajando, ela pegou apenas o essencial e saiu do local.

Destroços da casa da Luiza que pegou fogo em 2018
Destroços da casa da Luiza que pegou fogo em 2018 Imagem: Reprodução/Instagram

Além do trauma, a burocracia para reconstruir é muito grande. "É preciso listar todos os itens que existiam lá dentro para conseguir algum retorno do seguro. Além disso, tínhamos de pagar aluguel, mas não podíamos parar de pagar o financiamento da casa, mesmo após a perda", explica.

Como na época o fogo começou devido a um problema elétrico, ela e outras famílias entraram com uma ação coletiva contra a companhia de luz. Foram anos até conseguir alguma compensação financeira.

"O dinheiro do seguro e do processo não passa nem perto do valor que você perdeu. Sem contar o trauma", explica. Hoje em dia, ela já deixa os itens importantes em caixinhas separadas e sabe que precisa apenas pegá-las caso o fogo se aproxime mais.

Após a experiência, ela e o marido escreveram um "guia de sobrevivência" para famílias afetadas pelo fogo.

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"Não sou apegada, guardo apenas itens emocionais. Minhas fotos de infância e do meu marido se perderam. Tentamos preservar as coisas das nossas filhas."

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