Lula conversa com Macron sobre Meta e busca aliança internacional
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tratou com o presidente da França, Emmanuel Macron, da guinada à direita de Mark Zuckerberg em uma conversa telefônica nesta sexta-feira (10). Dentro do governo, uma das ideias é de que o debate sobre como democracias devem agir diante das plataformas digitais tenha um componente internacional e a construção de alianças.
Nesta semana, a Meta indicou que iria seguir o modelo da plataforma X, de Elon Musk, e desmontar parte de seu trabalho de moderação e verificação de informações. O gesto foi considerado como um alinhamento da companhia que controla Facebook e Instagram às políticas de Donald Trump.
Em um comunicado, o Palácio do Planalto explicou que a conversa entre Lula e Macron durou cerca de 30 minutos.
"O presidente Lula elogiou as manifestações do governo francês sobre a recente decisão da Meta de reduzir a checagem de fatos de suas publicações", disse.
"Eles concordaram que liberdade de expressão não significa liberdade de espalhar mentiras, preconceitos e ofensas. Ambos consideraram positivo que Brasil e Europa sigam trabalhando juntos para impedir que a disseminação de fake news coloque em risco a soberania dos países, a democracia e os direitos fundamentais de seus cidadãos", indicou o Palácio.
Lewandowski em Paris para tratar de desinformação
Também nesta sexta-feira, o tema da desinformação esteve na pauta da viagem do ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, em Paris. Ele se reuniu com o ministro da Justiça francês, Gérald Darmanin. "A principal pauta do encontro foi a união de esforços para o combate à desinformação (fake news). O embaixador do Brasil em Paris, Ricardo Neiva Tavares, também participou do encontro", indicou o Palácio do Planalto, em nota.
"Os representantes de ambos os países manifestaram preocupação com a ameaça representada pela utilização de novas tecnologias, sobretudo no ambiente digital, para práticas ilícitas e ações que promovem a disseminação de notícias falsas durante processos eleitorais e crises sanitárias, como ocorreu na pandemia da covid-19", disse a nota.
"Em nome de duas grandes democracias do mundo, comprometidas com as liberdades fundamentais, as autoridades coincidiram quanto ao interesse de promover estratégias conjuntas e trocar experiências na defesa do Estado Democrático de Direito, diante dos desafios na atualidade mundial", afirmou.
Do lado europeu, o interesse pelo tema ganhou uma nova dimensão depois que Elon Musk decidiu emprestar sua plataforma para promover o partido Alternativa para Alemanha, de extrema direita. Numa conversa com a líder do movimento, nesta semana, Adolf Hitler foi apresentado como um "comunista".
Dias antes, Macron denunciou a parcialidade do proprietário da rede social X e o acusou de apoiar "uma nova internacional reacionária" e de interferir nas eleições, especialmente na Alemanha.
"Há dez anos, se alguém tivesse nos dito que o proprietário de uma das maiores redes sociais do mundo apoiaria uma nova internacional reacionária e interferiria diretamente nas eleições, inclusive na Alemanha? Quem teria imaginado isso?", afirmou Macron durante um discurso para embaixadores franceses.
Musk rebateu, alertando que foram os europeus quem tentaram uma ingerência indevida nas eleições americanas, ao apoiar Kamala Harris.
Brasil buscou colocar plataformas digitais na agenda do G20
Ainda na presidência do G20, o Brasil tentou fazer avançar a ideia de uma regulação das redes sociais. Mas sofreu a resistência do governo de Joe Biden.
Ao assumir a presidência do bloco, em 2024, o Brasil fez questão de colocar o tema na agenda de debates. Ainda que avanços tenham sido obtidos e que, pela primeira vez, o grupo tenha passado todo um ano debatendo a situação das plataformas, os americanos insistem que eles não teriam como se comprometer com uma postura mais dura do G20 em relação a uma regulação.
Ainda assim, durante o ano, o governo brasileiro comemorou a aprovação de uma declaração ministerial no G20 que citava de forma mais enfática a possibilidade de a regulamentação fosse um dos caminhos usados para garantir a integridade de informação. Para os negociadores, o texto é suficiente para permitir que tema possa seguir sendo debatido em fóruns internacionais.
Durante as negociações, o Brasil apontou como a ameaça à integridade da informação passou a ser considerada pela ONU como um tema estratégico, com o potencial de causar a desestabilização de sociedades e regimes.
Desde que Lula assumiu a Presidência, o governo passou a refletir como como desinformação pode ser combatida. A opção foi por buscar dois caminhos. O primeiro é a resposta nacional, com projetos de leis que acabaram gerando uma intensa reação das plataformas digitais.
Mas a percepção do Palácio do Planalto é que não existirá uma solução nacional e isolada para o desafio. A constatação é que redes operam de forma internacional e que era preciso pautar o tema no G20.
Dois argumentos foram usados pelo governo brasileiro para convencer aos demais membros do G20 de que o tema não poderia ficar de fora da pauta:
Se atual situação continuar, o resultado será o extremismo violento que desestabilizará a politica e a economia. Essa abordagem dialoga com a própria origem do G20 e organiza preocupações de países com diferentes perfis políticos.
A solução não virá das big techs, ou seja, dos grandes conglomerados do setor privado que hoje controlam a internet. Nesse aspecto, a esperança do Brasil era a de convencer a todos de que se trata de um desafio para as soberanias nacionais.
Mas o grande desafio, segundo diplomatas, será a chegada de Donald Trump ao poder, a partir de 20 de janeiro. O novo governo americano tem Elon Musk entre seus principais membros. O dono da plataforma X já demonstrou sua influência ao ter sido um dos convidados para ajudar a montar o gabinete do republicano, participou de reuniões com chefes de estado estrangeiros e foi nomeado para liderar um departamento na nova administração.
Musk vem liderando uma campanha contra qualquer tipo de regulação de plataformas digitais, insistindo que uma ação de governos neste sentido seria uma ameaça à liberdade de expressão. No Brasil, as ações do STF contra suas redes se transformaram em uma ofensiva por parte do bilionário, convocando seus seguidores contra as instituições brasileiras.
Ofensiva e chantagem
Musk ainda contará com um amplo apoio dentro do governo Trump. O senador Marco Rubio, escolhido para ser o novo chefe da diplomacia americana, foi um dos que atacou o STF por suspender o X, há poucas semanas.
Outro indício claro da força que Musk terá foi dado em novembro, quando parlamentares brasileiros e republicanos americanos ampliaram a campanha contra o Brasil em órgãos internacionais.
Aliados de Donald Trump no Congresso dos EUA enviaram uma carta para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, ameaçando cortar recursos e colocando pressão sobre a instituição para que atue contra o Brasil. A alegação é de que a democracia estaria em risco no país diante da suspensão da plataforma de Elon Musk, o X.
Vista como chantagem e num sinal do que poderá ser o governo Trump, a ação é ainda um ataque à autonomia e independência da Comissão Interamericana. O temor é de que, com o Departamento de Estado nas mãos de Marco Rubio, senador com um histórico de ataques contra a esquerda latino-americana, as ameaças sejam concretizadas contra o órgão regional.
Os deputados republicanos assumiram o discurso bolsonarista sobre a suposta existência de uma censura e repressão no Brasil, narrativa adotada pelos aliados do ex-presidente e que buscam, nos EUA, respaldo para algum tipo de anistia e a garantia de que possam usar as redes sociais para difundir desinformação e ataques contra o sistema eleitoral.
O que os congressistas alertam é que, sem atuar contra o Brasil, o órgão internacional poderia enfrentar cortes de recursos. A partir de 2025, Trump terá o controle do Senado e da Câmara dos Deputados nos EUA, com poder para abalar o orçamento e o destino de recursos para entidades.
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