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Após legalização, indústria da maconha tenta sair das sombras na Califórnia

Pacote com produtos de maconha medicinal em dispensório da erva em Nova York, com um vaporizador, um conta-gotas e um spray oral - Brett Carlsen/The New York Times
Pacote com produtos de maconha medicinal em dispensório da erva em Nova York, com um vaporizador, um conta-gotas e um spray oral Imagem: Brett Carlsen/The New York Times

Thomas Fuller

Santa Rosa, Califórnia (EUA)

27/11/2016 06h00

A indústria da maconha na Califórnia, que movimenta bilhões de dólares e é de longe a maior dos EUA, está saindo das sombras depois que os eleitores optaram por legalizar a Cannabis na eleição deste mês. Só no condado (município) de Sonoma, cerca de 9.000 empresas de cultivo de maconha operam em um mercado obscuro, com poucos regulamentos específicos, e agora procuram seguir o caminho da indústria de vinhos, que saiu da proibição há 80 anos e ascendeu à proeminência global de que goza hoje.

Mas os duros problemas de uma das maiores empresas de canabis do Estado, a CannaCraft, deixaram muitos no setor temerosos, e também sugerem um longo e acidentado caminho a percorrer desde a aprovação da erva nas urnas até a aceitação desfrutada pelas indústrias de vinho e cerveja.

A CannaCraft produz artigos de Cannabis medicinal, que são legais no Estado há 20 anos, mas operava em um mercado desregulamentado, que lembrava o Velho Oeste. Em junho, a recém-inaugurada sede da companhia foi invadida por policiais federais e locais que disseram que o processo usado ali para fabricar derivados de maconha era perigoso e ilegal.

Os agentes apreenderam US$ 5 milhões em equipamentos, estoque e dinheiro. Neste ano, motoristas da empresa foram parados duas vezes pela patrulha rodoviária da Califórnia e em um caso foram apreendidos 725 kg de maconha.

Os problemas do setor podem ser um sinal do que virá após a legalização mais ampla da droga, enquanto empresas de Cannabis medicinal como a CannaCraft continuam sendo prejudicadas pela falta de regulamentação clara do Estado e a visível contradição entre uma proibição federal à maconha e leis estaduais em evolução que teoricamente deveriam proteger as empresas de processos legais. As empresas de maconha lidam quase exclusivamente com dinheiro porque os bancos, temendo consequências federais, não aceitam seus negócios.

Maconha 1 - Amy Beth Bennett/South Florida Sun-Sentinel/AP - Amy Beth Bennett/South Florida Sun-Sentinel/AP
Manifestantes portam cartazes em apoio ao uso medicinal da maconha na Flórida (EUA), que acabou aprovado pela população em referendo de novembro
Imagem: Amy Beth Bennett/South Florida Sun-Sentinel/AP

"Eles estão pedindo que as pessoas se assumam, mas há desconfiança", disse Dennis Hunter, 43, fundador da CannaCraft que passou toda a sua vida adulta cultivando maconha. Hunter foi preso três vezes e condenado em 2005 a seis anos e meio em presídio federal por plantar maconha e fugir em uma batida. "Você fica basicamente escondido durante 20 anos e então escancara as portas. É um risco", disse ele. "E não há um caminho claro."

A eleição nacional ameaça uma trégua frágil e informal entre os Estados que legalizaram a droga e o governo federal. A proposta do presidente eleito Donald Trump de que o senador Jeff Sessions do Alabama assuma como ministro da Justiça perturbou a indústria de Cannabis por causa dos comentários feitos pelo senador sobre a droga. Em uma audiência no Senado em abril, Sessions descreveu a erva como "um perigo muito real".

"Precisamos que os adultos no comando em Washington digam que a maconha não é o tipo de coisa que deva ser legalizada", disse Sessions na audiência. Os defensores da Cannabis acreditam que, durante a presidência Trump, o Departamento de Combate a Drogas (DEA na sigla em inglês) reforçará sua posição linha-dura sobre a erva. Em agosto, a agência federal confirmou a situação da maconha como droga da Agenda 1, a classe mais perigosa, que inclui a heroína.

Milhares de empresas de Cannabis na Califórnia estão pensando agora se devem se registrar junto aos governos locais, pagar impostos e ser regulamentadas como todas as outras, ou continuar operando no mercado negro.

As dificuldades da CannaCraft, que apesar da batida em junho teve vendas de US$ 10 milhões até agora neste ano, foram observadas de perto por outras companhias do setor na Califórnia, devido à maneira como a empresa começou a cortejar abertamente legisladores estaduais e locais e pedir licenças como qualquer outro negócio.

Neste ano, a companhia se mudou para escritórios em um parque corporativo em Santa Rosa que já foram ocupados por uma empresa que fabricava stents cardíacos, e obteve uma licença como empresa de sopesando e permissão para operar máquinas de processamento agrícola.

"Seu zoneamento era bom. A escolha do local do prédio foi boa", disse Julie Combs, membro do conselho de cidadãos de Santa Rosa. "Eles certamente usaram uma política de portas abertas."

Em maio, a empresa abrigou quase 50 legisladores e reguladores de Sacramento, a capital da Califórnia, para demonstrar o processo que usa para produzir as cápsulas de gel e outros produtos baseados em maconha que não envolvem fumar a erva.

Duas semanas depois da visita dos legisladores, cerca de cem policiais e agentes de diversos órgãos policiais revistaram a sede da companhia e quatro outras instalações. Os policiais quebraram portas e, segundo a empresa, apreenderam cerca de US$ 500 mil em dinheiro, 22 máquinas no valor de US$ 3 milhões e US$ 1,5 milhão em produtos de Cannabis.

Hunter foi preso e mantido sob fiança de US$ 5 milhões, que segundo críticos da batida é uma quantia fora do comum e alta.

O tenente Michael Lazzarini, do departamento de investigações da polícia de Santa Rosa, disse que a polícia agiu com base em um "risco de segurança pública" causado pelo processo de manufatura da Cannabis, que ele descreveu como "ilegal e volátil".

2.jan.2015 - Nicole Gross usa uma seringa oral para dar ao seu filho Chase sua dose diária de óleo de maconha medicinal, na casa deles em Colorado Springs, no Colorado (EUA), em foto tirada nessa quinta (1º) e divulgada nesta sexta-feira (2). A família de Nicole deixou Chicago para viver no Colorado há cerca de um ano para tratar legalmente Chase com a substância. Chase tem centenas de convulsões por dia - Brennan Linsley/AP - Brennan Linsley/AP
Nicole Gross usa uma seringa oral para dar ao seu filho Chase sua dose diária de óleo de maconha medicinal, no Colorado
Imagem: Brennan Linsley/AP

"Há um enorme desejo de transformar Santa Rosa em um lugar para essa indústria prosperar", disse Lazzarini. "Mas muitas dessas empresas operam fora do âmbito dos regulamentos locais, estaduais ou federais."

A batida levou os legisladores de Sacramento a aprovar regulamentação em setembro para esclarecer que o procedimento de extração era legal. Lazzarini disse estar ciente da mudança na lei, mas que seu departamento continuaria investigando.

Hunter foi libertado dois dias depois da batida, e a exigência de fiança foi abandonada quando o promotor distrital decidiu não apresentar denúncia contra ele, segundo Lazzarini. Mas o equipamento e o dinheiro da empresa não foram devolvidos.

A batida foi criticada por algumas autoridades locais, que disseram que ela enviou a mensagem errada para outras empresas que buscavam se livrar de seu passado clandestino. Combs, membro do conselho de Santa Rosa, descreveu a batida como uma reação exagerada a uma suspeita de violação de autorização.

"Se há um problema de um processo fabril ser inseguro, normalmente não quebramos portas e levamos a folha de pagamento", disse ela. "É quase como se a polícia, em diversos níveis, fosse como soldados japoneses em uma ilha lutando uma guerra que já terminou."