Milagre no Pacífico: há 61 anos, avião da Pan Am pousava em segurança no oceano
Há 90 anos, a Pan Am World Airways realizou seu primeiro voo, entregando correspondência entre a Flórida e Cuba. Por quase 30 anos, a companhia aérea teve a cidade de Nova York como sede, com seu nome e logo familiar de globo adornando a silhueta de Manhattan até encerrar suas atividades em 1991. A companhia deixou um legado de vários feitos inéditos.
"Foi a primeira a cruzar o Atlântico, a primeira com voos cruzando o Pacífico e a primeira a oferecer serviço ao redor do mundo", diz Kelly Cusack, a curadora da Fundação Museu Pan Am.
Neste mês de novembro, um tipo diferente de 'primeira vez' é lembrado no Museu do Berço da Aviação, em Garden City, Long Island, com a homenagem da Fundação Pan Am à tripulação do primeiro avião de passageiros a pousar no oceano sem nenhuma fatalidade.
O voo da Pan Am ocorreu em 16 de outubro de 1956, 53 anos antes do capitão Chesley B. Sullenberger 3º e Jeff Skiles realizarem seu famoso pouso de emergência no rio Hudson, e todo o evento de roer as unhas foi filmado.
"Isso é particularmente memorável e uma parte orgulhosa de nosso legado por causa de duas palavras: final feliz", diz Jeff Kriendler, que era o vice-presidente para comunicações da Pan Am nos anos 80 e escreveu várias antologias a respeito da companhia aérea.
Em 1956, em um voo noturno de Honolulu para San Francisco, um Boeing 377 Stratocruiser apresentou problemas em um, depois dois de seus motores. O voo 6 da Pan Am estava na metade de seu percurso sobre o Oceano Pacífico no momento e a hélice em mal funcionamento colocou o avião em trajetória descendente.
A decisão de pousar o avião no mar com 24 passageiros e sete tripulantes a bordo não foi tomada às pressas. O capitão Richard Ogg, o piloto, escreveu um relato sobre o episódio um ano após o acontecido. Ele teve que pesar muitos fatores. Ele deveria descartar o combustível e tentar pousar imediatamente na água ou voar até que a luz do amanhecer lhe proporcionasse melhor visibilidade?
Uma coisa estava clara: a hélice ruim estava fazendo com que o avião queimasse combustível mais depressa. Ele não chegaria a San Francisco e nem Honolulu.
Ogg, que morreu em 1991, mantinha contato por rádio com o capitão William Earle da Guarda Costeira, que estava comandando o Pontchartrain, um cúter de 77 metros navegando abaixo do avião. Não foi por acaso que a embarcação estava próxima.
Nos primórdios dos longos voos sobre a água, navios da Guarda Costeira ficavam posicionados nos oceanos Pacífico e Atlântico, oferecendo informações sobre o tempo para as tripulações e retransmitindo mensagens de rádio, segundo Doak Walker, historiador da Guarda Costeira que participou do resgate do voo 6.
Os cúteres ficavam posicionados perto daquele que era considerado como ponto sem retorno, a área onde o avião teria queimado tanto combustível a ponto de não ter o suficiente para voltar em caso de emergência.
Ogg optou por voar um circuito de 13 km acima do Pontchartrain até o amanhecer enquanto planejava o pouso na água. Lembrando de que durante outro pouso na água de um Pan Am Stratocruiser a cauda do avião se partiu, Ogg fez com que os passageiros no fundo do avião viessem para a frente e também pediu para que os passageiros sentados perto dos motores também se mudassem. "Vamos tentar permanecer no ar até o amanhecer", Ogg informou por rádio o Pontchartrain.
Quando os passageiros souberam que o avião voaria em círculos e não tentaria pousar no escuro, "isso lhes deu muita confiança", diz Frank Garcia, 91 anos, engenheiro de voo e convidado de honra no evento da Pan Am.
Os passageiros também ficaram mais tranquilos ao saberem que "alguém estaria lá esperando por eles para lhes dar o máximo de ajuda possível", diz Garcia.
De vigia no cúter pouco depois das 8h da manhã, Walker, 83 anos, lembrou que "o mar estava extremamente calmo e o tempo estava bom, de modo que esperávamos que não haveria muito problema".
Como Ogg previu, assim que o avião tocou na água a cauda se partiu. Então o nariz do avião ficou submerso.
"Eu senti como se alguém tivesse agarrado a parte traseira das minhas calças e estivesse puxando", disse Garcia. "Eu via água. Fiquei com medo de que se os vidros quebrassem, então a água entraria." Da cabine, Garcia só via água. "Não sei dizer por quantos segundos, foi menos de um minuto, e então vi a água recuar", disse Garcia, quando a frente do avião subiu à superfície.
No Pontchartrain, muitos imaginavam ter testemunhado um desastre, disse Walker. "Foi muito triste", ele disse. "Achávamos que ninguém teria sobrevivido àquilo."
Os barcos de resgate aceleraram na direção do avião, enquanto outros membros da Guarda Costeira filmavam o evento. Os momentos registrados incluem os botes salva-vidas boiando ao lado da fuselagem do avião, a transferência dos passageiros para os botes, o avião afundando e duas gêmeas pequenas, Maureen e Elizabeth Gordon, sendo retiradas dos botes salva-vidas para os braços dos marinheiros que aguardavam. E todo mundo foi salvo.
"É algo complicado celebrar um desastre, apesar de ter sido uma história incrível o fato de todos terem sobrevivido", afirma John Hill, o curador do Museu SFO no Aeroporto Internacional de San Francisco, onde a Pan Am também tinha grande presença. "É preciso desempacotar o que aconteceu. Havia procedimentos. Havia planos. Havia uma camada adicional de apoio."
Quando aviões desaparecem, mais de dois terços das vezes eles estão voando sobre o mar, dix James Stabile, vice-presidente da Aeronautical Data Systems, que desenvolveu um programa que permite aos pilotos saber onde navios estão abaixo deles. E no punhado de casos em que um avião de passageiros pousou na água e ninguém morreu, como o voo 6 e o voo 1549 da US Airways no Hudson em 2009, barcos chegaram ao local imediatamente, disse Stabile.
O filme de 10 minutos da Guarda Costeira sobre o voo 6, completo com a conversa de rádio entre o navio e o avião, é dramático o suficiente para competir com "Sully: o Herói do Rio Hudson". Mas além de cativante, a história do voo 6 é um lembrete de que não eram apenas os primeiros aviadores quer eram pioneiros, mas também os passageiros.
"Os pilotos eram aqueles que tinham alguma aparência de controle, os passageiros não", diz Linda Shiner, editora da revista "Air & Space". O simples embarcar em um avião naqueles primórdios era um ato de coragem, porque a aviação não era tão segura quanto é hoje, opina Shiner. E quando algo catastrófico acontecia, a indústria tentava aprender com aquilo. "Devido aos passageiros correrem aqueles riscos", ela conta, "todos nós viajamos de forma muito mais segura agora".
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