Picada de aranha-armadeira causa ereção por mais de 2 horas e pode matar
Maurício Businari
Colaboração para UOL
20/03/2024 04h00
Medindo até 17 centímetros com as pernas esticadas, a aranha-armadeira (Phoneutria sp.) tornou-se conhecida por um efeito colateral muito peculiar, provocado por sua toxina ao picar um humano: ereções prolongadas e dolorosas, conhecidas como priapismo. Por essa razão, seu veneno é estudado pela indústria farmacêutica, para a composição de uma nova fórmula de remédio para a impotência masculina.
O que se sabe
Priapismo é o nome que se dá a ereções involuntárias e persistentes, que podem ser causadas pela picada das aranhas, explicou ao UOL Rogério Bertani, pesquisador científico do LEEV (Laboratório de Ecologia e Evolução) do Instituto Butantan, em São Paulo.
Acidentados por outras espécies de aranhas e escorpiões também podem apresentar priapismo. Como o priapismo geralmente ocorre em casos graves, o paciente muito provavelmente já estará recebendo atendimento quando isso acontece, senão, recomenda-se sempre procurar atendimento médico. Em adultos, o priapismo permanece de 1 a 2 horas. Em crianças, por mais de 2 horas. De qualquer forma, não são eventos comuns, ao contrário do que se imagina
Apesar de seu veneno poderoso, que pode até matar após um episódio de priapismo, a Phoneutria, também conhecida como aranha-da-bananeira, perde em número de vítimas para outra espécie, a aranha-marrom (Loxosceles sp.).
Segundo dados do Sinan (Sistema de Informação de Agravos de Notificação) do MS (Ministério da Saúde), entre 2019 e 2023, foram notificados no Brasil 23.868 casos de picadas causadas pela aranha-armadeira, com 13 mortes. Contra 38.030 casos de picadas causadas pela aranha-marrom, com 50 óbitos.
A terceira na lista é a viúva-negra (Latrodectus sp.), com 1.015 casos registrados e apenas uma morte. Existem ainda 59.245 casos envolvendo outras espécies de aranhas, não identificadas, com 16 mortes.
As regiões Sul e Sudeste são as mais propícias como habitat das armadeiras e, por essa razão, o número de casos é maior nessas áreas, com 2.807 casos ocorrendo no Sul e 2.709 na região Sudeste. Indivíduos da espécie vivem em áreas de floresta, como a Mata Atlântica, mas também ocorrem no Cerrado e no Pampa, em matas ciliares (nas beiras de rios) ou em morros, em matas de encosta.
Durante o dia se escondem entre folhas de plantas, debaixo de troncos caídos no chão, dentro de bromélias, em palmeiras. À noite saem para caçar, expondo-se sobre folhas grandes de plantas ou no chão da floresta. Caçam de emboscada, esperam a passagem de presas, que são normalmente insetos, e avançam sobre eles, imobilizando-os com veneno.
Em busca de abrigo
As aranhas passam a utilizar materiais depositados pelas pessoas como abrigo: madeira empilhada, tijolos, telhas são bons abrigos para elas se esconderem durante o dia. À noite, quando se locomovem atrás de comida, podem entrar nas casas. Ao amanhecer, procuram abrigo, que pode ser um sapato, roupas, móveis, porão da casa. Qualquer lugar que as proteja da luz.
Segundo Bertani, essas aranhas são chamadas popularmente de "armadeiras" por apresentarem um comportamento de defesa quando incomodadas, ao posicionarem-se sobre as quatro pernas traseiras, mantendo o corpo em posição vertical; e esticando as pernas anteriores, "armando-se". Nessa posição, podem saltar ou picar com facilidade. "Outras aranhas levantam as pernas anteriores quando são incomodadas, mas somente a armadeira consegue se manter nessa posição 'armada'", explica.
Ao picarem um animal, elas injetam substâncias neurotóxicas que agem no sistema nervoso, provocando principalmente muita dor. A maioria dos casos é classificada como leve, e podem ocorrer sintomas locais como edema, eritema, dor irradiada, sudorese, fasciculação e parestesia.
Casos moderados, ou graves, envolvem ação sistêmica, resultando em hipertensão, taquicardia, vômitos, agitação, bradicardia, sialorreia (produção excessiva de saliva), arritmia cardíaca, que pode evoluir para edema pulmonar e choque.
O antídoto para combater as neurotoxinas injetadas pelas aranhas durante um ataque chama-se soro antiaracnídeo. Ele é produzido no Instituto Butantan para ajudar pessoas picadas por aranhas ou escorpiões venenosos. Os médicos usam um líquido especial feito com anticorpos de cavalos para combater o veneno desses bichos.
Eles pegam o veneno das aranhas e escorpiões, obtidos com a aplicação de eletrochoques nos artrópodes, e injetam em cavalos, que recebem o veneno para produzir o plasma, matéria-prima do soro.
Mas ele só é usado em casos graves, quando alguém é picado por esses animais venenosos. Se não for uma dessas espécies, os médicos tratam os sintomas de outras picadas de aranhas e escorpiões de forma diferente.