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Presença negra na escola particular mostra urgência de política de equidade

Em meio à recente tragédia climática no Rio Grande do Sul, o anúncio da nova Política Nacional de Equidade, Educação para as Relações Étnico-Raciais e Educação Escolar Quilombola pelo Ministério da Educação (MEC) ficou longe dos holofotes da imprensa e das discussões na sociedade.

A ideia, de acordo com a portaria n° 470, de 14 de maio, é fomentar ações e programas educacionais voltados à superação das desigualdades étnico-raciais na educação brasileira e à promoção da política educacional para a população quilombola.

Mais do que analisar a iniciativa do governo federal que, sem dúvida, acerta ao tornar o enfrentamento ao racismo no ambiente escolar uma questão de política pública, vale destacar o contexto em que essa decisão foi oficializada.

Não são recentes os casos a que assistimos de crimes de racismo sendo cometidos diariamente nas instituições de ensino. Pesquisa divulgada em agosto pelo Instituto de Referência Negra Peregum e Projeto Seta revelou que o ambiente escolar lidera o ranking dos lugares em que as pessoas negras estão mais vulneráveis à violência racial —a cada 10 pessoas que relatam ter sofrido racismo no Brasil, 3,8 foram vítimas da violência em escolas, faculdades ou universidades.

A diferença significativa no contexto atual são os cada vez mais comuns casos de racismo em escolas de elite em São Paulo, algo raro até muito pouco tempo atrás, quando a ausência de pessoas negras em instituições particulares escancarava a falta de representatividade.

E esse cenário já era esperado: quando colocamos pessoas negras ou pessoas de grupos minorizados num ambiente que historicamente não está acostumado a ter outros corpos juntos, dividir o mesmo espaço, compartilhar outras histórias, o conflito vai se dar. Até então havia uma uniformidade de pensamentos e de identidades.

A afirmação de que devemos esperar que conflitos raciais ocorram não significa que nada deva ser feito ou que esses conflitos devam ser naturalizados. Embora saibamos que conflitos raciais irão acontecer, não devemos aceitá-los como normais.

É necessário tomar medidas e questionar os motivos pelos quais essas situações se tornam mais frequentes em um momento de maior diversidade racial em determinado espaço.

Poder lidar com essas diferenças é fundamental para que essas pessoas se sintam bem acolhidas em todos os lugares, especialmente no contexto escolar. Não podemos achar que quando promovemos o acesso de pessoas negras a esses espaços que, teoricamente, não estão acostumados a recebê-las, o racismo não vai acontecer. Pelo contrário, os crimes vão aparecer e ocorrerão de forma explícita.

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Por tudo isso, é fundamental olharmos da porta para dentro, nos debruçarmos sobre as diretrizes internas das próprias instituições de ensino. A política não é para calar as situações, mas para estabelecer protocolos que orientem ações, encaminhamentos, acolhimentos.

O que, em uma primeira análise, posso dizer é que as medidas recém-anunciadas pelo MEC estão atentas a essa necessidade. Além disso, contemplam aprimoramentos no que diz respeito ao conteúdo trabalhado nas escolas, o que é de extrema importância.

Entretanto, falta menção específica a algo que é essencial: a contratação de professores negros no ambiente escolar, para que esses alunos também se reconheçam no lugar daqueles que lideram o processo de aprendizagem.

Há diversos exemplos de iniciativas que vão nessa direção, e destaco uma em especial que vem justamente trabalhando as potencialidades das escolas de elite em sua terceira rodada de campanhas de financiamento coletivo.

Trata-se da Plataforma Alas, resultado de um movimento colaborativo coordenado por mim na Fundação Tide Setubal desde 2021. O objetivo é acelerar a busca pela equidade racial nas posições de liderança por meio de um acordo de compromissos, ações de fomentos e mobilização de recursos de parceiros do Investimento Social Privado e Empresas.

Neste ano, a iniciativa envolve instituições de ensino como Semear, Insper, Columbia, Escola Nossa Senhora das Graças e Colégio Santa Cruz. O objetivo é captar recursos para custear bolsas de estudo para pessoas negras, além de auxílio para a vivência universitária e atividades formativas com foco na empregabilidade e desenvolvimento.

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As instituições formadoras e de ensino que participam da Plataforma Alas, ao aderirem à parceria, precisam assumir pelo menos três compromissos internos para promover a equidade racial. Esses compromissos envolvem a análise da diversidade e inclusão institucional, a criação de um ambiente seguro, a facilitação do acesso e inclusão, a realização de ações de avaliação sobre a implementação do plano institucional de equidade racial e o posicionamento público sobre o tema.

Acreditamos que, ao pensar em políticas de acesso, é necessário ir além da representatividade. É preciso considerar processos de inclusão, equidade e pertencimento e estar ciente de que, mesmo nesse patamar, conflitos e tensões raciais ainda se farão presentes. Nesse contexto, é essencial adotar ações eficazes diante de atitudes e comportamentos racistas por parte dos membros da instituição.

Temos trabalhado incessantemente para que, além das ações afirmativas que garantem o acesso de pessoas negras nesses espaços, a permanência seja efetiva. Nosso objetivo é que a diversidade racial encontre no ambiente escolar um espaço de referência e exemplaridade para toda a sociedade.

Por fim, a promoção da equidade racial nas instituições de ensino exige um compromisso contínuo e integrado. Não basta garantir o acesso; é imperativo assegurar a inclusão e a permanência em um ambiente seguro e acolhedor, onde a diversidade seja valorizada e conflitos raciais sejam abordados com seriedade e eficácia. Dessa forma, esperamos contribuir para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária.

*Viviane Soranso é psicóloga e ativista social, com especialização na promoção da inclusão racial e de gênero. Concluiu seu mestrado pelo programa Mudança Social e Participação Política da EACH-USP (Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo. Com 18 anos de experiência no terceiro setor, é coordenadora do Programa Lideranças Negras e Oportunidades de Acesso na Fundação Tide Setubal.

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