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Ayres Britto: Instituir lista fechada é trocar democracia por "partidocracia"

Ayres Britto, em sua última sessão no Supremo, em 14 de novembro de 2012 -  Sergio Lima/Folhapress
Ayres Britto, em sua última sessão no Supremo, em 14 de novembro de 2012 Imagem: Sergio Lima/Folhapress

Do UOL, em São Paulo

24/03/2017 00h08

O jurista e ex-presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) Ayres Britto, em entrevista ao jornalista Mario Sergio Conti levada ao ar pela GloboNews no final da noite desta quinta-feira (23), disse ser contrário à adoção do sistema eleitoral de lista fechada por considerá-lo "incompatível" com o modelo constitucional brasileiro.

"Na lista fechada, quem, em última análise, vai classificar os eleitos, pela ordem descendente, são os partidos políticos. Pela Constituição, o partido político faz o meio de campo entre o eleitor e o candidato. Pela lista fechada, o candidato faz o meio de campo entre o eleitor e o partido. Vamos trocar uma democracia por “partidocracia”, afirmou.

A lista fechada prevê que o eleitor passe a votar no partido, cuja cúpula definirá uma lista dos candidatos que serão eleitos. A sigla que tiver mais votos conseguirá o maior número de cadeiras, que serão ocupadas pelos primeiros da lista. Hoje, o eleitor vota diretamente no candidato.

Ayres Britto argumentou que o voto previsto na Constituição brasileira – "direto, secreto, universal e periódico" - é um voto no candidato, no nome, e não no partido.

“Filiação partidária é condição de elegibilidade, mas não faz do partido um representante do povo. Pegue o artigo 44. A Câmara dos Deputados se constitui de representantes do povo e não dos partidos.”

Britto disse ainda que o modelo favorece o "caciquismo", a qual não se constitui em uma boa prática.

Os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE) encabeçam os esforços pela aprovação do sistema, visto como uma reação ao avanço da operação Lava Jato, porque poderia manter no poder, por conta do foro privilegiado, políticos na mira da operação. O assunto já esteve na pauta de manifestações de rua favoráveis à operação da Polícia Federal.

Um dia antes da entrevista do ex-ministro, o presidente Michel Temer disse também na GloboNews não ver com simpatia a mudança eleitoral para voto em lista fechada. “Eu não tenho tanta simpatia pela lista fechada [...]. Não quero ingressar nas questões do Congresso Nacional, mas, se eu pudesse dizer, eu diria que a melhor fórmula é o voto majoritário”, afirmou.

Em vídeo postado nas redes sociais no mesmo dia, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) disse que a iniciativa pode "cheirar a impunidade" e que, "se dois partidos se coligam, você não sabe em quem está votando, pelo quórum eleitoral. Então, é melhor proibir."

Caixa 2

O ex-ministro também opinou sobre a prática de caixa 2, que, embora não prevista expressamente no Código Eleitoral, pode ser enquadrada, segundo ele, no artigo 350 como falsidade documental (deixar de registrar a entrada do dinheiro). "Quando a origem do dinheiro se faz às custas do erário, do patrimônio público, com subtração de valores, certamente vai caracterizar, no mínimo, peculato. Ou seja, é crime."

Ayres Britto afirmou ainda que o caixa 2 desequilibra o jogo eleitoral, sendo um ingrediente imoral e antiético do "concurso público de nome eleição", no qual os candidatos são os políticos e os juízes, os eleitores. Para ele, como ocorre em toda competição pública, a eleição exige igualdade entre os competidores - o que o caixa 2 não propicia.