Fala de Dodge sobre PGR desagrada candidatos e aumenta mal-estar no MPF
A declaração da procuradora-geral da República, Raquel Dodge, que se colocou à disposição de uma eventual recondução ao cargo, repercutiu mal entre colegas do MPF (Ministério Público Federal) e aumentou o descontentamento de parte da categoria com a atual chefe da instituição.
Candidatos à lista tríplice, que deverá ser entregue ao presidente Jair Bolsonaro (PSL), criticaram a atitude de Dodge, que não se inscreveu para disputar as eleições internas realizadas pela categoria.
O mandato de dois anos de Dodge acaba em setembro deste ano. Cabe ao presidente da República escolher o novo chefe da instituição, que precisa ainda ser sabatinado pelo Senado e aprovado pela Casa.
Apesar de a indicação ser uma prerrogativa do presidente, a ANPR (Associação Nacional de Procuradores da República) realiza há 18 anos uma eleição interna para a escolha de uma lista tríplice, que é entregue ao presidente. Desde 2003, todos os procuradores-gerais da República foram escolhidos com base na lista tríplice.
Neste ano, Bolsonaro deu declarações dizendo que não iria, necessariamente, se ater à lista elaborada pela categoria. Dodge, que enfrenta forte resistência dentro do MPF (inclusive de integrantes da força-tarefa da Lava Jato no Paraná), não se candidatou ao processo para fazer parte dessa relação.
Ontem, durante um evento em São Paulo, ela declarou, pela primeira vez, que estaria à disposição para um eventual segundo mandato mesmo não fazendo parte da lista tríplice.
Estou à disposição da instituição e do país para eventualmente exercer o cargo de procuradora-geral da República. Já passei pelo crivo da minha instituição duas vezes e tenho um mandato que fala por si. Não almejo, mas me coloco à disposição
Raquel Dodge, procuradora-geral da República
O presidente da ANPR, Fábio Jorge, disse ter "estranhado" a declaração de Dodge. "É estranha essa declaração porque ela teve toda a oportunidade para se candidatar à lista tríplice e não o fez. É ainda mais estranho porque ela já defendeu esse instituto e passou pelas eleições outras duas vezes", afirmou.
Ex-presidente da ANPR, José Robalinho disse que a fala não chegou a surpreender, mas lamenta pela biografia de Dodge. "Não surpreende porque a gente já vinha notando as movimentações dela em relação à sucessão. Eu acho isso muito negativo. Lamento pela biografia e pela pessoa que todos nós admiramos", disse.
Internamente, a declaração foi recebida como mais um episódio de tensão entre Dodge e parte significativa da categoria. Apesar de ter feito parte da lista tríplice em 2017, ela foi apenas a segunda colocada quando indicada pelo então presidente Michel Temer (MDB). Isso gerou certo ruído, porque a tradição era que o mais votado fosse indicado.
Depois disso, acumulou desentendimentos com integrantes da força-tarefa da Lava Jato do Paraná e vem sendo criticada internamente pela velocidade considerada abaixo do esperado na condução da operação.
O procurador regional Vladimir Aras, candidato à lista tríplice, classificou o episódio como "triste". "É triste que uma colega que chegou ao cargo pela lista e que com ela se comprometeu por escrito agora vire as costas para a carreira e seus processos democráticos internos."
A subprocuradora Luiza Frischeisen também lamentou a declaração de Dodge. "Penso que, se ela pretende um segundo mandato, deveria concorrer à lista como fizeram os demais PGRs, que ficaram quatro anos: Antônio Fernando, [Roberto] Gurgel e Rodrigo Janot", afirmou.
Procurada pela reportagem, a assessoria de Dodge disse que ela não iria se manifestar.
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