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Doleiro diz que ex-vice-governador do DF acertou propina da Gol para Cunha

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Imagem: Divulgação

Eduardo Militão

Do UOL, em Brasília

04/02/2021 15h26

Pagamentos de propina da empresa Gol para Eduardo Cunha (MDB-RJ), ex-presidente da Câmara, teriam sido acertados em reunião na casa do ex-vice-governador de Brasília Tadeu Filippelli (MDB). A afirmação consta do depoimento do doleiro Lúcio Funaro, que serviu de base para a Operação Antonov, deflagrada nesta quarta-feira (3) pelo Ministério Público do Distrito Federal.

Investigadores fizeram buscas em endereços ligados a Cunha, Filippelli e à companhia aérea Latam, também suspeita de participação no caso. As empresas dizem cooperar com as investigações (leia mais abaixo).

Segundo Funaro, estavam presentes no encontro Cunha, o ex-ministro do Turismo Henrique Eduardo Alves (MDB-RN) e o dono da Gol, Henrique Constantino de Oliveira. Lá, eles teriam acertado a redução do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) para querosene de aviação de 25% para 12% no Distrito Federal.

A lei foi modificada em abril de 2013, a partir de um projeto de lei feito pelo governo de Brasília um ano antes. Haveria "aumento da capacidade de atendimento da crescente demanda por transporte aéreo, especialmente no período dos grandes eventos esportivos" e "auxílio às empresas aéreas com dificuldades financeiras devido à flutuação internacional do preço do petróleo", de acordo com comunicado oficial à época.

No depoimento, Funaro disse que ficou do lado de fora, mas obteve o relato do dono da Gol para fazer os pagamentos. "Quando voltou, Henrique Constantino falou: 'Está tudo certo', ou seja, eles combinaram com Tadeu [Filippelli] sobre a medida legislativa", afirmou aos procuradores, em depoimento. "Henrique Constantino solicitou ao depoente que ele entrasse em contato com Cunha para fazer a liquidação financeira."

Funaro - Lula Marques/Folhapress - Lula Marques/Folhapress
28.abr.2010 - Lúcio Bolonha Funaro depõe durante CPI das ONGs no Senado Federal
Imagem: Lula Marques/Folhapress

O doleiro afirmou que, em troca, a Gol fez os pagamentos para Cunha por meio da empresa Jesus.com e, "talvez", da C3. O doleiro disse que o ex-deputado emitiu "3 milhões de notas" [sic] para as empresas de Constantino.

Os valores supostamente pagos nesta operação não são conhecidos com precisão, já que o processo está em segredo de Justiça. Mas, na tentativa de colaboração premiada, Cunha confirmou essa versão de Funaro e afirmou que os pagamentos da Gol foram de R$ 3 milhões, destinados a ele, a Filippelli e a Henrique Alves.

Constantino negociou uma colaboração premiada com o Ministério Público. A Gol afirmou à reportagem que a empresa "permanece cooperando" com os investigadores.

Quebras de sigilo bancário obtidas por procuradores das operações Lava Jato e Greenfield já haviam identificado pagamentos do grupo Gol em contas ligadas a Cunha.

O que dizem as defesas

Ao menos um endereço da Latam em São Paulo já foi alvo de busca e apreensão, apurou o UOL.

Os investigadores suspeitam que, para pagar o ex-vice governador, foi utilizada uma empresa de consultoria. A Objetiva Consultoria e Participações, de Afrânio Souza Filho e Afrânio Souza Neto, foi alvo de buscas hoje, assim como a casa de Afrânio Filho, no Lago Sul. O Ministério Público suspeita que eles sejam "operadores" de Filippelli.

Procurada por telefone e correio eletrônico, a Latam não quis esclarecer sua relação com a Objetiva. A empresa disse ao UOL apenas que desconhece a investigação, mas que "irá colaborar com as autoridades competentes".

Cunha - Cristiano Mariz/VEJA   - Cristiano Mariz/VEJA
O ex-deputado Eduardo Cunha
Imagem: Cristiano Mariz/VEJA

O advogado da Objetiva, Leonardo Marinho, não esclareceu quais eram os negócios que mantinham com a Latam. O defensor disse que, "no momento oportuno, Afrânio Filho dará as explicações cabíveis". Marinho afirmou ao UOL que as buscas foram feitas com "ilegalidade" que seus clientes "confiam na Justiça".

"Pirotecnias acusatórias", dizem advogados de Cunha

Cunha está em prisão domiciliar no Rio de Janeiro. A defesa dele disse que as investigações possuem ilegalidades. "A operação de hoje é um retorno ao famigerado período das pirotecnias acusatórias", disseram os advogados Ticiano Figueiredo, Pedro Velloso e Délio Lins, em nota.

"Não há dúvida de que se trata de algo fabricado politicamente, com o intuito de retaliar, de forma injusta, alguém que vem cumprindo rigorosamente todas as condições que lhe foram impostas pela Justiça ao conceder a prisão domiciliar", afirmou o texto.

Segundo a defesa, "os próprios investigadores confessam que os fatos, os quais não guardam qualquer relação com Eduardo Cunha, são antigos, não passam de 2014".

Henrique Alves não foi localizado nos telefones registrados em seu nome. Filippelli não retornou os contatos da reportagem. Lúcio Funaro afirmou que não poderia comentar o caso.