Rio: Câmara põe sigilo sobre atuação de Carlos Bolsonaro em sessões remotas
A Câmara Municipal do Rio de Janeiro alegou sigilo para manter ocultos os registros de participação remota do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos) nas sessões plenárias durante a pandemia de covid-19.
Durante todo o período em que a Casa funcionou em sistema híbrido —com vereadores participando do plenário tanto presencialmente como por meio de um aplicativo—, Carlos Bolsonaro optou pela segunda opção.
Contudo, ao contrário dos colegas, ele o fazia quase sempre com a câmera desligada, o que impossibilitava saber se era de fato ele quem havia registrado a presença. Em praticamente todas as sessões, ele também mantinha o microfone mudo e não participava dos debates.
Por conta disso, o UOL solicitou, por meio da LAI (Lei de Acesso à Informação), em 4 de abril, os logs de acesso de Carlos Bolsonaro ao aplicativo dos vereadores. Esse tipo de arquivo registra informações básicas sobre a utilização de um sistema informatizado, como dia e horário em que um usuário fez login, bem como o momento em que saiu do app.
Mais de dois meses depois, Cesar Abrahão, chefe de gabinete do presidente da Câmara, Carlo Caiado (sem partido), negou o acesso da reportagem às informações. Sem nenhuma fundamentação, ele alegou que o sigilo dessas informações é garantido por lei.
"As informações solicitadas estão acobertadas pelo sigilo, conforme a Lei do Marco Civil da Internet", escreveu ele em sua decisão, sem apontar qual mecanismo da legislação colocaria as informações em sigilo.
A Câmara do Rio também desrespeitou a LAI ao não cumprir o prazo máximo para resposta —20 dias, prorrogáveis por mais dez dias— e não permitir a apresentação de recurso.
A pedido do UOL, Rafael Zanatta, diretor da Associação Data Privacy Brasil de Pesquisa, entidade especializada em proteção de dados e direito digital, avaliou a justificativa dada pela Câmara para negar os registros de acesso remoto de Carlos Bolsonaro.
Segundo ele, a interpretação dada pelo legislativo carioca distorce o Marco Civil da Internet para manter ocultos dados que deveriam ser públicos.
"As regras do Marco Civil sobre retenção de dados estão orientadas às aplicações de internet de forma geral, com enfoque no setor privado. A exigência de decisão judicial é uma garantia de devido processo. No entanto, não é regra absoluta. No caso de interesse público pela perspectiva de presença de membros do Legislativo em votações feitas por sistema automatizado, a questão deve ser vista pelas lentes da Lei de Acesso à Informação e pela Lei Geral de Proteção de Dados", explica ele.
"Não é uma violação de direitos de privacidade a apresentação de logs no exercício de uma função pública. Seria possível utilizar técnicas de mascaremento do IP [Internet Protocol, identidade única de uma conexão de internet na reda] e outras formas de apresentação dos dados evitando apresentação de informações que revelem residência particular, por exemplo".
Rafael Zanatta, diretor da Associação Data Privacy Brasil
Ironia após Câmara pressionar por câmera aberta
Por pressão da bancada do PSOL, a mesa diretora da Câmara publicou em 9 de março uma resolução contra as práticas de Carlos Bolsonaro. A regra recomenda que os vereadores estejam sempre com a câmera em funcionamento e torna isso obrigatório caso façam qualquer intervenção oral nas sessões, como discursos, apartes e questões de ordem.
Para ironizar a medida, o filho do presidente Jair Bolsonaro (PL) participou da sessão de 23 de março com a câmera direcionada a um banner com sua foto. Assim que ele entrou na transmissão, uma pessoa, que não aparece nas imagens, pendurou o cartaz na parede.
Em outro episódio, Carlos Bolsonaro registrou presença na sessão de 2 de dezembro de 2021, permanecendo com a câmera desligada. Ao mesmo tempo, foi flagrado no gabinete da Presidência da República, em Brasília, supervisionando a produção de um vídeo com o pai. O vereador aparece em imagens gravadas por Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara dos Deputados, durante a ação. Na ocasião, Carlos Bolsonaro só abriu sua câmera às 18h03, exatos 30 minutos após o UOL procurá-lo pelo telefone de seu gabinete e por email para ouvi-lo sobre o vídeo.
O vereador foi um crítico contumaz da suspensão de atividades presenciais durante a pandemia de covid-19. Só este ano, o vereador fez 30 publicações no Twitter ironizando o mote "fique em casa", defendido por especialistas como forma de proteção contra a doença.
Apesar disso, ele não se furtou em ficar em casa. Fontes consultadas pelo UOL afirmam que, do início da pandemia até maio deste ano, Carlos Bolsonaro praticamente só participou das sessões por meio do sistema remoto.
A Câmara dos Vereadores afirma não manter um registro específico sobre isso: tanto as participações remotas como as em plenário são registradas sem distinção nas atas elaboradas pela casa.
Ele só voltou a aparecer no plenário com regularidade em maio, quando a Câmara retomou um regime exclusivamente presencial nas sessões ordinárias, realizadas às terças e quintas. Sessões extraordinárias, promovidas às quartas, e audiências públicas seguem permitindo a participação remota dos vereadores.
A Câmara confirma não haver nenhum tipo de salvaguarda para garantir que apenas os vereadores utilizem o aplicativo, caso de reconhecimento biométrico ou facial. Segundo a casa, "o aplicativo desenvolvido pela Casa ao longo da pandemia de covid-19 permite o registro de votos, atualmente, apenas nas sessões extraordinárias, com integração à ferramenta Zoom para participação por videoconferência nas discussões. O acesso se dá por uma senha única fornecida ao parlamentar".
Carlos Bolsonaro foi procurado pela reportagem por meio de seu email, mas não retornou os contatos. Esta reportagem será atualizada em caso de manifestação.
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