Bolsonaro poderia ser informado sobre ação da PF? Entenda a polêmica do MEC
A menção ao presidente Jair Bolsonaro (PL) em um diálogo entre o ex-ministro da Educação Milton Ribeiro e sua filha levaram o escândalo do suposto balcão de negócios do MEC (Ministério da Educação) diretamente ao Palácio do Planalto. E levantou a questão: Bolsonaro foi previamente informado sobre a investigação?
Ribeiro e os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura são investigados por suposto esquema de liberação de verbas do FNDE (Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação) para prefeituras em troca de propina. Os dois líderes religiosos atuariam como lobistas instalados dentro do MEC e eram próximos do ex-ministro da Educação.
Antes isolado à pasta, o caso chegou ao Planalto após Milton Ribeiro afirmar, em conversa interceptada pela PF (Polícia Federal), que Bolsonaro disse achar que o ex-ministro seria alvo de buscas. O diálogo ocorreu no dia 9 de junho e, duas semanas depois, Ribeiro foi preso pela PF. Ele foi solto no dia seguinte.
A menção a Bolsonaro levou o caso a ser enviado ao STF (Supremo Tribunal Federal), que ainda aguarda o recebimento dos autos. No Congresso, a oposição protocolou um pedido para instaurar uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) para apurar suposta interferência de Bolsonaro na investigação.
Veja, abaixo, as principais perguntas e respostas sobre o caso:
Bolsonaro interferiu na investigação sobre Milton Ribeiro?
Ainda não é possível afirmar que houve uma atuação direta do presidente na divulgação de informações do inquérito que mira o ex-ministro Milton Ribeiro no escândalo do MEC. O caso ainda está na fase de análise se é possível ou não uma apuração sobre os indícios levantados pela investigação.
Na semana passada, o advogado de Bolsonaro, Frederick Wassef, negou que o presidente tenha interferido na apuração.
Quem apontou possível interferência de Bolsonaro?
A Polícia Federal apontou em ofício à Justiça Federal que, em conversas interceptadas pelos investigadores, Milton Ribeiro demonstrava estar "ciente" que seria alvo de buscas e apreensões. "Informação supostamente obtida através de ligação recebida do Presidente da República", relatou o delegado Bruno Calandrini.
O MPF também indicou à Justiça que o diálogo interceptado entre Milton Ribeiro e sua filha no último dia 9 de junho aponta "indício de vazamento de operação policial e possível interferência ilícita por parte do Presidente da República, Jair Messias Bolsonaro".
Quais indícios sustentam essa possibilidade?
Segundo o diálogo interceptado, Milton diz à filha que conversou com Bolsonaro e que o presidente disse ter um "pressentimento" que tentariam atingi-lo por meio do ex-ministro.
"A única coisa meio... hoje o presidente me ligou... ele tá com um pressentimento, novamente, que eles podem querer atingi-lo através de mim, sabe? É que eu tenho mandado versículos pra ele, né?", disse Ribeiro.
A filha pergunta: "Ele quer que você pare de mandar mensagens?"
E o ex-ministro responde: "Não! Não é isso... ele acha que vão fazer uma busca e apreensão... em casa... sabe... é... é muito triste. Bom! Isso pode acontecer, né? Se houver indícios, né?".
Quando foi o diálogo, e quando Milton Ribeiro foi preso?
A conversa entre o ex-ministro e sua filha ocorreu no dia 9 de junho. Milton Ribeiro foi preso 13 dias depois, em 22 de junho.
A Justiça já tinha autorizado buscas na época da conversa entre o ex-ministro e sua filha?
Sim. Na data da conversa grampeada entre Milton Ribeiro e sua filha, o juiz Renato Borelli, da 15ª Vara Federal Criminal do Distrito Federal, já havia autorizado a realização de buscas na residência do ex-ministro.
A decisão que permitiu a medida é datada de 17 de maio e foi mantida sob sigilo. Na ocasião, o magistrado também autorizou a interceptação telefônica de Milton Ribeiro e dos pastores Gilmar Santos e Arilton Moura e acesso aos extratos bancários dos investigados.
Borelli deixou claro na decisão que os autos deveriam permanecer em sigilo, para não atrapalhar a operação. O juiz disse que as informações não poderiam ser repassadas a "pessoas estranhas ao processo, sob pena de caracterização de crime".
No dia 20 de junho, Borelli determinou a prisão preventiva de Milton Ribeiro, que foi cumprida dois dias depois, em 22 de junho.
Por que o caso foi mandado para o STF?
Porque Bolsonaro possui a prerrogativa de foro privilegiado e a menção ao nome do presidente, sob suspeita de interferência, demanda que o caso seja levado para análise do Supremo, e não da primeira instância.
O presidente da República poderia ter sido informado sobre a operação?
Não. O Código Processual Penal estabelece que as investigações são, em via de regra, sigilosas. Normalmente, informações sobre operações em andamento são acessadas somente por investigadores, procuradores e juízes envolvidos no caso.
A mera menção a Bolsonaro é suficiente para abrir uma investigação sobre um possível vazamento?
Segundo integrantes da PGR e do MPF consultados pelo UOL em caráter reservado, sim. Na avaliação destes procuradores, há indícios suficientes que justificariam a abertura de uma apuração sobre possível vazamento de informações do inquérito. "Se [a investigação] chegará realmente ao presidente da República, aí é outra coisa", ponderou um integrante da PGR.
Quais crimes podem ser investigados?
Segundo procuradores ouvidos pelo UOL, é possível apurar três crimes neste caso: favorecimento pessoal, violação de sigilo funcional e obstrução de justiça, cuja pena pode chegar a até cinco anos de prisão.
Quem vai avaliar isso?
Caberá à equipe do procurador-geral Augusto Aras decidir se há razões suficientes para investigar o caso. O processo ainda não chegou na PGR, que será acionada assim que o caso for encaminhado ao Supremo. A relatora na Corte será a ministra Cármen Lúcia.
E a CPI do MEC? O que falta para começar?
Senadores da oposição reuniram mais de 30 assinaturas de seus pares (quatro a mais do que o mínimo exigido) e protocolaram o pedido de abertura da CPI do MEC. Para que a comissão parlamentar de inquérito seja instalada, o requerimento de abertura tem que ser lido pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), em plenário. Não há, contudo, um prazo regimental para que isso seja feito.
Não foi descartada a possibilidade de o caso ser judicializado, assim como ocorreu com a CPI da Covid, em 2021. Na ocasião, o STF (Supremo Tribunal Federal) forçou a abertura da comissão após senadores irem à Corte com pedidos para sua instalação. Isso, porém, não deve ser necessário, já que Pacheco tem sinalizado a aliados que poderá aceitar o pedido e determinar o início dos trabalhos.
Como será a CPI?
Se instalada, a CPI do MEC será composta por 11 senadores titulares e 11 suplentes, com duração de 90 dias, podendo ser prorrogada por mais 90. Eles querem apurar se houve interferência do presidente nas investigações sobre possíveis irregularidades no repasse de verbas a municípios pelo MEC e no suposto "balcão de negócios" que teria se instalado no ministério.
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