Damares volta a associar Marajó a pedofilia e ONGs rebatem ex-ministra

A senadora Damares Alves (Republicanos) usou as redes sociais nesta quinta (22) para denunciar supostos casos de exploração sexual de crianças e adolescentes no Arquipélago do Marajó, mas ONGs com atuação na região divulgaram notas em que questionam os interesses por trás da associação feita pela ministra.

O que aconteceu

Música que viralizou na internet levou assunto às manchetes. "Evangelho de Fariseus", da cantora gospel Aymeê, fala sobre problemas vivenciados na Amazônia e se tornou um hit nas redes sociais. A letra da canção cita o Arquipélago do Marajó, localizado no norte do estado do Pará.

Com repercussão na internet, assunto virou tema de posts de influenciadores. Personalidades como Rafa Kalimann e a atriz Thaila Ayala fizeram publicações no Instagram sobre os supostos casos de exploração sexual infantil na região.

"O Marajó pede socorro e não é de hoje", escreveu Damares hoje. No Twitter, a ex-ministra da mulher e dos direitos humanos de Jair Bolsonaro (PL) afirmou que tentou resolver o suposto problema na região durante sua passagem pelo governo, mas que a priorização do combate à pandemia impediu um melhor resultado.

Em setembro de 2023, o Ministério Público Federal ajuizou uma ação civil pública contra a ex-ministra. O motivo foram declarações falsas dadas pela ex-ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos no dia 8 de outubro de 2022, durante um culto evangélico em Goiânia — justamente sobre supostos casos de exploração sexual infantil no Arquipélago do Marajó.

Na ocasião, ela afirmou que crianças do Marajó tinham dentes arrancados para não morderem durante a prática de sexo oral e eram traficadas para exploração sexual. Elas ainda comeriam comida pastosa para o intestino ficar livre para o sexo anal.

Procuradores solicitaram pagamento de multa de R$ 5 milhões por Damares. Segundo o MPF, as informações divulgadas pela atual senadora eram "falsas e sensacionalistas". A Justiça ainda não deu sua decisão definitiva sobre o caso.

ONGs rebatem ministra

ONGs dizem que afirmações visam desarticular trabalho social que já existe na região. Em notas publicadas na internet, organizações como o Observatório do Marajó e a Cojovem (Cooperação da Juventude Amazônida para o Desenvolvimento Sustentável) sinalizaram que a associação do arquipélago à exploração sexual infantil é uma estratégia de aproximação adotada por grupos que hoje não estão presentes por lá e que tem outros interesses que não são o bem-estar dos moradores da região.

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Atual ministro de Direitos Humanos e Cidadania, Silvio Almeida compartilhou parte da nota do Observatório nas redes sociais.

Organizações que se manifestaram atuam há anos nas ilhas. Criado há uma década, o Observatório do Marajó analisa dados relativos a crise ambiental, participação social e vulnerabilidade social na região. A iniciativa é vinculada a ONG Lute Sem Fronteiras, criada pelo ativista carioca Luti Guedes em 2011. Já a Cojovem reúne lideranças nascidas na Amazônia e reconhecidas pela ONU, interessadas em compartilhar conhecimento e gerar resultados de impacto positivo para a floresta.

"Igrejas e outros grupos foram para o Marajó a convite de moradores", diz Damares. A ex-ministra afirmou que, durante sua passagem pelo Governo Federal, levou melhorias em energia e outras áreas ao arquipélago, repetiu que a região é palco de casos de exploração sexual infantil e lamentou que a questão tenha sido "politizada".

Denúncias de que programa criado por Damares era usado para atender a interesses estrangeiros levaram Lula (PT) a suspendê-lo. Criado na gestão Bolsonaro, o Abrace o Marajó teve as atividades encerradas pelo atual presidente em setembro de 2023. Segundo o governo, a política foi utilizada para a exploração de riquezas naturais, sem benefício ou participação social da população local.

Região é atendida por nova iniciativa desde maio do ano passado. Na ocasião, o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania lançou o Cidadania Marajó, para atacar os problemas enfrentados pelo arquipélago.

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O que dizem os envolvidos

Ainda hoje ouço e leio relatos de abusos na região. Isso me parte o coração e espero, sinceramente, que esta música acorde nossa sociedade, acorde o Brasil. Para que quem denuncia os abusos na região não seja silenciado. O Marajó pede socorro e não é de hoje. Que dessa vez as pessoas sejam verdadeiramente compelidas a agir ao ouvir o choro silencioso das crianças.
Damares Alves (Republicanos), senadora pelo Distrito Federal, no Twitter

A propaganda que associa o Marajó à exploração e o abuso sexual não é verdadeira: a população marajoara não normaliza violências contra crianças e adolescentes. Insiste nessa narrativa quem quer propagá-la e desonrar o povo marajoara. Enquanto ministra de Estado, Damares Alves não destinou os recursos milionários que por diversas vezes prometeu para a região, para fortalecer comunidades escolares. Ao invés disso, atentou contra a honra da população diversas vezes, espalhando mentiras, e abriu tais políticas públicas para grupos privados de São Paulo que defendem a privatização da educação pública.
Observatório do Marajó, em nota oficial

Reafirmamos nosso compromisso de cooperação e apoio àqueles que efetivamente enfrentam essas problemáticas no território. Não precisamos de um olhar estigmatizado e cheio de preconceito. O Marajó é símbolo de resistência, encanto e cultura da Amazônia.
Cojovem, em nota oficial

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