Acuado, Bolsonaro evita ataque a STF, nega golpe e defende anistia para 8/1
Do UOL em São Paulo e Brasília
25/02/2024 17h08
Alvo de várias investigações da Polícia Federal, Jair Bolsonaro abandonou o teor golpista de seus discursos e pregou anistia aos envolvidos no 8/1.
O que aconteceu
O ex-presidente defendeu tratamento brando por parte da Justiça - as condenações superam 15 anos de cadeia. "O que busco é a pacificação, é passar uma borracha no passado. É buscar maneira de viver em paz, não continuarmos sobressaltados".
Na sequência, o ex-presidente clamou por anistia ao Congresso Nacional. "É por parte do parlamento brasileiro uma anistia para os pobres coitados que estão presos em Brasília".
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Na tentativa de convencimento, ele usou a história brasileira. "Nós já anistiamos no passado quem fez barbaridades no Brasil. Pedimos um projeto de anistia para que seja feita justiça no Brasil. Quem, por ventura, depredou, que pague. Mas essas penas [mais de 15 anos] fogem ao mínimo da razoabilidade".
Bolsonaro também reclamou por estar inelegível. Ele não citou o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e nem o STF, mas disse que não se pode admitir que um poder tire pessoas do jogo das eleições.
O ex-presidente se apresentou como um perseguido político. Em vez de usar argumentos, Bolsonaro ofereceu um raciocínio peculiar. Para ele, a Polícia Federal abrir investigação em episódios como a venda de joias que eram patrimônio do Planalto caracteriza atitude política.
Acrescentou que os presos no 8 de janeiro também são perseguidos. Os nomes de vários criminosos relacionados a invasão ao Congresso, Planalto e STF foram mencionados no ato deste domingo na avenida Paulista.
Sobre a suspeita de querer dar um golpe, o ex-presidente falou que não houve tanque na rua. Mencionou que precisaria de apoio político e de empresários, o que não teria feito. Ocorre que as investigações apuraram que houve consulta sobre apoio aos chefes das Forças Armadas e envolvimento de grandes empresários.
Bolsonaro também se defendeu da descoberta minuta do golpe. Tentou justificar que estado de sítio começa com presidente convocando os Poderes. Declarou ainda que a proposta precisa ser aprovada em votação do Parlamento.
Mas o ex-presidente não se aprofundou nas explicações sobre as suspeitas que pesam contra ele. Deu justificativas evasivas e deixou de mencionar várias investigações como a Abin paralela e falsificação do cartão de vacinas.
Nós não podemos concordar que um Poder tire do palco político quem quer que seja, a não ser por um motivo extremamente justo. Não podemos pensar [em] ganhar as eleições afastando os opositores do cenário político.
Jair Bolsonaro
Malafaia sugere que Lula sabia do 8 de Janeiro
Bolsonaro terceirizou as críticas a Alexandre de Moraes ao pastor Silas Malafaia, que fez um discurso político. O religioso "manifestou repúdio" ao presidente Lula e reclamou que há uma "engenharia do mal" para prender Bolsonaro.
Malafaia sugeriu que Lula sabia de antemão do 8 de Janeiro. Ele citou a viagem do presidente para Araraquara (SP), ocorrida naquele dia, como se fosse uma saída de cena.
Mas em momento nenhum, foram apresentadas provas, apenas ilações. Malafaia usou fatos já esclarecidos como se fossem tentativa de encobrir responsabilidades.
Um exemplo, as imagens da câmeras do Ministério de Justiça no 8 de janeiro não serem conhecidas. Isto ocorreu porque elas foram solicitadas depois de expirado o prazo de armazenamento.
Para o pastor, a invasão às sedes dos Três Poderes foi uma situação foi usada para criar uma narrativa contra o ex-presidente. Na avaliação de Malafaia, Bolsonaro nunca demonstrou intenção de dar golpe de Estado.
Ele ainda criticou o que entende serem dois pesos e duas medidas. Citou que Aécio Neves (PSDB) questionou o resultado das urnas em 2014 e nada aconteceu. Mas que Bolsonaro teve outro tratamento.
Elogios a Bolsonaro e oração
Michelle Bolsonaro abriu a manifestação com uma fala em tom de sermão. Mencionou Deus o tempo todo e tentou apresentar o marido como um escolhido dos céus. Os parlamentares que a sucederam foram na mesma linha. O senador Magno Malta (PL-ES) segurava a bandeira de Israel enquanto discursava.
O governador de São Paulo mudou o tom do evento. Tarcísio de Freitas (Republicanos) fez uma série de elogios a Bolsonaro e adotou um caráter mais político. Falou do legado do ex-presidente e valores como liberdade.
O ato ganhava tom de campanha, algo que já acontecera no começo. Bolsonaro desceu do carro com uma liderança política, o governador de São Paulo. Neste momento, soaram os acordes de Capitão do Povo, jingle que usou na corrida presidencial.
O ex-presidente escolheu chegar ao trio passando pelo meio do público. Era assim que ele agia no segundo turno das eleições de 2022. Para completar o caráter de campanha, o evento contava com Cuiabano Lima, que foi mestre de cerimônias de Bolsonaro na corrida presidencial.
Tentativa de ser pacífico
A preocupação em não agredir instituições e autoridades foi constante. Ao meio-dia o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) postou no X uma mensagem ressaltando o caráter pacífico do ato e disse que havia flagrado "infiltrados" desrespeitando a orientação.
A busca por um caráter não ofensivo se notou logo na abertura do evento. O funk que tocou nas campanhas presidenciais de Bolsonaro foi escolhido para anunciar o começo do ato, mas foi executado sem a letra que chama esquerdistas de cadelas.
Mas a harmonia não durou muito. Pessoas que insistiam em subir no trio de Bolsonaro começaram a brigar. O comportamento fez o pastor Silas Malafaia, organizador do ato, tomar o microfone e dar uma bronca. "Vocês vão dar vexame aqui para esta multidão? Só sobe quem tá de pulseira verde".
Megalomania de volta
A convocação de Bolsonaro ressuscitou youtubers e exageros. O canal Brasil Patriota anunciava a presença de Donald Trump no trio falando para mais de um milhão de pessoas.
Os discursos da militância seguiam a linha conhecida. Defesa da família, valores conservadores e críticas ao PT e ao presidente Lula, que estariam conduzindo o Brasil para o comunismo.
A estética verde amarela do bolsonarismo reapareceu na companhia de bandeiras de Israel. Ela já se fazia presente em atos no passado, mas ficou mais simbólica depois de Lula comparar as atitudes do país na guerra contra o Hamas ao Holocausto.
Ato reuniu cerca de 600 mil pessoas na Paulista, diz SSP. Em nota, a Secretaria da Segurança Pública informou que a manifestação "ocorreu de forma pacífica, sem o registro de incidentes e com a presença de, aproximadamente, 600 mil pessoas na avenida Paulista e 750 mil pessoas no total, quando levado em conta o público presente nas ruas adjacentes".
Levantamento da USP aponta que estimativa de público para o pico do ato, às 15h, é de 185 mil pessoas. O dado faz parte do Monitor do Debate Político, da Escola de Artes, Ciências e Humanidades Universidade de São Paulo. Às 17h, após os discursos, a contagem indicou 45 mil participantes. A equipe acompanhou a manifestação, produziu imagens aéreas às 15h e às 17h e contou o público com auxílio de software.