Ministro do STM aponta 'falta de repercussão social' em mortes com 82 tiros
O ministro Carlos Augusto Amaral Oliveira, do STM (Superior Tribunal Militar), alegou "ausência de repercussão social" para negar o pedido de ONGs de direitos humanos para participar do processo que discute a condenação de militares do Exército que assassinaram com 82 tiros um músico e um catador de latinhas durante uma operação no Rio, em 2019.
O julgamento será retomado na próxima quarta (18).
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O que aconteceu
Entidades de direitos humanos pediram para entrar no processo como amicus curiae. Também chamada de "amigos da corte", essa designação permite que pessoas e instituições que não têm envolvimento direto no processo possam se manifestar perante o tribunal e apresentar dados e argumentos para auxiliar os ministros a decidirem sobre o caso.
Leia aqui a íntegra da decisão do ministro do STM
Ministro relator negou o pedido no dia 25 de novembro. O pedido foi assinado pelas entidades Associação Direitos Humanos em Rede - Conectas, Justiça Global, Instituto de Defesa da População Negra - IDPN e Instituto da Mulher Negra - Odara.
Justificativa foi 'falta de repercussão social'. O ministro rebateu que o caso diz respeito somente aos envolvidos. Ele refutou os argumentos apresentados pelas instituições de que uma eventual absolvição dos militares representaria uma violação aos direitos humanos e um abalo ao Estado Democrático de Direito.
No presente caso, não obstante a gravidade dos fatos objeto da presente apelação, com ampla cobertura pelos meios de comunicação, a questão está longe de se considerar uma repercussão social, pois tem-se aqui uma questão fática com partes definidas, em que o resultado do julgamento por esta Corte, seja mantendo a condenação, seja diminuindo a pena ou até mesmo absolvendo os apelantes, impactará tão somente na vida desses protagonistas do processo e não no comportamento ou nos direitos de outros grupos socialmente organizados.
Trecho da decisão do ministro Carlos Augusto Amaral Oliveira, do STM
STM tem dois votos favoráveis a militares
Processo envolve 12 militares. Oito deles foram condenados em primeira instância em 2021. Eles recorreram até o Superior Tribunal Militar, a última instância da Justiça Militar, contra as penas que variaram entre 28 e 31 anos. O julgamento no tribunal começou em fevereiro deste ano.
Relator defendeu redução de penas para pouco mais de três anos. Na prática, caso essa pena menor se confirme, nenhum militar viria a ser preso em regime fechado. O relator entendeu que os militares devem ser absolvidos pela morte do músico Evaldo Santos e que deveriam ser enquadrados apenas por homicídio culposo (quando não há intenção de matar) no caso do catador de lixo Luciano Macedo, que foi alvejado no dia e morreu dias depois no hospital.
Dois votos para redução da pena. O revisor do caso, ministro José Coelho Ferreira, seguiu o entendimento do relator e votou para que as penas deveriam sejam de três anos, dez meses e 24 dias de prisão para o então comandante da operação, tenente Ítalo da Silva Nunes Romualdo, e três anos, dois meses e 12 dias para os outros sete militares condenados. Diferentemente do relator do caso, o revisor não é militar.
Ministra Maria Elizabeth Rocha pediu vista. O processo está parado desde então. Caso será julgado em uma sessão extraordinária do STM marcada para a próxima quarta-feira (18). A expectativa é que o voto da ministra, que é civil e assumirá a presidência do tribunal no ano que vem, vá na contramão dos demais colegas e mantenha punições altas aos militares.
Faltam votar outros 12 magistrados. O STM é composto por 15 ministros, sendo dez militares das Forças Armadas e cinco civis. Os militares são oficiais generais do último posto, sendo quatro do Exército, três da Marinha e três da Força Aérea. Entre os civis, três são da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), um é oriundo da magistratura e o outro é do Ministério Público.
O relator da ação, Carlos Augusto Amaral, é oriundo da FAB. O revisor, José Coelho Ferreira, da OAB.
Relembre o caso
Em 7 de abril de 2019, oito militares dispararam 82 tiros contra o carro de Evaldo Rosa dos Santos. O músico morreu na hora.
Ele estava com a família a caminho de um chá de bebê. Ele cruzou com a patrulha na região da Vila Militar em Guadalupe, na zona norte do Rio. O veículo teria sido confundido com o de traficantes.
O catador Luciano Macedo, que passava a pé, foi ferido e morreu dias depois. Segundo Dayana Fernandes, viúva de Macedo, o marido tentou ajudar Evaldo após o carro ter sido alvejado.
Em outubro de 2021, o Tribunal de Justiça Militar condenou oito militares por homicídio qualificado. As penas vão de 28 a 31 anos. Eles ficaram presos por 90 dias e recorrem em liberdade.
No ano passado, a família do músico fechou um acordo com a AGU (Advocacia-Geral da União) para receber indenização no valor de R$ 2 milhões. A família de Macedo recebeu R$ 841 mil.