Letícia Casado

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Reportagem

STM tem 2 votos pela redução da pena de militares que mataram com 82 tiros

Quase cinco anos depois do assassinato do músico Evaldo Rosa dos Santos e do catador de latas Luciano Macedo, o STM (Superior Tribunal Militar) começou a julgar nesta quinta (29) o recurso dos oito militares condenados no caso. O carro de Santos foi alvejado por 82 tiros na zona norte do Rio. Macedo passava a pé pelo local.

Dois ministros votaram para reduzir a pena para aproximadamente um décimo do tempo a que os militares já foram condenados. Uma terceira ministra pediu vista — por isso, o julgamento foi suspenso por volta das 21h.

Os militares foram condenados em 2021 pela Justiça Militar a penas que variam de 28 a 31 anos em regime fechado por homicídio qualificado e recorreram ao STM (leia mais abaixo).

Relator da ação no tribunal superior, o ministro Carlos Augusto Amaral votou para mudar a sentença para homicídio culposo (quando não há intenção de matar) e reduziu o tempo de prisão para cerca de três anos em regime aberto.

O ministro revisor do processo, José Coelho Ferreira, acompanhou o voto do relator. A ministra Maria Elizabeth Rocha pediu vista e o julgamento foi suspenso. Além dela, 12 magistrados ainda não votaram.

O STM é composto por 15 ministros, sendo dez militares das Forças Armadas e cinco civis. Os militares são oficiais generais do último posto, sendo quatro do Exército, três da Marinha e três da Força Aérea. Dentre os civis, três são da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), um é oriundo da magistratura e o outro é quadro do Ministério Público.

O relator da ação, Carlos Augusto Amaral, é oriundo da FAB. O revisor, José Coelho Ferreira, da OAB.

O que disse a acusação

O procurador-geral Antônio Pereira Duarte, que representa as vítimas, afirmou que "não havia assalto em andamento" para os militares agirem daquela maneira.

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Ainda que supusessem se ter deparado com o carro dos autores do roubo, O assalto já havia cessado. A perseguição podia ter continuado, mas não havia assalto em andamento. Ali, na verdade, era desdobramento de uma ação, mas que não reclamava da parte dos militares que pudessem despejar saraivada de tiros.

Ele também destacou que, ao recorrer da condenação, os militares reiteram a tese de que supunham estar sob ameaça. E que alegam que após quase duas horas de confronto com traficantes naquela manhã, se encontravam abalados e temerosos por suas vidas, "para sustentar que seriam nítidos os ânimos de temor e vulnerabilidade que eles se encontravam".

Assistente da acusação, o advogado André Perecmanis, que representa as famílias das vítimas, disse que a defesa dos militares alegar que eles estavam sob estresse não é razoável.

Se as Forças Armadas trocarem tiros na parte da manhã, ninguém sai às ruas porque tudo pode acontecer. Se tiver um assalto e alguém estiver com um carro igual ou parecido com o dos assaltantes, vai ser uma fatalidade se for metralhado com 82 tiros de fuzil. E a população gritava, os vídeos, mostram: 'É trabalhador'. E nem assim esses militares mostraram empatia.

O que disse a defesa

O advogado Rodrigo Roca, que defende os militares, afirmou que a ação foi um "erro plenamente justificado pelas circunstâncias".

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Eles se depararam com uma situação praticamente impossível de acontecer. Eles foram defender o cidadão de bem.

Roca disse que os militares agiram em legítima defesa por entenderem que estavam em confronto em uma área de conflito. Eles teriam sido informados sobre um assalto na região e entrado em confronto com bandidos, que fugiram. Na perseguição, teriam confundindo o carro do músico, que já teria uma marca de bala, com o dos criminosos.

O local era de conflito, o local estava em pleno conflito e eles haviam deixado, aliás, estavam o dia inteiro no combate. Há um pano de fundo que precisa ser considerado. É o que as Forças Armadas esperam de seus militares.

Roca afirmou que os militares estavam em missão, fardados e cumprindo ordens. E citou o Código Penal Militar: "é isento de pena quem atua supondo uma situação de fato que se existisse tornaria a ação legítima".

"Se é preciso um pretexto jurídico para desvendar essa ação humana, é este", acrescentou Roca. Ele pediu a absolvição dos réus, a alteração por homicídio culposo ou a redução da pena dos militares.

Relembre o caso

Em 7 de abril de 2019, oito militares dispararam 82 tiros contra o carro de Evaldo Rosa dos Santos — o músico morreu na hora.

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Ele estava com a família a caminho de um chá de bebê quando passou por patrulha na região da Vila Militar em Guadalupe, na zona norte do Rio. O veículo teria sido confundido com o de traficantes.

O catador Luciano Macedo, que passava a pé, foi ferido e morreu dias depois. Segundo Dayana Fernandes, viúva de Macedo, o marido tentou ajudar Evaldo após o carro ser alvejado.

Em outubro de 2021, o Tribunal de Justiça Militar condenou os oito militares por homicídio qualificado a penas que vão de 28 a 31 anos. Eles ficaram presos por 90 dias e recorrem em liberdade.

No ano passado, a família do músico fechou um acordo com a AGU (Advocacia-Geral da União) para receber indenização no valor de R$ 2 milhões. A família de Luciano fechou acordo para receber de R$ 841 mil.

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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