Governo reservou R$ 1,7 bi para emendas que AGU agora defende suspender
O governo já tinha reservado R$ 1,7 bilhão para as emendas de comissão quando o ministro Flávio Dino, do STF, bloqueou o pagamento de R$ 4,2 bilhões por falta de transparência no uso da verba. Nesta segunda-feira (30), a AGU orientou os ministérios a seguir a decisão.
O que aconteceu
A informação sobre a reserva do dinheiro é da Secretaria de Relações Institucionais, dirigida pelo ministro Alexandre Padilha. Ela faz o meio de campo entre o governo federal e os parlamentares. Entre suas tarefas, está a liberação de emendas, alvo de disputa entre Dino e o Congresso Nacional.
A secretaria empenhou R$ 1,7 bilhão, o que é diferente de pagar. Na burocracia de Brasília, empenho significa reservar recursos para, no futuro, repassá-lo para obras, programas sociais e outras atividades. O empenho ocorreu antes de 23 de dezembro, data em que Dino suspendeu as emendas de comissão da Câmara dos Deputados.
São seis os ministérios beneficiados:
- Turismo: R$ 441 milhões;
- Cidades: R$ 335,1 milhões;
- Saúde: R$ 330,2 milhões;
- Esportes: R$ 307,9 milhões;
- Integração: R$ 278,2 milhões;
- Agricultura: R$ 83,2 milhões.
Emendas sob suspeita
Os questionamentos de Dino em relação às emendas remontam a 14 de agosto. Nessa data, o ministro do STF suspendeu os pagamentos por falta de transparência. Ele argumentou que é preciso identificar o parlamentar que está enviando o dinheiro, informar quem vai recebê-lo e qual uso será dado a ele.
As emendas de comissão, porém, não seguiram esses critérios. O documento de envio das verbas foi assinado por 17 líderes partidários e não mencionava os deputados que mandaram o dinheiro. Outro problema é que os recursos cairiam no caixa geral de prefeituras, fazendo a verba se misturar aos recursos municipais e impedindo a fiscalização da aplicação da emenda.
A discussão iniciada em agosto durou o restante do ano e, em 23 de dezembro, Dino reiterou a suspensão das emendas. Enquanto o cabo de guerra entre o ministro e o Congresso acontecia, a Secretaria de Relações Institucionais reservou o R$ 1,7 bilhão. O ministro do STF não só desautorizou a medida do ministro Padilha como cancelou o total de emendas de comissão, no valor de R$ 4,2 bilhões.
Além de suspender as emendas de comissão, o ministro do STF determinou a abertura de um inquérito. Ele mandou a Polícia Federal investigar como se dá o uso de bilhões em verbas enviadas por parlamentares a aliados em seus estados.
Ontem, Dino autorizou o pagamento de parte das emendas. Aquelas que foram empenhadas antes de 23 de dezembro foram preservadas, e os pagamentos podem acontecer.
AGU orienta não pagamento de emendas
Dependente do Congresso para aprovar projetos, o governo atuou junto com os parlamentares no cabo de guerra contra Dino. Em meados de dezembro, a AGU (Advocacia-Geral da União) redigiu um parecer para embasar a manutenção das emendas.
Padilha e integrantes da AGU se uniram para liberar as emendas. O Planalto dependia de deputados e senadores para aprovar a reforma tributária e o pacote de corte de gastos do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
Mas hoje a AGU foi na direção contrária a Padilha. Um novo parecer orienta os ministérios a suspender as emendas de R$ 4,2 bilhões por não haver clareza de que o pagamento seria legal —o valor de R$ 1,7 bilhão empenhado pela Secretaria de Relações Institucionais está dentro desse montante.
De acordo com a AGU, são necessários esclarecimentos de Dino para saber se é legal pagar as emendas. O órgão informou ao UOL que encaminhou ao ministro nesta segunda um pedido para que ele "esclareça parte de sua decisão e, assim, libere todas as emendas de comissão empenhadas até o dia 23 de dezembro de 2024".
Governo usa saúde para desovar emendas
Enquanto a novela sobre as emendas de comissão não termina, o Ministério da Saúde liberou R$ 2 bilhões em emendas. O valor consta de portarias publicadas nesta segunda-feira em edições extras do Diário Oficial da União.
Uma única portaria autoriza pagamento de aproximadamente R$ 1,04 bilhão para municípios. As liberações estabelecem que a verba deve ser utilizada em atenção básica, média e de alta complexidade, um uso bastante amplo.
O ministro Alexandre Padilha é bastante influente no Ministério da Saúde. A indicação de vários cargos de alto escalão da pasta é atribuída a ele.