Ativistas realizam manifestação e exigem menor preço para o Truvada em frente ao estande da Gilead
Se o diretor executivo (CEO) do laboratório Gilead Sciences, John Martin, tivesse acompanhado a manifestação que ativistas de distintas partes do mundo fizeram na manhã desta quarta-feira (25) no Convention Center, em Washington, onde acontece até a próxima sexta-feira a 19ª Conferência Internacional de Aids, provavelmente não gostaria de ver a foto de seu rosto estampada em máscaras usadas por manifestantes que cercaram o estande da empresa no local reservado à demonstração de novos produtos que a indústria farmacêutica lança, governos mostram suas ações e agências internacionais divulgam seus trabalhos.
A ocupação do estande foi feita rapidamente, como em uma ação de guerrilha. Os ativistas chegam, pedem licença, quando é possível. Quando não, os profissionais das empresas saem do espaço porque sabem que a ação é impossível de ser contida. Nesta que aconteceu no Convention Center, eles isolaram o estande com uma fita amarela. Ficaram dentro. Distribuiram folhetos impressos com informações. Tudo organizado e feito rapidamente.
Criativos, eles usaram a máscara com o rosto de John Martin e deram seu recado em relação ao Truvada. Foram longamente filmados e fotografados por pessoas presentes que acompanhavam a Conferência e, evidentemente, pela mídia internacional que cobre os desdobramentos do evento.
O Truvada, fabricado pelo laboratório Gilead Sciences, teve sua aprovação anunciada recentemente pelo FDA (órgão do governo americano que controla drogas e alimentos), como primeira pílula para ajudar a prevenir a infecção do HIV em grupos de alto risco. Sua aprovação foi divulgada em todo o mundo, com destaque pela imprensa internacional. A partir desta decisão tomada pelo FDA, médicos estão autorizados a prescrever o Truvada nos Estados Unidos a grupos como prostitutas ou casais em que um dos parceiros é soropositivo. A posição definitiva do FDA veio dois meses depois do órgão ter se mostrado favorável a um estudo que indicou que o medicamento pode reduzir de 44% a 73% o risco de contração do HIV em homens homossexuais. Na mesma semana, um comitê do FDA se reuniu e os especialistas se posicionaram a favor do uso do Truvada para esses fins. O medicamento é encontrado no mercado americano desde 2004 como tratamento para pessoas infectadas com HIV, e é usado em combinação com outros remédios antirretrovirais. Agora, com a aprovação do FDA, a droga passa a ser recomendada também para pessoas não infectadas.
Mesmo sendo comemorada por grande parte da comunidade científica, a nova indicação para o Truvada foi rejeitada por alguns grupos de prevenção ao HIV, como a Aids Healthcare Foundation, dos Estados Unidos, a mesma organização que promoveu a manifestação que fechou o estande da companhia. Uma ativista perguntava incessantemente andando em frente e ao redor do estande: “O que nós queremos”? “Não mais preços agora”. “Quando nós queremos?”. “Agora”, respondiam todos em tom firme e forte, sempre cadenciado.
Outras palavras de ordem como “Redução dos preços da combinação tripla agora”, “Gilead destrói o acesso ao tratamento”,“O preço do Truvada é um assassinato”, “Fingindo inovações, arruinando vidas” e “Quebraram a promessa: o preço é uma barreira” também foram ditas em voz alta para todos ouvirem e registrarem. A Aids Healthcare Foudation também já se posiciou e afirmou que o uso contínuo do medicamento pode induzir a uma falsa sensação de segurança, o que levaria, segundo eles, a um menor uso de métodos preventivos mais eficazes, como a camisinha.
Os altivos ,irreverentes, inteligentes e assertivos ativistas norte-americanos e de muitas partes do mundo, os mesmos que há trinta anos começaram a gritar e a chamar atenção de todos para o grande numero de mortes, sofrimento, tristeza e estragos que a aids trazia ao país e, depois ao mundo, resolveram voltar às ruas de Washington. Sabem que preços abusivos de medicamentos impedem o acesso universal. Sabem que as inovações propostas pela indústria farmacêutica não podem ficar restritas apenas àqueles países que têm mais condições de pagar pelos preços cobrados. Sabem que existe gente com aids em todos os países do mundo. Gente que tem o mesmo direito de receber novos remédios, novas possibilidades e condições para seguir a vida e suas histórias. Muita gente também sabe disso. Mas os ativistas resolveram mostrar que o HIV não se enfrenta usando nenhum tipo de máscara.
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