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Informe não diz que larvicida dá microcefalia e OMS nega ligação; entenda

O larvicida é adotado em outros países desde 2004 --países como Dinamarca, França, Grécia, Holanda, Espanha - Divulgação/SAP
O larvicida é adotado em outros países desde 2004 --países como Dinamarca, França, Grécia, Holanda, Espanha Imagem: Divulgação/SAP

Mirthyani Bezerra

Do UOL, em São Paulo

15/02/2016 12h53Atualizada em 15/02/2016 15h46

Professores da Universidade Nacional de Córdoba, na Argentina, publicaram na semana passada um informe afirmando que o uso do larvicida piriproxifeno (pyroproxyfen, em inglês) em água potável e o aumento de casos de microcefalia no Nordeste brasileiro "não são uma coincidência". Isso bastou para que os internautas das redes sociais concluíssem que a relação era direta e o mistério estava resolvido.

Até a Secretaria de Saúde do Rio Grande do Sul suspendeu o uso do composto, que é usado no Brasil desde 2014 para matar as larvas do mosquito Aedes aegypti em depósitos onde há necessidade de armazenamento de água, mas não é possível uma proteção física.

O fato é que nem o informe da Reduas (Rede Universitária de Ambiente e Saúde), associação formada pelos docentes argentinos, nem a nota técnica emitida em fevereiro pela Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva), que teria servido de base para o relatório da rede, afirmam que o piriproxifeno é a causa do boom de casos de microcefalia e outras alterações neurológicas identificadas em recém-nascidos.

Tanto a Abrasco quanto a Reduas possuem um histórico de luta contra danos à saúde que podem ser causados pela fumigação ou pulverização de pesticidas, e é nesse sentido que as entidades fazem o alerta.

Segundo Marcelo Firpo, coordenador do Grupo de Saúde e Ambiente da Abrasco, a nota questiona a política de combate ao mosquito, que, para ele, já se mostrou equivocada e defende que esse modelo é perigoso para as populações.

Ele defende que seria possível que um larvicida estivesse relacionado com casos de microcefalia porque tais substâncias "possuem grande quantidade de neurotóxicos que afetam o sistema nervoso central" e que isso deveria ser investigado. "A microcefalia pode ter múltiplas causas, o que pode incluir contaminação química, mas nós não aprofundamos isso na nota, não associamos", afirmou. 

Após a polêmica, o Ministério da Saúde ressaltou que a teoria não possui embasamento científico e que alguns locais onde o larvicida não é usado também registraram casos de microcefalia.

Sem evidências, não há estudos

A OMS (Organização Mundial de Saúde) recomenda o uso do piriproxifeno no combate às larvas do Aedes, um composto que foi aprovado pelo Esquema de Avaliação de Pesticidas (Whopes) do órgão após rigorosos testes de avaliação. O larvicida também é certificado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), que avalia a segurança desse tipo de produto no país.

O Brasil usa em larga escala desde 2014, mas o larvicida já é adotado em outros países desde 2004 --países como Dinamarca, França, Grécia, Holanda, Espanha.

"Existe uma experiência de muitos anos do uso dele em vários países e essa relação nunca foi verificada, por isso não há evidências de que ele possa causar problemas neurológicos", afirma o presidente do IBT (Instituto Brasileiro de Toxicologia), Flávio Zambrone, também professor de Toxicologia na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).

Para Zambrone, se não existem evidências concretas, não há motivo para estudar essa associação.

Ele criticou a postura do adotada pelo governo do Rio Grande do Sul, que após dizer que não usará mais o produto, informou que ele continuará sendo colocado em água armazenada para outros fins (lavagens de pátio, água de reuso, por exemplo) que não sejam o consumo humano.

"Assusta uma autoridade sanitária proibir o uso sem nenhum conhecimento sobre o assunto, sem consultar toxicologistas. É uma medida que pode colocar em risco a população", disse.

"Não existe nenhum produto que não tenha certo grau de risco", explica ele. "Mas as avaliações de risco mostraram se usado de forma correta o risco é aceitável e o produto traz benefícios para a população."

"Não há comprovação científica da relação do larvicida com casos de microcefalia, mas também não comprovação do contrário”, informou o governo do RS.

E se eu não quiser mais usar?

Existem outros tipos de larvicida que podem ser usados, como o cloro.

"Duas colheres se sopa a cada litro de água é capaz de matar a larva do mosquito. Mas, é algo muito difícil de se fazer em larga escala. Diante da ameaça que o Aedes aegypti, temos que usar todas as ferramentas disponíveis", afirmou o toxicologista.