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Ações na Justiça de SP contra planos de saúde aumentam 631% desde 2011

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Imagem: Shutterstock

Paula Moura

Do UOL, em São Paulo

07/02/2017 04h00

O número de ações judiciais contra planos de saúde vem crescendo no Estado de São Paulo de forma preocupante, revela estudo da USP (Universidade de São Paulo).

Em 2011, o total de ações na primeira instância somava 2.602. Em 2016, aumentou 631%, saltando para 19.025, aponta a pesquisa coordenada pelo professor Mário Scheffer, da FMUSP (Faculdade de Medicina) e antecipada para o UOL. No período de seis anos, foram 77 mil ações judiciais na primeira instância.

Na segunda instância, houve um crescimento de 146%, subindo de 4.823 em 2011 para 11.377 em 2016. No total, em seis anos foram 58.512 ações nessa instância.

O maior problema que está indo para a Justiça – e acho isso dramático – é a negativa de atendimento e a exclusão de cobertura de vários tipos. Geralmente são os atendimentos mais caros, de maior custo.”

Mário Scheffer, professor da Faculdade de Medicina da USP

“A judicialização é uma amostra do que está acontecendo, dos abusos praticados [pelos planos de saúde] de forma constante e cada vez mais.”

No período analisado, o número de usuários de plano de saúde no Estado praticamente se manteve estável. Em setembro de 2016, 17,8 milhões de paulistas tinham plano de saúde --apenas 300 mil a mais que em 2011. 

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Isso significa que as ações na Justiça não aumentaram devido a um crescimento do número de usuários, mas sim da quantidade de reclamações.

Recorrer à Justiça com a mãe na UTI

Em 2016, José Rodrigues, 71, descobriu que o plano de sua mãe, Maria Anunciação Rodrigues, 87, não cobriria um "stent" necessário para tratar uma deficiência cardíaca que dois dias antes lhe havia ocasionado um derrame pulmonar.

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Maria estava na UTI em São Bernardo do Campo, quando seu filho recebeu a negativa do plano de saúde.

Como uma pessoa com 20 e tantos anos de plano de repente pode ser contemplada com uma conta de mais de R$ 20 mil por um stent? O plano que era top de linha de repente agora não cobre? Como é que pode isso?”

José Rodrigues entrou com uma liminar para o plano pagar o stent, que foi implantado, e depois de 15 dias sua mãe voltou para casa. Ele ganhou em primeira instância, a operadora de saúde recorreu e a ação segue na segunda instância.

A história de Maria Anunciação Rodrigues reflete o tipo mais comum de problema levado à Justiça: a exclusão de cobertura representa 43,73% dos casos. A análise faz parte de um estudo anterior do Observatório da Judicialização da Saúde Suplementar e detalha 4 mil ações julgadas em segunda instância de 2013 e 2014 no Estado. 

Cirurgias e tratamento de câncer no topo da lista

O aumento do valor dos planos de aposentados vem em segundo e responde por 27%. “Tem crescido o número de planos com rede credenciada insuficiente, poucos médicos, hospitais e laboratórios, por exemplo”, ressalta o professor.

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Entre os tipos de cobertura mais negados pelos planos de saúde e questionados na Justiça, estão as cirurgias ou materiais necessários à cirurgia, com 34,28% das ações judiciais.

Internações e tratamentos para câncer como radioterapia e quimioterapia vêm em segundo lugar. Mas até mesmo exames, consultas e serviços como fisioterapia fazem parte do atendimento negado. 

O que geralmente ocorre é que no momento de necessidade, o paciente solicita uma liminar, o plano paga o procedimento e depois a decisão vai para a Justiça. 

“É muito preocupante que questões de saúde, que são de grande relevância para a população como um todo, tenham que ser decididas em tribunais. Nem sempre o 'timing' da Justiça é o mesmo das doenças”, frisa Florisval Meinão, presidente da AMP (Associação Paulista de Medicina).

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Liminares favoráveis

A ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), órgão regulador do setor, define um rol mínimo de cobertura que os planos são obrigados a cobrir.

“Muitas vezes esse rol não contempla vários desses procedimentos novos e vários com medicamentos onerosos. Aí é que está o conflito, porque o médico ele tem um compromisso com o seu paciente, não com o plano de saúde”, diz. “Portanto, ele prescreve de maneira autônoma aquilo que ele considera pertinente”, explica Meinão. 

Na amostragem da segunda instância, para onde vão os processos em que a prestadora de serviços recorre, os usuários são vencedores na maioria das ações: 92,4%. A causa é ganha pelos pacientes com acolhimento integral dos pedidos (muitas vezes incluindo reparações por danos morais pela espera) em 88%.

Apenas em 7,4% dos casos o paciente foi obrigado a pagar a conta.

O caminho judicial acaba sendo um caminho buscado fora da regulamentação comum, feita pela ANS. 

As reclamações na ANS em todo o Brasil, por exemplo, mais que dobraram em cinco anos. Foram de 49.991 em 2011 para 101.903 em 2015. Em 2016, os dados até setembro mostram 66.547 reclamações.

A agência nacional diz que tem implementando diversas medidas para ampliar a qualidade do serviço e, assim, reduzir os casos de discordância entre usuário e planos. Entre as ações está a Notificação de Intermediação Preliminar (NIP), uma ferramenta de mediação de conflitos entre beneficiários e operadoras, cujo índice de resolução em 2016 ficou acima de 90%, afirma a ANS.

'Advogados de porta de hospital'

Pedro Ramos, diretor da Abramge (Associação Brasileira de Planos de Saúde), aponta a judicialização como um processo que ocorre em todas as áreas da sociedade brasileira e deve ser combatido por meio de acordos com as operadoras. “O que cresceu foi a indústria da judicialização e os advogados de porta de hospital”, afirma. “No ano passado, com a própria ANS, conseguimos reduzir o número de reclamações”, diz.

Além dos casos em que os usuários têm razão em buscar seus direitos, Ramos lembra que também há fraudes como a máfia das órteses e próteses e 120 ações que estão sendo investigadas pela Corregedoria-Geral da Justiça de São Paulo por apresentarem semelhança em ações solicitando operação de hérnia com mesmo hospital e mesmos advogados.

“Essas liminares falando que se não fizer o procedimento morre são mentira”, ressalta. “Nenhum juiz quer ir para a casa dormir se tem um laudo, às vezes falso, de um médico dizendo que a pessoa vai morrer no outro dia”, diz. 

O presidente da AMP também defende que haja mais acordos. “Penso que se tem que buscar negociações prévias antes de se recorrer à Justiça”, diz Meinão. 

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Ponta do iceberg

Os casos estudados são apenas aqueles em que os pacientes sentem necessidade de entrar na Justiça. Outra situação recorrente é que frente à negação de um tratamento, os pacientes recorrem ao SUS (Sistema Único de Saúde).

Pesquisa Datafolha encomendada em 2015 pela APM mostrou que 20% dos usuários de planos no Estado de São Paulo recorriam ao SUS quando tinham problemas com seus planos

A pesquisa abrangeu o período de 2013 a 2015, com margem de erro de 3 pontos percentuais para mais ou para menos.

Os planos deveriam ressarcir o SUS pelos atendimentos realizados por usuários de planos no sistema público. “O SUS recupera muito pouco porque é uma regra muito complexa, tem o recurso das operadoras, só pode ser ressarcido aquilo que está no contrato do plano, são vários obstáculos”, diz Scheffer.

Segundo a ANS, de 2001 a novembro de 2016 foram identificados 2 milhões de atendimentos realizados por beneficiários de planos de saúde no SUS passíveis de cobrança, totalizando a mais de R$ 3,2 bilhões. Deste montante, R$ 1,4 bilhão (43,6%) foram pagos e repassados ao Fundo Nacional de Saúde (FNS) do Ministério da Saúde. O restante corresponde à dívida dos planos.