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Afinal, preciso tomar vacina contra a febre amarela?

Mastrangelo Reino-10.nov.2016/Folhapress
Imagem: Mastrangelo Reino-10.nov.2016/Folhapress

Fernando Cymbaluk

Do UOL, em São Paulo

23/03/2017 12h35

A febre amarela, que reaparece em surtos cíclicos onde é endêmica no Brasil, avançou neste ano para áreas onde ela não era esperada. A doença está presente em um vasto território do país: são 19 Estados e o Distrito Federal. Contudo, lugares como o Espírito Santo e o Rio de Janeiro, que não eram considerados área de risco, registraram a doença neste ano.

O aumento da área de incidência da febre amarela silvestre reavivou a discussão para incluir a vacinação de crianças no Calendário Nacional, segundo especialistas consultados pelo UOL. O Ministério da Saúde fez uma reunião com técnicos nessa quarta (22), mas diz que só anunciará revisão na área de vacinação após o fim do atual surto --algo que deve acontecer por volta de julho. 

Atualmente, a vacina é obrigatória para crianças em 3.529 dos mais de 5,5 mil municípios do país, concentrados no Norte, Centro-Oeste, algumas áreas do Sudeste e Nordeste. A imunização é aplicada aos nove meses, com um reforço aos 4 anos. 

Diante do surto, outras 177 cidades do Rio de Janeiro, Espírito Santo, Bahia e São Paulo adotaram a vacina emergencial. É possível que essas cidades mantenham a vacinação obrigatória, mesmo que o Ministério não torne obrigatória a imunização em todo o território.

Até o momento, todos os casos registrados neste ano são transmitidos por mosquitos que vivem em florestas e áreas rurais (Sabethes e Haemagogus). A febre amarela urbana, que ocorre quando a doença é transmitida pelo Aedes aegypti, não é registrada no Brasil desde 1942.

Quem já tomou duas doses da vacina está imunizado para a vida. 

Confira perguntas e respostas sobre a vacina de febre amarela

Preciso me vacinar se moro no Rio de Janeiro?

Desde o mês de janeiro, o governo do Rio adotou a chamada vacinação de “bloqueio” em municípios que estão na divisa com Minas Gerais e Espírito Santo, onde havia registros de casos de febre amarela. Com o aparecimento de três casos da doença no território fluminense, em Casimiro de Abreu, e de um macaco morto com suspeita de febre amarela na região de Juiz de Fora (MG), que faz divisa com a Região Serrana do Rio, o Estado iniciou a expansão da vacinação.

A vacina está sendo oferecida em 64 dos 92 municípios estratégicos, e até o fim do ano toda a população deverá ser imunizada. A prioridade é para quem vive em áreas rurais e de mata.

Floresta no Rio - Alexandre Justino/Divulgação - Alexandre Justino/Divulgação
Rio de Janeiro não estava na área de risco. Contudo, faz divisa com Minas, que está, possui áreas de mata e teve três registros da doença esse ano
Imagem: Alexandre Justino/Divulgação

Preciso me vacinar se moro no Estado de São Paulo?

Toda a região noroeste e sudoeste de São Paulo está na área onde a vacina de febre é recomendada – sendo oferecida no calendário de vacinação aos 9 meses em 455 municípios. Quem mora ou viaja para essas regiões deve tomar a vacina.

Nas regiões de Santa Cruz do Rio Pardo, Araraquara, e Ribeirão Preto, onde quatro casos da doença foram registrados neste ano, a vacinação ocorre a partir dos 6 meses. No surto atual, macacos com a doença foram encontrados na região de São Roque, onde não havia vacinação. Por esse motivo, o governo paulista iniciou ações de vacinação de toda a população em cidades como Ibiúna, Mairinque, Cotia e Vargem Grande (as duas últimas, localizadas na Região Metropolitana de São Paulo).

A prioridade é vacinar quem mora em áreas rurais e próximas de mata. Quem viaja para esses locais deve tomar a vacina.

Bugio - Ale Frata/ Frame/ Estadão Conteúdo - Ale Frata/ Frame/ Estadão Conteúdo
O vírus da febre amarela está presente em macacos. Mosquitos que picam animais infectados podem transmisitir para humanos
Imagem: Ale Frata/ Frame/ Estadão Conteúdo

Devo tomar vacina se for viajar para o Rio de Janeiro, Espírito Santo e Bahia?

Segundo o Ministério da Saúde, quem viaja para qualquer município do Rio de Janeiro deve tomar a vacina contra a febre amarela. O mesmo vale para quem vai para áreas que estão recebendo vacinação temporária no Espírito Santo e na Bahia. Já a Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo afirma que oferece a vacina para quem for se deslocar para um dos 14 municípios do Rio que estão próximos aos locais de risco. Até o momento, o governo paulista não indica a vacina para quem pega a ponte área Rio-São Paulo.

Quantas doses tomar e em quanto tempo fico protegido?

A pessoa que toma a vacina fica protegida contra a febre amarela após 10 dias. A OMS (Organização Mundial de Saúde) diz que apenas uma dose já garante a imunização para toda vida. Contudo, no Brasil, o Ministério da Saúde avalia que depois de 10 anos, a primeira dose perde eficácia, sendo necessária uma segunda dose, que garantiria a proteção definitiva.

Vacina febre amarela - Folhapress - Folhapress
Frascos de vacina contra febre amarela
Imagem: Folhapress

Quem não deve tomar a vacina?

Por se tratar de um vírus vivo atenuado, a vacina oferece riscos para pessoas que possuem baixa imunidade ou que tenham alergia a ovo, que é usado em sua fabricação. Nessas pessoas, ela pode causar reações alérgicas, reações no sistema nervoso central e o desenvolvimento da própria doença. Assim, ela não é recomendada para quem é portador de HIV, pessoas que possuem doenças que diminuem a imunidade natural do corpo (como câncer), para bebês com menos de seis meses, mulheres grávidas ou que estejam amamentando e idosos com mais de 60 anos. Pessoas com esse perfil até podem tomar a vacina, mas precisam passar antes por avaliação médica. 

A OMS recomendou a vacinação para turistas que vão para Rio e SP. E agora?

A OMS (Organização Mundial de Saúde) passou a recomendar a vacina para todos os turistas internacionais que viajam para os dois Estados, excetuando-se quem se dirige para as áreas urbanas das capitais, além das cidades de Niterói e Campinas. 

No entanto, Helena Sato, diretora de imunização da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, discorda da orientação. “Qual seria a indicação de vacinação para alguém que venha do Japão para Peruíbe [cidade do litoral de São Paulo, que está fora da área de risco]?. O que pensamos para o paulista, pensamos para qualquer pessoa. Deve se vacinar quem mora ou viaja para área de risco de cada Estado”, afirma.

Tem vacina para todo mundo?

De acordo com o Ministério da Saúde, foram enviadas, desde o começo do ano, 17,5 milhões de doses extras da vacina contra a febre amarela aos Estados que estão registrando casos suspeitos da doença ou que fazem divisa com áreas que tenham notificado casos. Além disso, 3,6 milhões de doses da vacina de rotina foram enviadas para todas as unidades da federação.

Rivaldo Venâncio, infectologista da Fiocruz, diz que essa quantia é suficiente para não faltar. Por precaução, a pasta adquiriu cerca de 12 milhões de doses para preencher seus estoques. Parte desse pacote será fornecido por órgãos ligados a OMS. 

Fila - Alessandro Buzas/Futura Press/Estadão Conteúdo - Alessandro Buzas/Futura Press/Estadão Conteúdo
Cariocas e turistas formam fila em posto de saúde de Botafogo, no Rio, à procura da vacina contra a febre amarela
Imagem: Alessandro Buzas/Futura Press/Estadão Conteúdo

Contudo, postos de saúde registram filas e falta de vacina. Para Claudio Maierovitch, sanitarista da Fiocruz, o aumento da demanda por vacinas pode ocasionar desorganização.

É importante evitar a dispersão de esforços e perda de controle, que pode gerar problemas maiores."

Claudio Maierovitch, da Fiocruz 

Por isso, ele defende que a hierarquização de prioridades seja adotada ao máximo. "Tem que vacinar quem mora em área rural, com pouco acesso a serviço de saúde, que pode estar exposto."

Por que a vacina já não é dada para toda população no calendário de vacinação?

De acordo com especialistas, existe uma antiga discussão no comitê técnico que formula as ações do Programa Nacional de Imunizações sobre a vacinação contra a febre amarela de crianças em todo o país. Isso mudaria a estratégia hoje existente, de oferecer a vacina apenas em regiões consideradas de risco.

“Não é uma definição fácil por dois motivos principais: o risco de urbanização da febre amarela ainda é baixo no país como um todo. E pela possibilidade de ocorrência de efeitos adversos graves da vacinação”, diz Marcelo Burattini, infectologista da Unifesp.

Para Helena Sato, diretora de imunização da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, mesmo que a vacina fosse dada para crianças em todo o país, ações de vacinação em áreas de risco precisarão continuar ocorrendo a medida que as epidemias se expandem. Isso porque a idade média de quem pega a doença está entre 20 e 30 anos. “Vacinando aos 9 meses, estaremos preparando uma proteção só para daqui a 20 anos”, explica.

Outro problema é que as regiões onde a vacina ainda não é oferecida anualmente concentram a maior parte da população --só a grande São Paulo possui 10% dos brasileiros.

Há reações adversas à vacina?

A vacina contra a febre amarela é feita com um vírus atenuado da doença. Em sua fabricação é usado ovo. Cerca de 10% das pessoas vacinadas podem ter febre e dor de cabeça após tomarem a vacina. Há, contudo, uma reação rara, mas grave, em que vírus atenuado da vacina ataca o fígado e desencadeia complicações semelhantes à da doença. Essa reação acomete cerca de 1 pessoa a cada 1 milhão que toma a vacina. O problema não está na vacina, e sim em características do indivíduo, mas os cientistas não sabem ainda explicar as causas dessa reação.

Qual é o risco da febre amarela chegar em cidades urbanas?

Apesar de haver áreas urbanas próximas a áreas de mata, não é tão fácil ocorrer essa mudança, que depende de uma combinação de fatores. Seria necessário que alguém infectado pela doença em área de mata se deslocasse para área com alta densidade de Aedes ainda no período em que esteja transmitindo a doença, fosse picado pelos mosquitos, e que esses mosquitos sobrevivessem e infectassem outras pessoas suscetíveis.

“Essas probabilidades são diferentes para cada época do ano e para cada município. Somente após a ocorrência desta sequência de eventos completa teríamos a ocorrência de um surto de febre amarela urbana”, diz Burattini.