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Médico faz plantão sozinho em hospital que atendia mil pacientes por dia

Larissa Leiros Baroni

Do UOL, em São Paulo

19/12/2017 18h23

16 de dezembro de 2017: um dia triste para a equipe do Hospital Universitário da USP (Universidade de São Paulo). Foi a primeira vez que um plantão da clínica médica foi realizado com um único médico ao longo de doze horas. Por falta de profissionais, a instituição --que já chegou a atender mil pacientes por dia-- teve que dispensar os atendimentos corriqueiros e se dedicar única e exclusivamente aos casos de emergência e, eventualmente, aos de urgência.

No último sábado, o habitual movimento de médicos, residentes e pacientes foi substituído por um corredor vazio, como mostra a foto publicada no Facebook por Gerson Salvador, diretor do Simesp (Sindicato dos Médicos de São Paulo) e o único médico a trabalhar naquele plantão. A imagem foi compartilhada mais de 5 mil vezes em menos de três dias.

Naquela noite, Salvador e as duas estudantes residentes de plantão deveriam dar atendimento aos dez pacientes em observação no hospital e prestar socorro a possíveis emergências encaminhadas de outros hospitais. Antes do início da crise do hospital, o plantão costumava ter três médicos. 

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Sem equipe suficiente, o pronto-socorro adulto está parcialmente fechado desde o último dia 11, e o infantil desde o fim de outubro. 

"É um momento triste para mim, eu me formei para atender as pessoas", conta Salvador, que notificou os pacientes que buscavam atendimento naquela noite de que o pronto-socorro não tinha condições de fazer os atendimentos não emergenciais. "Não sei precisar quantos exatamente procuraram o hospital durante as minhas 12 horas de plantão, mas foi um número considerável."

De 2013 para 2017, de acordo com a Simesp, o número de médicos no hospital caiu de 299 para 248 --o que representa uma redução de 17,1% no corpo clínico da instituição. Mas, segundo informações do site da USP, o Hospital Universitário possui 254 médicos. "Dado desatualizado", como ressalta o sindicato. 

Diante da escassez de médicos, o hospital acaba priorizando pacientes com infarto do miocárdio, insuficiência cardíaca, crises graves de asma, meningites, convulsões, intoxicações, tentativas de suicídio, psicoses entre outras condições que podem colocar em xeque a vida dos pacientes ou provocar danos permanentes a eles.

Aqueles que procuram atendimento por causa de diarreias, gastrites, infecções de garganta, sinusites ou asmas menos intensas acabam sendo direcionados a outros hospitais da região.

O mais triste é saber que há 58 leitos --sendo 8 no tratamento semi-intensivo-- vagos e que poderiam dar assistência a quem precisa".

Procurada, a reitoria da USP disse que não vai se manifestar sobre a crise do Hospital Universitário, tampouco sobre o fechamento do pronto-socorro adulto. Também não informou se haverá ou não contratações de novos médicos para repor o quadro clínico da instituição.

Falta de médicos

Os plantões da equipe clínica, como conta o infectologista, eram feitos por três médicos. "Mas desde 2014 a unidade vem fechando aos poucos. Alguns médicos saíram no Plano de Demissão Voluntária, mas, com o agravamento da crise interna, muitos outros colegas atingiram o seu limite e acabaram pedindo demissão", afirma Salvador.

A redução de 51 profissionais também impactou no número de atendimentos, que passavam de mil por dia há quatro anos, segundo o Simesp. "Quem sai perdendo com tudo isso é a população de cerca de 500 mil pessoas que perderam o único pronto-socorro da região com estrutura hospitalar para a realização de cirurgias de emergência", lamenta Salvador.

O hospital é de responsabilidade da USP, que tem autonomia de orçamento e para sua gestão. A reitoria da USP foi procurada, mas disse que não vai se manifestar sobre a crise do Hospital Universitário, contratações e redução nos atendimentos. 

Desde 2015, o Hospital Universitário da USP recebe R$ 23 milhões anuais via SUS (Sistema Único de Saúde).

Questionada sobre uma possível interferência na gestão do HU, a Secretaria de Estado da Saúde, da gestão Geraldo Alckmin (PSDB), não se posicionou e alegou que a USP tem autonomia na gestão da instituição.