Homens são maioria entre médicos; urologia é área com menos mulheres
"Se você tiver a cabeça no lugar, pode fazer o que quiser". Essa foi a frase que motivou Maria Cláudia Bicudo Fürst a encarar o medo do preconceito e optar pela urologia, a especialidade com menos mulheres na medicina, segundo a Demografia Médica no Brasil 2018.
No último levantamento do Conselho Federal de Medicina, elas representavam apenas 2,2% dos profissionais da área. A desigualdade de gênero não é um problema apenas desta especialidade. Os homens são ainda a maior parte dos especialistas em medicina (57,5%), segundo o estudo, apesar das mulheres serem 51,5% da população do país.
Entre as especialidades com menor participação do sexo feminino também estão a Ortopedia e Traumatologia (6,5%), a Neurocirurgia (8,6%), a Cirurgia Torácica (9,5%), e a Cirurgia do Aparelho Digestivo (10,3%).
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Os homens aparecem em maior número em 36 das 54 especialidades médicas, e representam mais de 70% dos profissionais em 16 delas.
Em contrapartida, elas são maioria nas áreas de Dermatologia (77,1%), Pediatria (74,2%), Endocrinologia (70,4%), Alergia e Imunologia (68,2%). Na Ginecologia e Obstetrícia, elas são uma pequena maioria: 56,6%.
Uma mulher na urologia
Em 2017, a Sociedade Brasileira de Urologia tinha 4.808 sócios ativos, sendo 98 mulheres e 4.710 homens. O que significa que a cada 100 urologistas apenas duas são mulheres.
A participação é pequena, mas, segundo Maria Cláudia, vem crescendo. "Em 1996, eram apenas 16 mulheres inscritas na sociedade. Agora, já somos em 98", afirma ela, que foi a primeira aluna da Faculdade de Medicina do ABC a optar pela especialidade. "Tive um certo receio ao fazer a minha escolha, mas, depois do incentivo de um professor, não pensei duas vezes. E a frase que me inspirou lá atrás, hoje uso com as minhas alunas."
"Meu primeiro estágio foi na área urologia e, para minha surpresa, me apaixonei", conta ela. "É uma especialidade vasta, que inclui desde procedimentos pequenos como até grandes transplantes."
Mesmo motivo que levou Rafaela Rosalba a também optar pela urologia, que não se restringe ao atendimento masculino.
"Quando comuniquei minha decisão à minha mãe, que não é da área médica, ela estranhou um pouco, mas nunca questionou, até porque sabia da minha paixão por transplantes", afirma a médica, que diz que o erro da maioria das pessoas é desconhecer a função desse especialista, que não se dedica única e exclusivamente à parte sexual do homem.
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"É uma especialidade cirúrgica ligada ao trato urinário, que inclui rins, ureteres, bexiga urinária, uretra, assim como os órgãos do sistema reprodutor masculino [testículos, epidídimos, ducto deferente, vesículas seminais, próstata e pênis]", explica Maria Claudia, que dedicou inclusive o seu mestrado e doutorado à urologia feminina.
Preconceito velado
Maria Claudia e Rafaela confirmam a existência de preconceitos velados. "Há pacientes que ligam para marcar consulta e dão preferência por profissionais do sexo masculino", conta Rafaela. "Já no SUS (Sistema Único de Saúde), onde não há como escolher, as caras de espanto por se depararem com uma urologista mulher não são raras", completa Maria Claudia, que lembra ter vivido um constrangimento na profissão uma única vez.
"Eu ainda estava na residência, em atendimento na rede pública, quando um homem se negou a fazer o exame de toque comigo. O jeito foi chamar um colega", conta a médica, que diz ser comum as brincadeiras de pacientes por seu dedo ser menor do que de um homem.
Já Rafaela diz ter sido indicada a um laboratório, mas não pode ocupar a vaga simplesmente por ser mulher. "Isso porque, de acordo com as normas internas, só se contratava mulheres para a área de ginecologia e só homens para área de urologia", conta.
Ao mesmo tempo que há pacientes que por desconhecimento acabam preferindo os profissionais do sexo masculino, existem aqueles que dão preferência às mulheres. "Muitas mulheres, por exemplo, se sentem mais confortável em expor seus problemas a nós. Teve até um homem que teve que colocar uma prótese de pênis que optou por mim porque disse que não admitia falar para outro homem que tinha disfunção erétil", conta Maria Claudia.
A melhor forma de superar qualquer preconceito é o mérito, a dedicação e o amor à profissão. Se você é um bom profissional, ninguém vai ligar se ele é homem ou mulher."
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